Em artigo anterior, em outubro de 2020, tivemos oportunidade de discutir a respeito das gramíneas invasoras das pastagens, em que na ocasião, basicamente focamos nas duas espécies mais importantes: o capim-navalha (Paspalum virgatum) e o capim-capeta, ou capim-pt (Sporobolus indicus). Desde então algumas novidades surgiram, às quais avançaremos nesse tema e, mais ainda, focando agora apenas neste último: o capim-capeta, que vem se confirmando, como alertávamos naquela oportunidade, como de maior potencial de disseminação e problemática de controle.
Lembrando que gramíneas invasoras de pastagens englobam um número significativo e crescente de espécies, podendo-se citar, o inicialmente mencionado: capim-navalha (Paspalum virgatum) e também gramão (Paspalum notatum); capim-rabo-de-burro (Andropogon bicornis); capim-annoni (Eragrostis plana); capim-amargoso (Digitaria insularis), e em menor expressão de espécies como capim-de-várzea (Eriochloa punctata) e diversas espécies de capim-rabo-de-raposa (Setaria sp).
Figura 1.
Área infestada por capim-capeta (Sporobolus indicus)
Foto: Neivaldo Caceres
O Sporobolus indicus, conhecido pelos nomes populares capim-capeta ou capim-pt, representa um consenso entre os técnicos como o de maior desafio de controle, tratando-se de gramíneas invasoras de pastagens.
Sua presença começou a ser notada há mais de duas décadas, mas tem se disseminado de forma muito agressiva e dominando a paisagem onde surge. Áreas que há poucos anos não registravam sua presença, hoje estão tomadas por esta invasora.
Em 2015, essa espécie foi objeto de um Comunicado Técnico (268) da Embrapa Amazônia Oriental onde o autor, Moacyr B. Dias-Filho, traz importantes informações a seu respeito, com números preocupantes sobre sua capacidade de produção de sementes: 200 mil/planta/ano; longevidade de sobrevivência dessas sementes por até 10 anos no solo e um potencial de banco de sementes viáveis no solo de 20 mil sementes/m2.
Sua consulta pode ser obtida em:
https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/130418/1/COM-TEC-268.pdf
A disseminação de suas pequeníssimas sementes é extremamente eficaz através do vento, implementos agrícolas, pessoas e animais e, quando maduras, são recobertas por uma mucilagem viscosa que adere à qualquer superfície de contato, sendo assim, facilmente transportadas.
Suas folhas são extremamente finas e alongadas, com pontas quase sempre secas, e o topo da planta, com grande frequência, repleto de inflorescências, também secas.
Essas características morfológicas nos explicam por que o implemento Campo-Limpo, eficiente no controle de capim-annoni, é totalmente ineficaz no combate a esta planta, uma vez que o dispositivo embebido em herbicida deste equipamento, atinge partes da planta totalmente desprovidas de superfícies de absorção. Há quem se confunda e considere capim-annoni e capim-capeta como sendo a mesma espécie, mas estamos falando de Eragrostis plana e Sporobolus indicus, respectivamente. Recebemos frequentemente consultas sobre o uso desse implemento para o controle do capim-capeta e, por diversas vezes, já tivemos informações de frustação por parte de quem adquiriu o equipamento a um valor bastante significativo, pois, pela morfologia da planta aqui discutida, o controle não ocorre.
Figura 2.
Detalhe da planta do capim-capeta (Sporobolus indicus) e sua inflorescência.
Foto: Neivaldo Caceres
A intensa produção de sementes, com grande capacidade de dispersão, não é o único fator que explica seu acentuado avanço em infestações nas pastagens. Apesar de ser gramínea, também influencia sua baixa aceitabilidade pelo gado, devido o material ser extremamente fibroso e, por consequência, com baixo valor nutritivo. Teores de proteína bruta, medidos nas folhas desse capim, variam de 5,5%, em plantas ainda na fase vegetativa, a 4,0%, em plantas já no início da floração. Essa baixa aceitabilidade pelo gado ao capim-capeta lhe confere uma grande capacidade competitiva em relação à forrageira cultivada, passando a dominar o pasto e direcionando ainda mais o pastejo para as plantas forrageiras remanescentes (Dias-Filho, 2015).
A magnitude do teor de fibras no capim-capeta pode ser comprovada pela percepção do pessoal de campo que roça essas plantas e reportam a dificuldade que é a roçada mecânica de um pasto infestado, onde observam a acelerada degradação do corte das lâminas e esforço demandado pelo trator nessa operação.
Observem na figura 3 uma área no interior de São Paulo onde as plantas roçadas rebrotavam vigorosamente, apresentando um material bastante duro e de difícil pastejo pelo gado.
Figura 3.
Área parcialmente roçada e detalhe do rebrote de capim-capeta (Sporobolus indicus).
Foto: Neivaldo Caceres
A roçada mecânica é sem dúvida das mais ineficientes operações, recaindo sobre o controle químico as maiores esperanças de controle do capim-capeta. No entanto, este é um grande desafio, a começar pela indisponibilidade de produtos registrados para pastagem que o constem como planta alvo em sua bula.
Não havendo recomendações oficiais, parte-se para observações práticas que, em diversas oportunidades, tem mostrado algum caminho.
O glifosato em aplicação localizada é uma opção, mas impraticável na maioria das áreas pelas altas infestações encontradas. Aplicado em área total, em dessecação da pastagem pré-renovação, é uma importante ferramenta, mas em nada auxilia com o banco de sementes do solo, que fatalmente virá após o plantio da área, onde poderia entrar a Atrazina em pré-emergência como opção.
Nas plantas adultas, a Atrazina tem se mostrado ativa, mas em altas doses (10L/ha ou mais), com excelente seletividade à pastagem, mas com dois problemas: não há formulações registradas para uso em pastagens e sua ação é efêmera. Ocorre um intenso secamento das touceiras do capim-capeta por 50 a 60 dias após a aplicação, mas, posteriormente, estas rebrotam em sua quase totalidade, ou seja, é proporcionado um efeito temporário, que beneficia a pastagem e permite sua recuperação, mas o controle não é efetivo.
Na maioria dos casos a renovação da pastagem, com sua prévia dessecação, é uma boa solução, ainda que momentânea, como alertado anteriormente devido ao banco de sementes existente no solo. Havendo a possibilidade de a área receber rotação de culturas por dois a três anos consecutivos, utilizando-se herbicidas graminicidas para essas culturas, o capim-capeta sofrerá significativa redução em sua população e no potencial banco de sementes do solo, levando, senão à sua eliminação, a um nível de infestação que permitiria seu controle de modo mais racional, através de catação, nos anos subsequentes.
Como mencionado, não há produtos especificamente registrados para o controle de Sporobolus indicus em pastagens, entretanto, diante de uma clara demanda do setor pecuário, diversas empresas fornecedoras de insumos estão no caminho para propor soluções dentro de seus portfólios de produtos em um futuro próximo.
A mencionada Atrazina possui dezenas de formulações líquidas contendo 400 ou 500 g ai/L, ou 900 g ai/kg em formulações sólidas WG. Mais recentemente, tem sido testada uma formulação de Atrazina em mistura com Mesotriona: 500 g ai/l de Atrazina + 50 g ai/l de Mesotriona. Esta formulação tem apresentado resultados promissores de controle, com seletividade às gramíneas forrageiras. Também se avalia que algumas moléculas com registro para controle de plantas daninhas em arroz tenham potencial de uso para controle desta espécie em pastagens, mas esses estudos caminham sob confidencialidade e não se pode avançar além desta informação, entretanto fica um alento de que a indústria está se movimentando na busca de soluções para este problema que tanto incomoda a pecuária na atualidade.
Conhecendo como são os processos de registro de produtos fitossanitários no Brasil, também trago uma outra notícia animadora. Esses novos registros em sua maioria trazem moléculas já comercializadas em outras culturas, ou seja, não se trata de moléculas inéditas no país, o que abrevia um pouco o tempo que os órgãos oficiais demandam para expedi-los. Para se ter uma ideia, novas moléculas demandam às vezes mais de 5 anos para ter sua avaliação e aprovação para registro e uso no país. Tratando-se de moléculas já registradas, pode-se ter como horizonte algo entre 12 e 18 meses para liberação de registro e comercialização para uma nova cultura, no caso, as pastagens.
O pecuarista que possui uma propriedade infestada por gramíneas invasoras deve se conscientizar que seu combate será uma atividade rotineira e permanente dentro de seu quadro de atividades. Não considere que uma única ação, operação ou aplicação de herbicidas será a solução dos seus problemas. Deve-se estabelecer um programa de combate, na maioria das vezes por vários anos no mesmo local. A catação localizada anual química, ou até mecânica com arranquio, pode ser uma estratégia, caso o nível de infestação seja administrável por essa prática. E lembrar que qualquer retrocesso nas ações de combate dessas pragas cobrará um esforço como se nada tivesse sido feito anteriormente, tudo voltando à estaca zero.
E finalmente, ter sempre em mente a palavra mágica “manejo”: respeitando entrada e saída dos animais nas alturas adequadas de corte para cada espécie forrageira, impedindo a ocorrência de sub ou super pastejo, crucial para que não surjam áreas de solo descoberto e a pastagem possa exercer pressão competitiva sobre as plantas indesejáveis. Não esquecer também das adubações de manutenção e calagem, quando a análise de solo indicar necessidade, sempre pensando em dar ao pasto os recursos necessários para que a disputa com as invasoras seja vencedora.
No fim de 2021 lançamos o livro “Plantas Daninhas em Pastagens: biologia, manejo e controle” onde estas e outras informações são discutidas em detalhe a respeito das invasoras nas pastagens.
Acesse o site www.ntcconsultagro.com.br para maiores informações a respeito desta publicação.