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Uso de aditivos utilizados na ensilagem da cana-de-açúcar

por Andrea Brasil Vieira José
Quarta-feira, 15 de outubro de 2008 -12h19
por Diego Augusto Ribeiro

Ao eleger a cana-de-açúcar como uma cultura passível de ser ensilada, os produtores devem estar cientes da necessidade de utilizar um aditivo, o qual deverá inibir a população de levedura e/ou bloquear a via fermentativa de produção de álcoois (Nussio & Schmidt, 2005, citados por Nussio et al., 2007). Estes mesmos autores afirmam ainda que, se ensilada sem o uso de aditivos, a silagem de cana-de-açúcar poderá se comportar como uma das fontes mais onerosas de matéria seca (MS) e energia para o rebanho.

Os aditivos utilizados nesse tipo de ensilagem podem ser classificados como químicos e biológicos. Especificamente, os aditivos químicos podem ser classificados em subgrupos de acordo com o modo de atuação ou função: aditivos nutrientes, agentes alcalinizantes ou hidrolíticos e aditivos conservantes, que podem ser ácidos ou sais. Quando utilizados no processo de ensilagem os aditivos alteram o perfil fermentativo, uma vez que influenciam o pH final da silagem, aumentam a pressão osmótica do meio, dificultando o desenvolvimento de microrganismos indesejáveis e alteram a composição bromatológica da planta, aumentando a concentração de carboidratos solúveis no material ensilado. Alguns deles podem atuar, também, em vários fatores ao mesmo tempo, influenciando ainda mais o padrão fermentativo.

Além disso, determinados aditivos possuem em sua composição, elementos que servem como fonte de nutrientes para os animais Nussio et al. (2006).

Uréia: a uréia pode ser classificada como um aditivo químico da classe dos nutrientes, pois quando adicionada à silagem de cana-de-açúcar promove elevação do teor de proteína bruta da mesma. Vem sendo utilizada em muitos experimentos com silagem de cana-de-açúcar, com o intuito de promover aumento da estabilidade aeróbia devido à ação antifúngica da amônia.

Além disso, a uréia é capaz de diminuir as perdas de MS e de açúcares solúveis do material tratado (Nussio et al., 2006). Segundo Nussio e colaboradores (2006), doses muito elevadas exercem um efeito tampão, sendo críticas ao processo de fermentação. Além disso, quanto maior a dose utilizada, maiores são os teores de nitrogênio não protéico na fração de proteína bruta. É importante ressaltar, que a recuperação de N (nitrogênio que ficou na massa depois da perda gasosa) nas silagens aditivadas com uréias é geralmente alta (acima de 70%), o que deve ser computado como benefício adicional na escolha desse aditivo, uma vez que o N recuperado será considerado como fonte de nitrogênio não protéico na composição da ração, para o ruminante (Nussio et al., 2006).

Cal Virgem: as rochas moídas misturas de calcita e dolomita, utilizadas na agricultura para a correção de solos ácidos, possuem em sua composição carbonatos de cálcio (CaCO3) e de magnésio (MgCO3) que são pouco solúveis em água. Podem ainda conter impurezas, como matéria orgânica, silicatos, fosfatos, sulfetos, sulfatos e outros óxidos. O processo de calcinação (aquecimento) dessas rochas tem como produto final o óxido de cálcio (CaO), também conhecido como cal virgem. O processamento das rochas calcárias para a geração de compostos mais reativos traz como benefício adicional, a obtenção de produtos livres de elementos tóxicos. Desta forma, os produtos podem ser utilizados como aditivos na produção animal, sem ocasionar risco de intoxicação alimentar. A cal microprocessada utilizada, recentemente, para o controle da fermentação alcoólica em silagens de cana-de-açúcar é um exemplo dessa classe de aditivos. A adição desse produto durante o processo de ensilagem provoca elevação do pH e aumento da pressão osmótica, alterando a população de microrganismos e modificando, assim, o perfil fermentativo das silagens (Nussio et al., 2007).

Atualmente, tem-se observado uma crescente utilização da cal virgem em silagens de cana-de-açúcar, em substituição ao hidróxido de sódio. Os trabalhos até então realizados sugerem silagens com reduzidas perdas de MS e com maior valor nutritivo. O único cuidado a ser considerado pelo uso desses aditivos é com a elevação dos teores de cálcio, que poderia causar um desbalanço dos minerais da ração, principalmente fósforo. Entretanto, esse problema pode ser contornado através da utilização de suplementos minerais que apresentam baixos teores de cálcio. Embora existam relatos de resultados positivos no controle de perdas da fermentação nas silagens, a pesquisa ainda vem buscando respostas quanto à utilização desses aditivos no metabolismo e desempenho animal (Nussio et al., 2006).

Benzoato de sódio: a aplicação de 0,1% de benzoato de sódio resulta em redução da população de leveduras e no teor de etanol, além de conservar uma maior quantidade de carboidratos solúveis. Em relação às perdas, a aplicação de 0,1% de benzoato, resulta em perdas totais de MS de aproximadamente 17%, enquanto na silagem sem aditivo as perdas atingem 35% da MS.

Apesar da relativa eficiência no controle de microrganismos indesejáveis, esse aditivo não é muito utilizado no Brasil em virtude da pouca tradição de uso. Além disto, o alto custo unitário do produto inibe sua utilização como aditivo em silagens, embora o custo da tonelada tratada seja semelhante as demais opções de aditivos no mercado, o que justifica sua utilização (Nussio et al., 2006).

Lactobacillus buchneri: segundo Ribeiro e colaboradores, em 2005, citado por Nussio et al. (2007), a inabilidade de bactérias ácido-lática homofermentativas em promover estabilidade aeróbia despertou o interesse em se pesquisar bactérias heteroláticas capazes de produzir ácidos com efeito antifúngico e, ao mesmo tempo estáveis, em meio aeróbio. Assim, o L. buchneri se tornou uma opção como aditivo, pois além de produzir ácido acético, que é comprovadamente um agente antifúngico, não produz etanol graças à ausência da enzima acetaldeído desidrogenase. A incapacidade de síntese de etanol pelo L. buchneri é extremamente desejável, já que muitas bactérias heteroláticas produzem álcool quando fermentam glicose e frutose até gliceraldeído 3-fosfatado e acetilfosfato pela via 6-fosfogluconato.

Segundo Nussio et al. (2007), em um trabalho realizado por Pedroso et al. (2007), foram avaliados os efeitos de aditivos bacterianos, como L. pantarum e L. buchneri, e químicos, benzoato de sódio, sorbato de potássio e uréia, e concluíram que o L. buchneri é um dos aditivos mais promissores, pois diminui a produção de etanol na silagem e aumenta a estabilidade aeróbia. A silagem aditivada com a bactéria demorou 78 horas para perder a estabilidade, o que corresponde a aumento de 63% em relação à silagem controle. O teor de etanol encontrado na silagem com L. buchneri foi de 1,9% da MS, enquanto que, na controle, este teor chegou a 3,8% da MS. Já em um trabalho anterior, em 2006, Pedroso et al., avaliaram o desempenho de novilhas recebendo silagem de cana-de-açúcar queimada e observaram um aumento nos índices de desempenho dos animais quando estes recebiam silagem tratada com L. buchneri, e observaram uma melhor conversão alimentar apresentada pelos animais recebendo a silagem aditivada (7,73 kg MS/kg GPD), em comparação com os animais recebendo a silagem controle (9,37 kg MS/kg GPD). É o resultado de um consumo similar, associado a um ganho de peso diário 32% maior para os animais ingerindo a silagem aditivada com a bactéria.

Hidróxido de Sódio: o hidróxido de sódio é um aditivo muito utilizado para aumentar a digestibilidade de palhadas. Segundo Siqueira et al. (2007), alguns autores recomendaram a utilização do NaOH na ensilagem da cana-de-açúcar, pois, segundo eles, este álcali foi capaz de alterar a fermentação basicamente alcoólica para fermentação predominantemente lática. O aumento, no caso da silagem de cana-de-açúcar, resulta da elevação do pH inicial, que estimularia a atuação das bactérias acidoláticas inoculantes (P. acidipropionici + L. plantarum e L. buchneri). A soda cáustica, uma base forte, quando diluída em água e aplicada na cana-de-açúcar, apresenta alta reatividade, sendo por isto um produto eficiente no controle de perdas de MS e na produção de etanol. As silagens são tratadas com doses que variam entre 1 e 3% de NaOH e apresentam redução no teor de etanol. Entretanto, as doses de 2 e 3% de NaOH quando aplicadas às silagens, podem causar diminuição da estabilidade aeróbica. Doses de NaOH superiores a 2% aumentam a digestibilidade in vitro da MS e diminuem a porcentagem de FDN e FDA, favorecendo o teor de carboidratos solúveis e, menos estabilidade aeróbica do material. De modo geral, silagens de cana-de-açúcar tratadas com hidróxido de sódio apresentam menores perdas de MS, redução da fermentação alcoólica, melhoria da composição bromatológica, maior teor de ácido lático, aumento no consumo e ganho de peso de animais, em relação à silagem sem aditivo. Além disto, promovem maior fluxo total de nitrogênio e maior eficiência na síntese de proteína microbiana, no rúmen. Embora apresente resultados satisfatórios, o uso de hidróxido de sódio, tem sido evitado em virtude da possibilidade de contaminação do ambiente e do excesso de sódio na ração, nas fezes e urina dos animais e, sobretudo, pelo dano potencial à saúde humana causada durante sua aplicação, em especial problemas respiratórios e epiteliais (Nussio et al., 2006).

Comportamento ingestivo, consumo voluntário e digestibilidade em bovinos de corte: Para McDonald et al. (1991), citado por Schmidt et al. (2007), o ácido acético em altas concentrações, na silagem, tem sido associado a desempenho animal insatisfatório, em decorrência de baixo consumo voluntário de MS. No entanto, segundo estes autores, estudos indicam que o acetato apenas induz a uma ligeira redução do consumo e que efeitos negativos mais severos devem ser resultado de outras variáveis associadas a fermentações indesejáveis.

Segundo Allen (1997), citado também por Schmidt et al. (2007), a ingestão voluntária de MS de forragens, por ruminantes, é limitada pela distinção resultante do fluxo da digesta pelo tubo gastrintestinal. Em virtude da fermentação e passagem mais lenta da FDN pelo retículo-rúmen, em comparação a outros componentes, esta fração tem sido indicada como principal reguladora de ingestão em dietas à base de forragem. Contudo, esse autor ressaltou que outros fatores, como tamanho de partículas, efetividade e efetividade de mastigação, fração indigestível da FDN e taxa potencial de fermentação da FDN, podem afetar o enchimento do retículo-rúmen.

A escolha do aditivo a ser usado na silagem, deve levar em consideração vários fatores como custo final da silagem, menores perdas de MS, fornecimento de nutrientes para os animais, facilidade de aplicação/manipulação e, ainda, consumo e desempenho animal. Levando-se em conta a maioria destes fatores, é possível fazer uma escolha adequada.

Referências Bibliográficas

NUSSIO, L.G; SANTOS, M.C. Aditivos químicos na ensilagem de cana-de-açúcar. Leite DPA, Goiânia, n. 63, p. 8-12, maio. 2006.

NUSSIO, L.G; SANTOS, M.C; QUEIROZ, O.C.M. Produção de ruminantes em pastagens. In: Simpósio sobre manejo de pastagens, 24., Piracicaba, 2007. Anais. Piracicaba, FEALQ, 2007. p.243-271.

SCHMIDT, P. et al. Aditivos químicos e biológicos na ensilagem de cana-de-açúcar. 1-Composição química das silagens, ingestão, digestibilidade e comportamento ingestivo. Revista Brasileira de Zootecnia, Jaboticabal, v. 36, n. 5, p. 1666-1675, 2007.

SIQUEIRA, G.R. et al. Associação entre aditivos químicos e bacterianos na ensilagem de cana-de-açúcar. Revista Brasileira de Zootecnia, Jaboticabal, v. 36, n. 4, p. 789-798, 2007.


Diego Augusto Ribeiro – graduando em Engenharia Agronômica, ESALQ-USP.






Andrea Brasil Vieira José – Engenheira Agrônoma, ESALQ-USP, Coordenadora de Projetos Boviplan Consultoria.