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Dimensionamento de benfeitorias e edificações em sistemas de produção de carne em pastagens - Parte 1

por Adilson de Paula Almeida Aguiar
Segunda-feira, 21 de agosto de 2023 -06h00


Agora a pastagem está estabelecida? Depende! Considerando uma área onde não havia a atividade pecuária, ou seja, a área era de vegetação nativa ou era cultivada com agricultura, e agora será convertida para a atividade de produção de carne bovina, a resposta é “não”, a pastagem ainda não está estabelecida. E por que não? Se a forragem disponível lá na área recém estabelecida fosse ser colhida para conservação (ensilagem, fenação, pré-secagem etc.), aí sim, a cultura estaria estabelecida. Ou se fosse uma área cultivada, por exemplo, para a produção de grãos, aí também, a cultura estaria estabelecida. Isso porque, quando estas culturas alcançam o seu ponto de colheita, são colhidas por colhedoras, ou de forragem, ou de grãos. No caso específico da pastagem, quando a forragem chega no ponto de ser colhida, a colheita é realizada por uma “colhedora viva” o: animal. E esta colhedora viva tem exigências bastante específicas, tal como as colhedoras de forragem, ou de grãos, têm as suas. Assim, as benfeitorias e as edificações de uma fazenda de pecuária têm suas particularidades.


Então qual será o próximo passo? A construção das edificações e das benfeitorias. Este é o tema deste artigo e do próximo.


Durante o tempo que ajudei a minha família na nossa fazenda, e em 32 anos de trabalho de campo como consultor, foi possível inventariar e daí diagnosticar que nas fazendas pioneiras a construção das edificações e das benfeitorias foi baseada em experiencia prática, em um histórico de acertos e erros dos pecuaristas e de integrantes das suas equipes. Não havia base científica sobre as dimensões das benfeitorias e das edificações, mas, nos últimos anos, tem sido possível inventariar e diagnosticar que uma preocupação dos pecuaristas e dos técnicos é sobre como dimensionar as benfeitorias e as edificações, e a pesquisa tem dado suporte à esta demanda. Então vamos avaliar alguns dados de resultados de pesquisas nesta linha.


1) Dimensionamento dos setores da fazenda


Dependendo da área útil de pastagem da fazenda, é preciso dividi-la em setores, que também são denominados por retiros. Qual deve ser a área de um retiro? Bem, eu nunca encontrei pesquisas nesta linha, mesmo porque, em nível de centro de pesquisa ou de universidade, não é fácil viabilizar este tipo de investigação por causa das grandes áreas que seriam demandadas.


Entretanto, aqui vou colocar a minha experiencia prática: pensando em otimizar a movimentação dos animais dos piquetes para os currais de manejo e de volta para os piquetes, como também o deslocamento de máquinas, implementos, veículos, eu tenho recomendado no máximo 1.000 ha por retiro, apesar de acompanhar fazendas que têm retiros de 7.000 ha.


2) Localização da infraestrutura central dos setores da fazenda


Em uma fazenda de pecuária, a infraestrutura central básica de um setor, ou retiro, possui as seguintes benfeitorias e edificações: casas do capataz e dos peões e curral de manejo dos animais, enquanto o setor denominado “sede”, ou setor principal, tem as casas do proprietário, do gerente, do capataz, dos peões etc., tem o escritório, o almoxarifado, os galpões para máquinas, implementos e veículos, a fábrica de ração, a bomba para combustível, um refeitório ou a cantina etc.


Ainda pensando na movimentação do rebanho, no deslocamento de máquinas etc., recomendo quanto mais centralizado for a infraestrutura central, melhor. Naquelas fazendas pioneiras, os retiros ficam em um canto da propriedade, geralmente próximo a um rio, o que é compreensível voltando ao passado quando ainda existiam sistemas hidráulicos nas fazendas. Mas todos reclamam da maior dificuldade de se ter retiros, como se diz, “recanteados”.


3) Modulação das pastagens


O módulo de pastoreio é uma unidade que deve ter uma fonte de água, cochos etc., e seus piquetes para um ou mais de um lote de animais pastejarem a forragem disponível naqueles piquetes. Aqui, sempre há a dúvida de qual deverá ser o método de pastoreio, quantos módulos na propriedade, quantos piquetes por módulo etc.


Para esta definição é importante saber do pecuarista qual será a atividade: se ciclo completo, se cria, se recria, se recria e engorda ou se apenas engorda, para ser planejada a divisão do rebanho nas diferentes categorias necessárias quanto a grau de sangue, raça, sexo, idade, manejos sanitário e nutricional etc.


Como são muitos os fatores condicionantes, eu tenho recomendado modular a propriedade de forma que seja possível adotar um manejo flexível com os diferentes métodos de pastoreio existentes: de lotação contínua (1 piquete por lote de animais), de lotação alternada (2 piquetes por lote de animais) e de lotação rotacionada (no mínimo 3 piquetes por lote de animais). Este tipo de modulação possibilita apartar mais, ou reunir mais, os animais de acordo com as demandas para cada categoria do rebanho.


4) Tamanho e formato do piquete


Idealmente, um piquete deveria ter uma área de, no máximo, 7 ha e possuir um formato quadrado. O tamanho de 7 ha, além de facilitar um pastejo mais uniforme, não leva os animais a despenderem energia adicional no deslocamento durante o pastejo. O formato quadrado também contribui para um pastejo mais uniforme.


É claro que dependendo do formato da área, será preciso construir piquetes retangulares. Neste caso, o ideal é que o comprimento do piquete não tenha uma medida mais do que três vezes a sua largura.


Outra situação em que se renuncia ao formato quadrado, é no sistema de pastagem irrigada por pivô central, quando o formato que mais se adequa ao manejo de irrigação e de fertirrigação é o triangular, o conhecido formato “em pizza”, mas, nesses casos, existem as técnicas de manejo de fatiar a pizza com cercas temporárias ou móveis (uso do carretel e estacas móveis), ou até mesmo fixas, construídas no sentido transversal do piquete para reduzir o seu comprimento e, com isso, facilitar a uniformidade de pastejo.


Bem, eu acompanho fazenda de 20.000 ha de pastagens redivididos em 100 piquetes de 200 ha cada. Como o valor do investimento em cercas, cochos, bebedouros etc. e os custos de manutenção destas benfeitorias são altos, é preciso ter bom senso. Lá na fazenda comercial, entre o ótimo e o possível, na maioria das vezes se decide pelo possível. Mas é fato que, quanto menor for a área do piquete, mais o manejador do pastoreio terá o sistema “na mão”.


5) Tipo de cerca


Desde que o ser humano começou a domesticar os animais, por volta de 10.000 anos atrás, houve muita evolução na adoção de barreiras para delimitar as pastagens para o pastoreio dos animais. No início de tudo, o próprio pastor e seus cães eram quem limitavam os campos de pastejo. Quando houve início da apropriação da terra, o ser humano passou a construir cercas de pedras, de valetas, de paus etc., dependendo dos materiais disponíveis na região.


Com a invenção do arame, as cercas evoluíram desde o tipo de arame farpado, para a de arame liso até chegar nas cercas elétricas com diferentes tipos de fios (de arame mesmo, fita eletro plástica, cordão etc.). Hoje, já existe até cerca com campo magnético e, mesmo ausência de cerca, os animais são conduzidos eletronicamente e remotamente.


De todas estas alternativas de cercas, as que podem ser adotadas pelos pecuaristas mais facilmente, pelo menos na atualidade, são as convencionais de arame liso e as elétricas. As elétricas começaram a se popularizar por aqui em meados da década de 90, primeiro nas fazendas de pecuária leiteira, depois também nas de pecuária de corte. Na época, o pecuarista olhou para este tipo de cerca com desconfiança. Então foi preciso validá-la. Eu orientei a condução de experimentos e de validação em campo para bovinos de raças zebuínas e seus cruzamentos, para equídeos (equinos, asininos e muares), para ovinos e búfalos – conclusões: a cerca elétrica foi altamente eficaz na contenção de todas estas espécies animais. Os produtores da Nova Zelândia já usam este tipo de cerca há mais de um século, não apenas para animais domésticos, mas também para conter animais selvagens em reservas naturais. Então por que a cerca elétrica caiu em descrédito no Brasil? Porque, lá na década de noventa, as cercas foram construídas com materiais próprios, mas de baixa qualidade, e pior ainda, foram construídas com muitas adaptações, as “gambiarras”. Mas, na tomada de decisão, o pecuarista tem que considerar que o investimento em 1 quilometro de cerca elétrica pode até seis vezes mais baixo que o investimento em cerca convencional.


Numa outra edição darei continuidade a este texto descrevendo os dimensionamentos de áreas de lazer, fontes de água, cochos.