Em entrevista a CarbonoBrasil, Lucio Pedroni, co-autor dos padrões Climate, Community and Biodiversity (CCB), fala sobre algumas questões ainda sem resposta para o funcionamento do mecanismo de redução das emissões por desmatamento e degradação.
Co-autor dos padrões Climate, Community and Biodiversity (CCB) e CEO da empresa Carbon Decisions International, Lucio Pedroni tem 22 anos de experiência em cooperação internacional no campo de carbono florestal. Desenvolveu mais de 30 projetos florestais ligados ao sequestro de carbono durante os anos que trabalhou como consultor do Fundo Bio-Carbono do Banco Mundial e como chefe do Grupo de Mudanças Globais do Centro de Pesquisa e Educação em Agricultura Tropical.
Nesta entrevista, concedida a CarbonoBrasil durante o Congresso Florestal Mundial em Buenos Aires, Pedroni fala sobre alguns pontos-chaves que precisam ser esclarecidos para que um mecanismo de redução das emissões por desmatamento e degradação (REDD) funcione. O REDD será um dos temas centrais a serem debatidos durante a Conferência de Mudanças Climáticas das Nações Unidas, em Copenhague.
Pedroni é um dos autores do guia para REDD do Voluntary Carbon Standard (VCS), padrão de qualidade de projetos de compensação de emissões de gases do efeito estufa mais utilizado no mercado voluntário de carbono.
CarbonoBrasil - Apesar de ser um problema sério, a degradação florestal só agora começa a ser discutida internacionalmente. Como ela vem sendo tratada?
Lucio Pedroni - Não tem uma definição clara internacionalmente, depende se você vem do setor de biodiversidade ou florestal. Na convenção de mudanças climáticas a degradação é basicamente algo que você faz e perde estoques de carbono na floresta.
CB - No contexto do REDD, as pessoas pensam em considerar o desenvolvimento de monoculturas de árvores? Ou o REDD é mais direcionado para florestas e biodiversidades?
LP - Esta é a questão, qual será a definição de florestas, de desmatamento líquido, desmatamento bruto... A definição de florestas sob o Protocolo de Quioto considera três critérios: área mínima, cobertura de dossel e altura de árvore. Mas, por exemplo, existe uma discussão se o desmatamento deve ser líquido ou bruto. Neste último, você apenas considera a perda das florestas e, se for líquido, você perde em um local, planta e recupera em outro. E aí entra o perigo de substituir florestas nativas com eucalipto, por exemplo. Então na verdade você não contém o desmatamento.
CB - Você imagina o REDD para projetos de pequena escala, em áreas menores?
LP - Sim. Porém claro que com áreas muito pequenas não pode ser apenas um projeto, é preciso juntar iniciativas menores e construir um programa. Você teria hotspots de desmatamento e faria um projeto, pois tem um problema intenso em uma área específica. Existem muitas opções para construir este esquema de maneira que funcione, o que temos que fazer é negociar politicamente uma arquitetura flexível que acomode situações nacionais diferentes e que permita a participação de todos os diferentes atores.
Eu acredito que é mais sábio ter a sociedade civil e o governo trabalhando juntos para reduzir o desmatamento. Seria muito mais eficiente do que ter burocratas europeus e de países em desenvolvimento tentando colocar em prática algo para reduzir o desmatamento. Pode funcionar, mas acredito que seria mais eficiente se ao mesmo tempo existisse um mercado e a sociedade civil fazendo projetos, envolvendo ONGs e investimentos privados. Este é o desafio.
CB - No Brasil temos um mecanismo que oferece incentivos financeiros para cidades que preservam áreas naturais, chamado ICMS Ecológico, porém em alguns casos estes incentivos não chegam até os proprietários destas áreas, ficando com as prefeituras. Você acredita que este é um risco para o REDD se ele for implementado apenas a nível nacional (não em nível de projetos)?
LP - Claro, esta é uma questão muito importante. A nível nacional, primeiramente, você tem a burocracia. Além disso, o bolso do setor público em países em desenvolvimento é vazio, então existem muitos buracos a serem fechados antes que algo realmente aconteça. Por isso, acredito que para funcionar é preciso melhorar as diretrizes e o desenvolvimento de programas para dar oportunidades ao setor privado, comunidades e ONGs para venderem o crédito das reduções de emissão. É muito simples, você pode vender madeira, mas também pode vender reduções de emissão, deveria ser o mesmo, por que deve ser tão complicado?
Se você tiver um pedaço de floresta e puder vender apenas a madeira de uma espécie, quando aquela espécie acabar a floresta não tem mais valor. Se você puder vender mais espécies, a floresta tem mais valor. Com os serviços ambientais, a floresta passa a ter mais valor e aí você pensará duas vezes antes de cortá-la, pois a floresta em pé tem mais valor. Mas se você nacionalizar o carbono e apenas os governos puderem negociar os créditos, o proprietário da floresta vai dizer “eu não me importo”. Existem prós e contras em ambas as abordagens, o desafio é construir algo que funcione, que seja credível, mas o mais importante é que devemos começar agora.
Fonte: CarbonoBrasil