Se o meio ambiente é a preocupação mundial do século XXI, a preocupação com a água é a mais premente. Não é preciso discorrer sobre a importância da água para a vida. E hoje não há quem não reconheça que esse recurso vital é limitado. Assim, a sua proteção é indispensável para a garantia da nossa vida e a das futuras gerações. A Constituição Federal de 1988, reconhecendo o risco de escassez no futuro desse recurso natural, mudou o enfoque sobre as águas, considerando-as bens da União e dos Estados. Com isso deixaram de existir as águas comuns e particulares, que estavam previstas no Código de Águas de 1934.
Que mudança isso trouxe para os produtores rurais? De imediato, nada. Mas paulatinamente, a legislação pátria começou a estabelecer critérios para o uso das águas, visando garantir sua disponibilidade em quantidade suficiente para todos e em qualidade adequada à manutenção da saúde humana. Assim, em 1997, foi criada a Lei 9.433, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos.
A água é um bem de domínio público, um recurso natural limitado e que tem valor econômico. Esses são os principais princípios da Política Nacional de Recursos Hídricos. Desta forma, é imprescindível uma gestão adequada desse recurso vital. Para isso, a lei prevê diversos instrumentos, entre os quais a outorga dos direitos de uso da água e a cobrança por seu uso. São esses os dois pontos que interessam diretamente ao produtor rural por representarem uma mudança radical entre o que vigia sob o Código de Águas e o novo enfoque dado pela Constituição.
O Estado de São Paulo, antecipando-se à legislação federal, estabeleceu sua política estadual de recursos hídricos por meio da lei 7.663/91, na qual já se previa a outorga e a cobrança pelo uso da água como instrumentos de gestão dos recursos hídricos. A Lei 12.183 de 2005 instituiu a cobrança em todo o território do Estado, a vigorar a partir de 2010.
Mas quanto vamos pagar pela água? Quem define esse valor? A quem será pago? O que será feito com esse dinheiro? Pois bem, para as águas estaduais, isto é, as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes ou em depósito (exceto as decorrentes de obras da União), o valor será estabelecido pelo comitê de cada bacia hidrográfica, dentro dos parâmetros da lei estadual 12.183/05 e do decreto estadual 50.667/05.
A cobrança será feita pelo órgão estadual responsável pela concessão da outorga de direito de uso, ou seja, pelo DAEE. É importante esclarecer que os recursos arrecadados ficam vinculados à bacia hidrográfica onde foram gerados, caracterizando o que se chama de “verba carimbada”, recurso com destinação específica, que formará um fundo a ser aplicado em financiamentos, empréstimos, ou mesmo a fundo perdido, para investimentos inseridos nos Planos de Bacias Hidrográficas.
Ainda, convém lembrar que os usuários de recursos hídricos, inclusive os da iniciativa privada, poderão obter recursos financeiros provenientes dessa cobrança.
Esse é um ponto em que a legislação estadual diverge positivamente da legislação federal, já que os recursos arrecadados pelo uso de águas da União, apesar de vinculados às bacias que os gerarem, ficarão mantidos à disposição da ANA, Agência Nacional de Águas, na Conta Única do Tesouro Nacional, e não há qualquer previsão de que os usuários pagantes possam se beneficiar de empréstimos oriundos desses recursos.
Dentro da política estadual de recursos hídricos, a Resolução conjunta da SES-SERH-SMA de nº 3, de 21 de junho de 2006, estabeleceu critérios para a outorga de direito de uso de água subterrânea, isto é, para a instalação de poços. Essa resolução visa à garantia de que a água captada do subsolo não esteja contaminada, que a implantação do poço obedeça às condicionantes do licenciamento ambiental, quando localizado em empreendimento sujeito a esse licenciamento e que, caso seja necessária a supressão de vegetação para a implantação do poço, essa seja objeto de autorização do órgão competente.
E é claro, estando o uso sujeito à outorga, estará também sujeito à cobrança.
O DAEE está cadastrando os usuários de recursos hídricos, de modo que estes estão sendo notificados para declarar os usos não outorgados, os usos em quantidade superior à outorga, os usos em conformidade com a outorga e a concentração de poluentes no efluente final, objeto ou não de licenciamento ambiental. Essa regularização perante o DAEE é importante e o não atendimento à notificação poderá constituir infração administrativa. Na zona urbana os detentores de poços irregulares já foram notificados a proceder à regularização dos respectivos poços.
No Estado de Mato Grosso do Sul, a legislação estadual também previu a cobrança pelo uso da água, embora não tenha estabelecido prazo para início da cobrança.
Em 2004, a Secretaria do Meio Ambiente editou o Manual de Licenciamento Ambiental, cujas diretrizes foram autorizadas pela Resolução conjunta SEMA-IMAP nº 4 de 2004. A partir de então os poços tubulares profundos para captação de águas subterrâneas passaram a ser sujeitos à licença ambiental, a cargo do IMASUL, órgão ambiental estadual.
A Resolução SEMAC nº 8, de julho de 2009 dispôs, especificamente, sobre o licenciamento ambiental dos poços tubulares profundos. Ela estabelece prazos para a regularização dos poços tubulares que estão em operação de forma irregular, isto é, sem a devida licença. Essa regularização consiste em um licenciamento simplificado e prevê duas situações. A primeira é a dos poços tubulares instalados antes da entrada em vigor da Resolução SEMA-IMAP nº 4 de 13 de maio de 2004.
Para regularizá-los, os detentores deverão protocolar um Comunicado de Poço até 31 de dezembro de 2009. Dependendo da data do protocolo desse Comunicado de Poço, o detentor terá um prazo diferente para apresentar a documentação completa para o licenciamento. Quanto mais cedo for feito o protocolo, maior será o prazo dado para a apresentação dos documentos necessários. Assim, para Comunicado de Poço protocolado até 31 de agosto de 2009, o prazo final será 31 de dezembro de 2010; para protocolo entre 1º de setembro de 2009 e 31 de outubro de 2009, o prazo final será 30 de junho de 2010; e para protocolo entre 1º de novembro de 2009 e 31 de dezembro de 2009, o prazo final será 31 de março de 2010.
É importante informar que mesmo para esse licenciamento simplificado os documentos a apresentar incluem uma série de itens que demoram a ser obtidos, como certidões de órgãos públicos e análise físico-química e bacteriológica da água.
Assim, convém não deixar para fazer essa regularização na última hora. A outra situação é a dos poços instalados sem licença ambiental posteriormente à edição da Resolução SEMA-IMAP nº 4 de 13 de maio de 2004, mas anteriormente à Resolução SEMAC nº 8 de 6 de julho de 2009. Esses podem, também, ser objeto de licenciamento simplificado como explicado acima, mas sujeitam-se às penalidades previstas no art. 50 da Lei 2.406/02, que incluem advertência, multa de até R$10.000,00, e até o embargo definitivo, com a revogação da outorga de uso dos recursos hídricos.
Como se vê, a cobrança pelo uso da água é uma questão definitiva e iminente.
Assim, a outorga de direito de uso é o primeiro passo para que os órgãos ambientais e/ou de gestão dos recursos hídricos possam ter um controle sobre a utilização desses recursos e gerenciá-los de forma eficiente e de modo a contemplar a todos. Dessa forma, é necessário fazer a regularização dos usos que dependem de outorga. O descumprimento da legislação ambiental traz prejuízos ao produtor rural, em especial aos pecuaristas, pois além de sujeitar-se a multas elevadíssimas, perdem a certificação ambiental, um dos requisitos para a venda de carne à Comunidade Européia e, em breve, para todo o mercado externo.