Nosso bate-papo dessa semana é com Alexandre Mendonça de Barros.
Alexandre é sócio-consultor da MB Agro Consultoria, engenheiro agrônomo e doutor em economia aplicada, ambos pela ESALQ/USP. É membro dos conselhos do grupo Otávio Lage, do frigorífico Minerva, HIG Big Sal, grupo Roncador e MAQCampo: Revenda John Deere. Também é membro do comitê de assessoria externa da EMBRAPA Pecuária Sudeste e do conselho superior do agronegócio da FIESP, e foi um dos debatedores do Encontro de Analistas da Scot Consultoria.
Scot Consultoria: Alexandre, poderia comentar sobre alguns pontos que o senhor trouxe para o debate, no bloco de macroeconomia, durante o Encontro dos Analistas da Scot Consultoria, realizado no dia 27 de novembro, e qual a importância desse evento para o setor agropecuário nacional?
Alexandre Barros: Esse evento é um marco, onde todo fim de ano são desenhadas as projeções para o próximo ano. Ele conta com a presença de muitas pessoas, de vários segmentos e é muito relevante para desenhar a entrada do próximo ano. Gosto sempre de estar aqui, sempre que me convidam é um prazer muito grande.
Eu acho que a grande mensagem que nós trouxemos, é que esse é um momento muito raro para a macroeconomia, onde temos um juro muito baixo, e, em decorrência disso e alguns outros fatores, vimos o real muito depreciado, mesmo com o preço das commodities, em dólares, subindo muito.
É um momento que os grãos estão muito caros e, em geral, tudo subiu muito, exigindo um bom senso do pecuarista, principalmente. Nesse momento é fácil “errarmos a mão”, com a reposição cara, grãos caros e com a ração cara. Por isso, reitero, esse encontro dá essa “luz”, com a possibilidade de ouvirmos várias pessoas ligadas à área e entendermos um pouco melhor os principais desafios que virão pela frente.
Scot Consultoria: Como as taxas estão historicamente mais baixas, como o senhor acha que isso pode interferir no mercado agropecuário?
Alexandre Barros: A taxa de juros muito baixa tem levado vários agentes a tirar dinheiro de banco e comprar ativos reais, como fazendas, casas e também bois.
Acho que parte desse bezerro e desse boi magro muito caro reflete que o capital não está rendendo, e vem botando para rodar. Vi muita coisa acontecendo nessa direção e isso tende a inflar os preços e, com isso, precisamos tomar um pouco de cuidado.
Scot Consultoria: Como o senhor enxerga os atuais preços do mercado de reposição e do boi gordo e como o pecuarista deve se posicionar no momento da compra da reposição?
Alexandre Barros: Eu acho que nós estamos chegando perto dos limites que o mercado interno consegue absorver. Acredito que o mercado externo tem um potencial de alta de preço para 2021, em dólar, e, eventualmente, se o câmbio ficar onde está, dá para se pagar um pouco mais, já o mercado interno, que ainda representa 70% do consumo, dá claros sinais de que a corda já esticou no limite do que ele consegue pagar. É muito importante para o pecuarista ter essa leitura.
Scot Consultoria: A China tem buscado outras opções de parcerias realizando negócios com Argentina, Rússia, por exemplo. Essa aproximação pode ser uma ameaça ao mercado brasileiro?
Alexandre Barros: Sim, temos que ficar atentos. Os chineses estão muito preocupados com suprimentos, e já perceberam que terão que importar alimentos para o resto da vida. Hoje há uma alta dependência do Brasil e obviamente, eles querem sair também de uma dependência dos Estados Unidos, mas também não podem depender apenas de um país.
Eles estão construindo pontes com outras regiões para tentar originar carne e grãos. Houve esse anúncio de um projeto de suínos na Argentina, há uma parceria estratégica com a Rússia, que possui uma enorme área agrícola e, embora com certas restrições, a região do leste europeu vem aumentando a produção de modo geral. Dessas regiões podem haver sim parcerias para a exportação de grãos e, quem sabe, até de carnes. A Rússia, por exemplo, que sempre foi importadora de carnes, começou a exportar frango, diminuiu muito a importação de suínos, e passou a produzir grãos internamente. Isso mostra como existem outras regiões capazes de expandir a produção e devemos ficar atentos a isso.
Scot Consultoria: O que se esperar da exportação e do mercado interno ano que vem?
Alexandre Barros: A exportação deve seguir muito sólida e forte, como vimos este ano. O preço da arroba tende a subir nos Estados Unidos, porque o preço do grão subiu muito em dólar, de modo que eles sentirão esse efeito.
Para o produto brasileiro, há espaço no mercado internacional, com potencial para elevarmos as exportações de carne. Acredito que os volumes serão parecidos aos observados neste ano, com potencial para serem até um pouco maiores. Minha projeção é uma produção muito parecida com a de 2020, com um cenário de exportações não muito diferente também, ou seja, um ano próximo ao que observamos ao longo deste ano, principalmente por não enxergar mais oferta de gado chegando no mercado ainda.
A queda no abate deste ano representa vacas que produzirão bezerros para o ano que vem, mas que não refletirá em boi gordo ainda. Então, a oferta total de carne que projetamos para o ano que vem é mais ou menos a mesma de 2020, com possibilidade de leve avanço, e uma virada de chave na oferta de carne para meados de 2023. Eu não enxergo uma exportação menor e aposto, inclusive, na possibilidade de avanço, o que refletiria em preços mais firmes no mercado interno com a oferta mais enxuta.