A queda dos preços internacionais poderá fazer com que as exportações do agronegócio brasileiro registrem a primeira queda em dólar nos últimos dez anos, afetando, principalmente, os resultados do setor de carnes. A retração no volume das exportações do produto in natura, que em 2008 foi de aproximadamente 20%, avançou nas primeiras semanas de 2009 e fechou o mês de janeiro com queda de 35,4%. Comparando o período a janeiro de 2008, a redução na receita das exportações de carne bovina in natura já ultrapassa 50%, de US$16,6 milhões para US$8 milhões.
“O mercado para os frigoríficos é visto com preocupação”, disse Célio Porto, secretário de Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Ele destacou que a relação entre produtores e frigoríficos já é desgaste e que em outras ocasiões resultou na redução de oferta de boi.
Ontem, o Frigorífico Independência anunciou a suspensão das atividades de sua planta localizada em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Em comunicado oficial, a empresa disse que estava sendo prejudicada pela ociosidade industrial criada pela dificuldade na obtenção de matéria-prima. “Essa decisão foi tomada diante da realidade do mercado. Sabemos do impacto social e econômico das nossas atividades e também o quão delicada é a situação e por isso procuramos tomar as devidas providências com o maior respeito possível a todos os envolvidos”, afirmou em nota Osvaldo Prado, diretor administrativo do Independência. A planta de Campo Grande tem capacidade de abate de mil animais por dia.
Além do contexto de crise financeira, a escassez da oferta pode se repetir influenciada também por razões climáticas. “A seca, que atingiu o Rio Grande do Sul e o vizinho Uruguai, até ajudou os frigoríficos no final do ano passado [sem pasto, os produtores foram obrigados a negociar]. Agora, porém, não tem boi gordo”, avalia Fabiano Tito Rosa, analista da Scot Consultoria.
Na Argentina, a seca já provocou a morte de pelo menos 800 mil cabeças de gado. O período de chuvas no país começou no domingo e está previsto para continuar até a próxima quinta-feira. De acordo com meteorologistas, as baixas temperaturas e chuvas irregulares trouxeram alívio nos últimos dias. No entanto, mais chuvas são necessárias.
Exportações e protecionismo
Desenhando um cenário para 2009, que leva em conta as últimos cotações dos produtos agrícolas nas principais Bolsas, o Mapa prevê que as vendas externas recuem para US$63,4 bilhões em 2009, ante US$71,8 bilhões em 2008. Os dados foram divulgados pelo secretário de relações internacionais do Mapa, durante apresentação na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Apesar da previsão de uma queda da ordem de 11%, Porto, se mostrou otimista e considerou os primeiros resultados de janeiro positivo. “Os preços agrícolas que vinham caindo no final do ano se recuperaram”, disse. Ainda assim, Porto acredita que os preços não chegarão aos patamares de 2008, os maiores dos últimos dez anos.
Em reais, os valores ainda serão superiores aos registrados em 2008. O Mapa estima exportações de R$145,9 bilhões em 2009, contra R$131,7 bilhões em 2008, trabalhando com um câmbio na faixa de R$2,30. “A agricultura sempre respondeu bem ao dólar valorizado. Quando os preços caem, só os mais competitivos sobrevivem e o Brasil é um deles”, avaliou Célio Porto.
Apesar da afirmação, Porto destacou a preocupação quanto ao fortalecimento de medidas protecionistas e a falta de crédito para as operações de Adiantamento de Contrato de Câmbio (ACC). Segundo ele, a média diária dos pedidos de liberação em 2008 foram muito baixas comparadas aos números globais de 2007 e em janeiro o Banco Central registrou uma média abaixo da verificada em qualquer um dos meses do ano passado.
Presente no evento da Fiesp, Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, também alertou para o crescimento do que ele considera um neoprotecionismo. Segundo Rodrigues, apesar dos fundamentos serem favoráveis às exportações agrícolas e o País se mostrar competitivo no setor, se algumas questões não forem resolvidas, a retração poderá ser mais acentuada que a das últimas projeções. “Além de sentir os efeitos de uma recessão afetando os países emergentes, mecanismos do neoprotecionismo poderá inibir a formação de mercados”, avalia. “Se esses fatores forem contornados a redução nas exportações deve variar de 10% a 15%, mas se não a queda pode ser maior”, disse.
Fonte: DCI. Agronegócios. Por Priscila Machado. 3 de fevereiro de 2009.