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Avatar ambiental

por Xico Graziano
Quarta-feira, 13 de janeiro de 2010 -08h00
Aconteceu de tudo na grande conferência ambiental promovida pela ONU, em dezembro, na Dinamarca. Chefes de Estado fazendo cartaz, ONGs mostrando força, lobistas exibindo poder, cientistas ostentando categoria, diplomatas negociando, jornalistas aparecendo. Mistura de séria reflexão com festa ecológica.

Temas variados da agenda ambiental desfilaram nos incontáveis eventos paralelos da conferência, enquanto os representantes dos governos nacionais pouco se entendiam na sala da reunião oficial. Nada escapou do debate. Vale a pena destacar aqui as principais questões discutidas em Copenhague. Um resumo breve e didático.

Primeiro, claro, sobre o aquecimento global inexistia qualquer ceticismo naquele gelado inverno. Ninguém duvida que o planeta esteja enfrentando um "efeito estufa" ampliado pelos gases que, em razão da ação humana, ou antrópica, aprisionam parte da radiação solar na atmosfera. Medidas urgentes e radicais serão necessárias para impedir a continuidade do deletério processo, estancando o problema até 2050. O gás carbônico (CO2), nunca considerado maléfico na agenda da poluição, agora se transforma em vilão. Pequenos países formados por ilhas oceânicas se apavoram com o assunto. Afinal, derretendo as geleiras e subindo o nível do mar, simplesmente poderão desaparecer. Por isso a angustiada Tuvalu, um pequenino Estado formado por nove atóis polinésios, deu o tom na COP 15.

Segundo, debatia-se intensamente sobre como financiar as políticas de mitigação do fenômeno climático. Mitigar significa amenizar, emitir menos gases estufa no espaço. Mudanças nos processos de produção, pesquisa de novas tecnologias, investimentos nas energias renováveis, combate ao desmatamento, quem vai pagar a conta dessas imprescindíveis ações? Os países mais pobres, ainda em desenvolvimento, querem que as nações ricas banquem a modificação de suas economias. Afinal, foram eles que, há muito mais tempo, provocaram o problema climático. Sob esse prisma, a reunião da Dinamarca parecia uma grande conferência econômica, não ambiental.

Terceiro, discutiu-se bastante sobre a responsabilidade da lição de casa. Governos, empresas, entidades ambientalistas, governos subnacionais, cientistas, será necessário articular as várias forças da sociedade em prol do benefício ambiental. Nesse quesito, os Estados de São Paulo e da Califórnia se sobressaíram, mostrando, por intermédio de seus governadores, José Serra e Arnold Schwarzenegger, a força do poder local. Pensar globalmente, agir localmente: chave para a educação ambiental.

Em quarto lugar, todos defenderam a necessidade de as propostas para enfrentar mudanças climáticas serem mensuráveis, reportáveis, conferíveis. Há que ter metas, cronogramas, recursos, gente capaz de conduzir as políticas de defesa ambiental. Ninguém aguenta mais apenas o discurso carregado de boas intenções. O drama da poluição exige menos retórica, mais ação concreta. Uma nova fase do ambientalismo se inaugura, a da gestão ambiental com resultados. Mais que discutir, fazer.

Quinto, as energias renováveis destacaram-se contra as energias fósseis do petróleo e do carvão. Nesse aspecto o Brasil avançou divulgando o etanol, combustível elaborado a partir da biomassa, embora tenha tomado poeira na energia eólica. Carros elétricos se distinguiram, habitação sustentável virou moda na construção civil. Eficiência energética tornou-se coqueluche na Europa.

Da Amazônia ao vegetarianismo, temas específicos atarefaram os militantes ecológicos. O Bella Center, local do evento, era um grande happening. Só faltou, mesmo, uma questão, eternamente esquecida das discussões ambientalistas: a demografia. A pegada ecológica, conceito recentemente desenvolvido, aproxima-se da crítica a esse fantasma do crescimento populacional. Continua de pé, porém, o maior tabu da ecologia.

Como não poderia deixar de acontecer, líderes populistas aproveitaram o clima da conferência de Copenhague para fazer seu proselitismo político. O discurso mais fácil sugeria xingar os ricos em nome dos pobres, reduzindo a questão ambiental a uma disputa entre o Norte e o Sul, relembrando a época do Terceiro Mundo. Lula e Chávez, por certo, capitanearam essa demagogia ambiental.

Copenhague não configurou um fracasso total. Quando milhares de pessoas, bem acima das expectativas, representando entidades variadas, se dedicam tão apaixonadamente a uma causa, como acontece atualmente com a política ambiental, o resultado aparece. Se não de imediato, firma-se no momento seguinte. Aqui está uma leitura positiva da COP 15. Nunca a ecologia esteve tão em voga, discutida amplamente, envolvendo inclusive sociedades periféricas. Ganho na certa.

Inexistiu um fecho da reunião, é verdade. O documento final aprovado mostrou-se pífio ante o tamanho do desafio colocado pelas mudanças climáticas. Quem aguardava um novo caminho, com metas obrigatórias de redução dos gases de efeito estufa, acabou frustrado. Mandatório murchou para declaratório.

Mesmo assim, as mudanças estão em marcha. Modifica-se o padrão da economia mundial. Empresas redefinem suas estratégias competitivas, governos revêem seus planos, a sociedade grita e empurra. Após dois séculos de industrialização explorando a natureza, nasce novo paradigma da economia de baixo carbono. A economia verde do futuro.

Ano-novo renova as esperanças de vida melhor. Tomara que neste 2010 uma governança global se firme para enfrentar o terrível drama do aquecimento planetário. No Brasil a torcida deseja que as eleições presidenciais incorporem o desenvolvimento sustentável no seu âmago. Um avatar ambiental.

Feliz ano-novo.