O primeiro semestre de Governo se mostrou bastante agitado em várias áreas das políticas públicas com a reorganização da estrutura normativa brasileira, entre leis, decretos, normas e, principalmente, medidas provisórias.
Também estiveram em pauta os assuntos mais importantes relacionados à segurança jurídica ambiental do produtor rural que, neste momento, precisa dar atenção ao Cadastro Ambiental Rural (CAR) e o Programa de Regularização Ambiental (PRA).
Antes do alerta, para melhor contextualização, o Código Florestal, em 2012, trouxe a obrigatoriedade da inscrição de todas as propriedades e posses rurais para o sistema do Cadastro Ambiental Rural (CAR). No Código Florestal, especificamente em seu artigo 29 (§3o.), ficou estabelecida a obrigatoriedade da inscrição no CAR no prazo de um ano contado da sua implantação, prorrogável, uma única vez.
A ‘implantação’ ficou sob responsabilidade do Ministro de Estado do Meio Ambiente, pois assim determinou o Decreto Federal 7.830/2012, responsável por regulamentar o Código Florestal1 e esta implantação aconteceu em 6 de maio de 2014, dois anos após o novo Código Florestal, quando, por meio da Instrução Normativa no. 02/2014, foi considerado implantado o prazo do CAR de 1 ano prorrogável mais um.
Foram feitas alterações no próprio texto do Código Florestal com a Lei Federal no. 13.925/2016 e os Decretos Federais 9.257/2017 e 9.395/2018, de forma que o artigo 29, passou a determinar a inscrição até 31/12/2017 prorrogando-se por mais um ano o prazo, se necessário. E assim foi feito até 31/12/2018.
A partir fim do prazo dos cadastros, o que já chamei em várias oportunidades de “Pós-CAR” deu início a uma segunda etapa, onde o produtor rural que possui falta de áreas de reserva legal ou áreas de preservação permanente, qual será a solução a ser adotada, sendo esta etapa conhecida como “PRA – Programa de Regularização Ambiental”, um conjunto de quatro instrumentos de regularização: I - o Cadastro Ambiental Rural - CAR, conforme disposto no caput do art. 5o. ; II - o termo de compromisso; III - o Projeto de Recomposição de Áreas Degradadas e Alteradas; e, IV - as Cotas de Reserva Ambiental - CRA, quando couber.
Esta etapa “pós-CAR” de regularização ambiental é fundamental não apenas para o melhor planejamento de ativos (cotas) e passivos ambientais, mas principalmente para reduzir o número de multas e complicações judiciais pela falta de regularização de propriedades rurais, como temos visto em muitas regiões do país onde a fiscalização se intensifica e por isso o prazo para adesão ao PRA se faz tão importante.
Qual era este prazo do PRA? Em um primeiro momento, o mesmo do CAR, pois assim determina o Código Florestal de maneira evidente:
Art. 59. [...] § 2o. A inscrição do imóvel rural no CAR é condição obrigatória para a adesão ao PRA, devendo essa adesão ser requerida no prazo estipulado no § 3o. do art. 29 desta Lei.
Então o prazo era aquele prorrogado até 2018, mas em um segundo momento a Medida Provisória no. 867 de 26/12/2019 prorrogou apenas o prazo do PRA para até 31 de dezembro de 2019.
Art. 59 [...] § 2o. A inscrição do imóvel rural no CAR é condição obrigatória para a adesão ao PRA, devendo essa adesão ser requerida até 31 de dezembro de 2019, permitida a prorrogação por mais um ano por ato do Chefe do Poder Executivo.
O que houve com este prazo? Por se tratar de Medida Provisória e que necessita ser convertida em lei pelo Congresso Nacional dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, prorrogáveis por igual período, não foi prorrogada pelo Congresso, conforme ato declaratório no. 35 do Presidente da mesa do Congresso Nacional que tornou sem efeito a MP867 em 4/6/2019.
E desta forma, inesperadamente, para aqueles que ainda contavam com o prazo para apresentar seus projetos de recuperação de áreas de passivos ambientais, passaram a uma condição de ilegalidade. Entretanto, em rápida manobra, surge outra Medida Provisória, desta vez, com o número 884 em 14 de junho, alterando CAR e PRA, vejamos como isto foi feito.
A alteração desta vez não foi no artigo 59 que trata do PRA, mas foi no próprio artigo 29 que trata do CAR, passando então a conter o seguinte texto: “Artigo 29. [...] § 3o. A inscrição no CAR será obrigatória para todas as propriedades e posses rurais.”
Logo, com a queda da MP867, o artigo 59, volta ao texto “devendo essa adesão ser requerida no prazo estipulado no § 3o. do art. 29”, justamente o que ficou sem prazo.
Assim, estariam o CAR e o PRA sem prazo e sem consequências para o produtor? Sem prazos sim, mas o problema é justamente a falta de prazo, ou seja, a possibilidade de que CAR e PRA sejam exigidos imediatamente do produtor.
E digo mais. Os reflexos são vários desta falta de prazo.
Primeiro, o crédito. Ao final do Código Florestal, o art. 78-A determina que “Após 31 de dezembro de 2017, as instituições financeiras só concederão crédito agrícola, em qualquer de suas modalidades, para proprietários de imóveis rurais que estejam inscritos no CAR” e diz também, no seu parágrafo único que “O prazo de que trata este artigo será prorrogado em observância aos novos prazos de que trata o § 3o. do art. 29”.
Ora, não há mais prazo. Atenção com o bloqueio de crédito.
Segundo, as áreas consolidadas. O código florestal autoriza que atividades agrossilvipastoris constituídas antes de 22/07/2008 em áreas de preservação permanente possam permanecer ali instaladas, desde que informadas no prazo do CAR e PRA, ou seja, um grande risco de fiscalização e determinação de demolições de construções em APP, como já têm ocorrido em várias localidades.
Enfim, cuidado com as medidas provisórias e mantemo-nos vigilantes com as etapas de regularização ambiental dos imóveis rurais pelo país.
1 Art. 21. Ato do Ministro de Estado do Meio Ambiente estabelecerá a data a partir da qual o CAR será considerado implantado para os fins do disposto neste Decreto e detalhará as informações e os documentos necessários à inscrição no CAR, ouvidos os Ministros de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Desenvolvimento Agrário.