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A ILPF é uma das respostas do agronegócio brasileiro?

por William Marchió
Terça-feira, 27 de agosto de 2019 -10h45


O mundo mudou, hoje todos temos uma janela aberta para o mundo na palma de nossas mãos, nosso smartphone. Daí as pessoas, como se estivessem conversando em um boteco, passam a excretar suas opiniões nas ditas redes sociais, sem nenhum fundamento, sem nenhuma preocupação com a realidade dos fatos, sem se importar com as repercussões daquele ato nefasto, e ainda conseguem discípulos seguidores como em algumas seitas religiosas por aí.


Como motivados em uma torcida de futebol, passam a agredir seus rivais ideológicos e tudo vira uma grande batalha mundial, regada por interesses direcionados, por ações políticas e por uma mídia sensacionalista. Seria até cômico, se não fosse trágico.


Enfim, são os dias de hoje.


Produzimos alimentos para uma população crescente, cada vez mais globalizada e conectada. Está clara nossa vulnerabilidade a este novo contexto. Nosso negócio rural está em constante ameaça destes movimentos, uma hora é a transgenia, são os defensivos agrícolas, outra hora é o desmatamento, o aquecimento global, o trabalho escravo, enfim a todo momento tem sempre algo deletério que envolve a produção brasileira de alimentos. Chega a ser cansativo, pois muitas destas acusações são infundadas, motivadas por diferentes questões, por interesses, por política, por ideologias. Dá até vontade de parar de produzir. Lembrando que “arvore que dá bons frutos é a que leva mais pedradas”.


Mas como bons brasileiros, nossa resiliência é incansável, sempre conseguimos fazer do limão uma limonada. Daí nossos sistemas integrados de produção agropecuária, ditos ILPF podem entrar em cena. Apresentar um modelo de produção sustentável em suas bases social, econômica e ambiental, dar respostas a estes reclames sociais urbanoides.


E como fazer?


O principal caminho é garantir a este consumidor que realmente fazemos aquilo que pregamos, por meio de certificações, podemos chancelar nossas propriedades e rastrear nossos produtos e com isso garantir acesso a diferentes mercados, onde estas questões de sustentabilidade passam a ter preço e nos remunerar por isso.


Estabelecer modelos simples de certificação e rastreabilidade que gerem confiabilidade, que possam ser facilmente implementados e replicados em todo o território nacional, como em várias iniciativas já existentes com diferentes organismos de certificação, inclusive internacionais, precisamos arrastar a credibilidade já existente em algumas certificações e implementá-las.


Será fundamental separar as fazendas que estão comprometidas com processos sustentáveis de produção agropecuária daquelas que não estão fazendo suas tarefas de casa. O Agronegócio legal, sustentável, que respeita o meio ambiente, não pode pagar por atos inconsequentes em terras sem lei.


Acabamos ficando vulneráveis a qualquer “laranja podre” em meio a um mar de suco de qualidade.


Devemos lembrar que, a estes mercados interessa aquilo que tem documentação, que tem condição de provar sua origem idônea, suas ações voltadas à sustentabilidade ampla. Certificar propriedades, garantir a rastreabilidade dos produtos, dar transparência total a processos, será fundamental para conseguirmos conquistar e manter estes mercados diferenciados. Não basta fazer, teremos que provar que está sendo feito.


O trabalho de comunicação do agronegócio brasileiro tem que ser diferente, temos que ter a população ao nosso lado e não contra nós como é agora. Temos que fazer com que nossa população valorize nosso produtor rural, temos que saber contar boas histórias do agro.


E quem paga esta conta?


O principal agente pagador destas ações deverá ser o consumidor que está clamando por produtos oriundos de produção ética e sustentável, com certificação de origem. Porém isso não é tão simples, será necessário o comprometimento das tradings, dos frigoríficos, dos fornecedores de insumos, dos supermercados. A ação deve ser sistêmica para que tenha êxito, toda a cadeia deverá estar comprometida. A partir do momento que houver queda de rendimentos devido à ausência desses modelos de certificação e rastreabilidade é que a cadeia começará a se mexer de forma efetiva. A exemplo da estrutura que os frigoríficos possuem hoje para provar a seus clientes internacionais que a carne é oriunda de áreas sem desmatamento e sem conflitos ambientais. Hoje somos líderes mundiais na produção e exportação de inúmeros produtos agrícolas, é natural que soframos toda esta pressão. Estamos alimentando o mundo, isso não vai ser de graça.


Não acredito também que atualmente o mundo possua alternativas aos nossos produtos. Não existe outra grande potência agrícola que consiga entregar toda a demanda que se espera para as próximas décadas.


Mas não podemos nos acomodar, assistimos os EUA se transformar em um grande produtor de etanol de milho em pouquíssimo tempo e desbancar qualquer hegemonia que o Brasil pudesse ter neste setor.


Construir processos ágeis que irão chancelar nossos produtos para ingressar nestes seletos mercados será fundamental.


Já temos cerca de 15 milhões de hectares com algum modelo de integração, já conseguimos produzir quantidades razoáveis de produtos passíveis de certificação, precisamos ligar estes produtores a estes mercados, necessitamos de atuar nestas cadeias como facilitadores. Podemos ter produtos certificados como a “Carne Carbono Neutro”, porém o mais importante será certificarmos fazendas sustentáveis, e chancelarmos todos os produtos oriundos destas propriedades. Isso pode ser através de vários selos, como o Carne Neutra, como soja com Baixa Emissão de Carbono, milho neutro, enfim uma séria de derivados de um programa “Guarda Chuva”, como o plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono) do governo federal. Agora estes planos deverão ir além de dentro da porteira, apresentar aos consumidores e ao mundo produtos oriundos da Agricultura de Baixa Emissão de Carbono.


Para quem já produz, para quem já tem em suas costas um pesado código florestal, isso passa até ser cansativo, ouvir este “blá, blá, blá”; mais uma para cima do produtor. Sei o quanto isso é desestimulante, o quanto isso drena energia do dia a dia, mais uma ação cartorária e burocrática a incomodar, aumentar custo, exigir mais gestão, controle, enfim mais um fardo a carregar. Nosso produtor, mais uma vez, terá que pagar o pato. Pagar pelo ônus de não sermos mais anõezinhos neste mercado mundial de alimentos, o Brasil incomoda.


O cooperativismo pode atuar de maneira significativa nestes processos, é a maneira mais fácil, rápida e barata para o produtor. Temos alguns bons exemplos na citricultura, na avicultura e na suinocultura. Infelizmente temos poucos exemplos na pecuária de corte.


Talvez a cadeia mais individualista e a que sofre mais com estas agressões e retaliações, é uma cadeia ainda bem imatura, será obrigada a evoluir rapidamente. Alguns exemplos no Paraná nos mostram o quanto o cooperativismo pode mudar a condição do produtor de carne bovina, o quanto ele pode agregar de valor a um produto diferenciado, o quanto o consumidor está havido por uma carne de melhor qualidade e está disposto a pagar por isso.


Enfim não existe remédio milagroso, dentro da porteira podemos implementar a ILPF, fazer uma agricultura e pecuária sustentável, seguir toda a legislação vigente. Porém, muito deverá ser feito fora da porteira a fim de que tenhamos frutos de árduo trabalho no dia a dia das fazendas sustentáveis.