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Qual é a medida?

por Rogério Goulart
Segunda-feira, 11 de maio de 2009 -17h15
Até agora o preço da arroba caiu quase R$17,00 desde junho do ano passado. Você se lembra do ano passado, não é? Foi lá que a arroba atingiu o seu pico, valendo R$94,41.

Agora estamos falando de uma arroba na casa dos “setenta”. É impressionante a combinação de coisas que nos levaram até aqui.

Primeiro, a crise de crédito. Hoje é sabido que as empresas estavam com crédito demais. Crédito é a ruína do homem, caro leitor. A ninguém deveria ser dado tanto dinheiro com esse tipo de abandono. Fatalmente ele usará e abusará desse crédito acima da medida, e fará o proverbial “abrir demais as pernas”. É a velha história sendo contada ao vivo no século XXI. A ganância desmedida falou mais alto que a prudência. Novamente.

O crédito estava fácil não somente para o comprador, é claro. Para o vendedor também. Vários confinamentos foram montados e estruturados nos últimos anos a custa do dinheiro dos outros. Alguns deles estouraram ano passado, mas não antes de despejar o gado no mercado.

A demanda por animais magros nos últimos dois anos foi asfixiante para quem está no ramo há mais tempo. Ficou difícil demais comprar garrotes. A alta do bezerro nesse contexto foi impressionante e explica muito da retenção de fêmeas pela qual estamos passando.

Então veja a confluência dos dois rios. De um lado a demanda externa subitamente diminuiu pelo estouro da bolha de crédito. Do outro lado, a oferta aumentou na entressafra pelos projetos de oferta de animais baseados em crédito que estouraram. O resultado foi a primeira queda da arroba na entressafra dos últimos 15 anos. Não é pouca coisa.

Todo mundo saiu queimado dessa história. Alguns perdendo a dignidade... alguns perdendo a cabeça.

Para complicar a história o tempo não ajudou. Quem ficou segurando gado desde o ano passado até agora está a cada dia vendo a arroba valer menos em algumas regiões, por causa da falta de chuvas. Só espero que esse cara não tenha deixado para vender tudo agora na bacia das almas.

Mas então, o que sentimos até agora foi o baque do crédito na demanda, ou seja, nos frigoríficos e nos importadores. A oferta de animais confinados no ano passado entrou no mercado e fez o estrago que fez, mas todos esses animais já foram abatidos até agora.

A grande questão atualmente é outra. Qual será o efeito da crise de crédito na oferta de animais nesta entressafra?

Muitos confinamentos foram montados baseados em dinheiro dos outros. Alguns outros confinamentos perderam dinheiro no ano passado, e o pessoal saiu chamuscado, como disse. Será que haverá oferta de animais suficiente neste ano para repor a saída desses grupos? Será que o restante dos outros confinadores conseguirá suprir o baque da falta desses grandes confinadores?

Bom, as duas pesquisas que vi por aí dizem que sim. A Assocon e a Scot dizem que haverá, no mínimo, estabilidade em relação ao ano passado.

Pode ser que sim, pode ser que não. Na praça, o comentário geral que escuto é de ceticismo em relação a essas pesquisas. Dizem que estão muito otimistas. Com quem tenho conversado a idéia é de diminuição de animais confinados.

Mas quem irá diminuir? Quem já faz o confinamento em sua estratégia de engorda? Não são esses, dizem. Quem diminuirá drasticamente a oferta são as empresas que até o ano passado confinavam com dinheiro dos outros.

É fato que esse dinheiro sumiu, mas e os confinamentos, vão ocorrer? Essa é a grande história, mas infelizmente não dá para medir a verdade de quem fala. Não há checagem de números, não há contagem real de animais. O que se tem são intenções. Intenções, como o humor, mudam. O que temos hoje é o suplício de ouvir: “Ah, ouviu dizer de outro dizer, que vem de uma fonte segura, blá blá blá...” Ai, ai.. paciência!

Falta de crédito significa falta de dinheiro. Para confinar muito boi, precisa-se de muito dinheiro. Ligando os pontos, se a crise de crédito for tão forte na oferta como foi na demanda, é de se esperar uma redução no número de animais confinados. Não é o que vemos hoje no mercado futuro.

Hoje a idéia é de uma alta modesta, como podemos observar no gráfico abaixo.



O mercado caiu R$17,00 desde o pico do ano passado até agora. O fundo do poço da arroba até agora foi um pouco abaixo do preço do indicador à vista. Na sexta-feira (08/05), nessa barra laranja, a arroba valia R$77,78. O pior preço foi R$76,18, mais ou menos R$1,60 abaixo do preço atual.

O pico de R$86,31 de novembro-09 representa uma alta de aproximadamente R$10,00 da arroba esse ano sobre o piso de R$76,18.

Vamos parar e considerar. A arroba caiu R$17,00 até agora. O mercado espera que ela suba somente R$10,00 até o pico da entressafra. Ou seja, não vai subir nem o que caiu.

Com problemas de crédito de quem confina, com a redução do abate de fêmeas, com os problemas de seca em tradicionais regiões produtoras, com a retomada das exportações e com o consumo interno relativamente estável, como isso pode ser possível?

É por isso que discordo da precificação do mercado futuro. A junção desses fatores me conduz a pensar mais em uma alta da arroba no mercado físico que uma baixa até o final do ano. Para mim esses preços estão pessimistas demais. Não estão distorcidos, é bom dizer. O mercado está prevendo alta. Mas a análise aqui me leva a crer em uma alta maior da que o mercado futuro está esperando.

“Alta até onde?”, você pode me perguntar. Não sei, obviamente. O que sei é que no passado a arroba do boi tendeu a encostar-se à arroba do bezerro, como o gráfico abaixo demonstra.



Sentiu o frio na espinha, caro leitor? É... isso se chama oportunidade.

Não esquente com a baixa atual da arroba. Como tudo na vida, isso também vai passar.