Certamente você já ouviu falar que não presta colocar plantas no quarto de dormir. Meia verdade. Durante a noite as plantas não crescem, apenas queimam energia em seu metabolismo, liberando CO2 (gás carbônico ou dióxido de carbono) no ambiente. O fenômeno, porém, é quase imperceptível para os humanos.
Tudo depende da fotossíntese, processo que somente ocorre na presença do Sol. Por meio dela, ao contrário dos animais, as plantas "respiram" CO2 e expelem oxigênio. Os raios de luz penetram nos estômatos das folhas e, contando com água e sais minerais, absorvidos pelas raízes, provocam uma reação bioquímica capaz de transformar a energia solar em energia vital. Proteínas e carboidratos assim se sintetizam nos tecidos vegetais, formando a base das cadeias alimentares. Ciclo do carbono.
Compreender esse processo básico da ecologia ajuda a entender certa polêmica sobre as mudanças
climáticas. Pairam dúvidas sobre a real participação da agropecuária na agenda. Alguns a colocam como vilã do aquecimento global. Noutra vezes, o campo vira solução na crise ambiental. Percebe-se muito palpite e pouca informação científica nesse assunto.
Para começar, o óbvio. Se a natureza fosse mantida selvagem, a civilização humana não teria prosperado. O desmatamento ofereceu terras para a produção de alimentos e matérias-primas, exigidas crescentemente pela economia urbana. Necessária historicamente, a supressão de florestas virgens se esgotou e perdeu recentemente o apoio da sociedade. Hora de preservar.
Nenhum ecólogo discorda quanto ao efeito maléfico do desflorestamento. Primeiro, na influência sobre o regime de chuvas e a temperatura local. Segundo, no efeito deletério sobre o solo virgem, podendo afetar o regime hídrico. Terceiro, na perda da biodiversidade, favorecendo o surgimento de pragas e doenças agrícolas. Tais impactos exigem, em compensação, boas práticas agrícolas.
A questão se complica quando entram na conversa as emissões de CO2, gás considerado de efeito estufa. Sabe-se que moléculas de carbono (C) formam a base da matéria orgânica. Quando em combustão, reagindo com o oxigênio do ar, forma o CO2. Concentrando-se na atmosfera, o gás carbônico anda virando componente do mal.
Opinião unânime reconhece que a queima de petróleo e carvão mineral libera grandes quantidades de
CO2. A crescente utilização dessa energia fóssil acumulada durante milhões de anos nas jazidas profundas devolve à atmosfera o carbono então adormecido, provocando o aquecimento do planeta. “Bê-á-bá” climático.
Mas, no caso das emissões oriundas da agropecuária, imperam controvérsias. As lavouras e as pastagens se renovam constantemente, desde o plantio até a colheita. Nesse ciclo, as plantas absorvem carbono da atmosfera, crescem, frutificam e, depois, o liberam por meio das atividades humanas (digestão, por exemplo) ou na degradação natural.
Esse princípio de raciocínio explica por que, na metodologia internacional dos inventários ambientais, se consideram neutras as emissões provocadas pela queima de combustível renovável, como o etanol. O carbono presente no álcool carburante pressupõe que o canavial o tenha anteriormente sugado via fotossíntese. Estabelece-se, assim, um ciclo de absorção e liberação de moléculas de carbono, cuja conta final resulta zero.
Alguns cientistas e ambientalistas, preocupados com o terrível fenômeno do aquecimento da Terra, tendem a rotular o CO2 como um gás poluente. Ora, isso soa como heresia para os pesquisadores com formação biológica. Afinal, para os agrônomos o CO2 significa o gás da vida vegetal e, indiretamente, de toda a vida animal, incluindo, obviamente, o homem. Percebam a enrascada teórica!
No caso da zootecnia, que responde pela produção animal, o problema advém das emissões de gás metano, gerado na ruminação dos bovinos. Provocadas pela fermentação entérica, aquela que ocorre no estômago dos bichos, o gás metano se supõe bem mais pernicioso ao aquecimento do planeta que o CO2. Aqui também pairam divergências.
Alguns estudiosos andam desconfiados de que o efeito estufa do metano seja bem menor do que teoricamente se supõe. Calcula-se algo ao redor de, apenas, 6 vezes o poder do CO2. A diferença é brutal com relação ao número - 21 vezes - suposto até então. Mas o principal argumento de alívio para a pecuária parte do princípio de que o metano surge do pasto que o gado antes devorou. Ou seja, o boi - ou sua senhora vaca - não inventa moléculas de carbono, mas sim as engole da gramínea que lhe serviu de comida. A pastagem, por sua vez, somente pode crescer em razão da fotossíntese que previamente realizou. Resultado nulo para o aquecimento global.
Conclusão: seja devida ao menor impacto do metano, seja por uma razão de princípio bioquímico, a influência da criação de gado na equação climática reduz-se fortemente. Excelente notícia para as pessoas que comem carne, principalmente as famílias e os países mais carentes. Podem mastigar sem remorso.
O Instituto Florestal acaba de divulgar seu novo inventário da vegetação nativa em São Paulo. Estima-se que, nos últimos sete anos, tenha havido uma recomposição vegetal de 95 mil hectares no território paulista. Representam matas ainda jovens, que estão crescendo e absorvendo carbono do ar, acumulando-o nos tecidos vegetais. Daqui a 50 anos, essa recuperação florestal terá retirado da atmosfera, via fotossíntese, 28 milhões de toneladas de CO2. Equivalem às emissões de 8 milhões de ônibus a diesel rodando mil km por mês durante um ano inteiro. É fantástico. Efeito estufa ao contrário.
Problemas existem. Mas certamente a agropecuária sustentável faz parte da solução.