Adaptação do artigo originalmente publicado pelo jornal francês "Le Monde" em 27 de março.
Durante a COP21, Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, o então presidente francês, François Hollande, declarou: "O mundo está em transformação. Estamos adentrando na era de baixa emissão de carbono, um movimento poderoso e irreversível. Assim, agir em defesa do clima é assegurar a segurança e estabilidade global."
Endossado por 195 nações, o acordo assinado em 2015 propõe evitar que o aumento da temperatura global ultrapasse 1,5°C até o final do século e gerenciar as emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Traduzindo, o acordo sinaliza ao mercado que é o momento de se mover a direção contrária da queima dos combustíveis fósseis e do desmatamento.
O conceito da neutralização de carbono foi estabelecido durante o acordo de Paris, onde líderes mundiais se comprometeram em reduzir as emissões até 2030. Segundo a ONU, até a data estabelecida as emissões globais devem diminuir entre 25% e 55% em relação a 2018.
Alcançar a neutralidade requer calcular as emissões totais, implementar planos de redução e realizar ações compensatórias, como compra de créditos de carbono ou restauração de áreas degradadas. Em resumo, é como uma balança: as toneladas de CO2 emitidas devem ser neutralizadas na mesma proporção.
De acordo com o jornal francês "Le Monde", um estudo da Food and Land Use Coalition (FOLU), divulgado em 26 de março, analisou os custos de redução das emissões de gases do setor agrícola, que representa um terço das emissões globais de gases de efeito estufa.
A FOLU estima que serão necessários investimentos de US$205 bilhões por ano, equivalentes a cerca de €198 bilhões, entre 2025 e 2030 para cumprir os objetivos do Acordo de Paris. Esse valor corresponde a aproximadamente R$1,02 trilhão por ano, totalizando, ao longo dos 5 anos estimados, cerca de 56% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, que foi de R$10,9 trilhões em 2023.
O diretor da coligação ainda afirma que, apesar do valor parecer exorbitante, o montante corresponde apenas a menos de 2% das receitas anuais do setor agroalimentar.
Embora os produtores rurais devam aplicar os princípios agroecológicos para reduzir as emissões, muitos não possuem recursos para suportar os custos dessa transição na cadeia. O relatório examinou vários estudos de caso por setor e constatou que, enquanto para uma cooperativa de criação de gado, o custo da redução representaria cerca de 17% de seu volume de negócios, para uma grande multinacional esse valor representaria apenas cerca de 1%.
O texto destaca ainda, a necessidade de realocar os subsídios agrícolas públicos para reduzir as emissões sem penalizar os produtores. "Esses subsídios foram estabelecidos há várias décadas, em um contexto diferente, quando era crucial aumentar a produtividade. Naquela época, era legítimo, porém, agora, precisamos reorientá-los para as questões atuais como meio ambiente e sustentabilidade." complementa Morgan Gillespy, diretor da FOLU.
Se o relatório da FOLU não aborda quem deve custear a transição, os autores visam, ao menos, acelerar os investimentos destinados a causa. O professor Mario Herrero da universidade de Cornell, Nova Iorque, ressalta a importância de utilizar todas as fontes de financiamento disponíveis, incluindo investimentos privados e fundos públicos.
A urgência é evidente. As consequências de ultrapassar o limite de aquecimento de 1,5°C, conforme apontado pelo relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), são alarmantes e devem causar danos irreversíveis à fauna, flora e ao ecossistema como um todo.Parte superior do formulário
O artigo deixa clara a necessidade de distribuir a responsabilidade pela transição para sistemas agrícolas mais sustentáveis. Dessa forma, é fundamental que tanto o setor público quanto privado engajem nessa causa, reconhecendo que a consciência ambiental não apenas contribui para objetivos de sustentabilidade, mas também agrega valor e abre portas para novos mercados.
Finalizando de uma maneira otimista, cabe ressaltar que é encorajador ver que durante a COP28, realizada recentemente em Dubai, mais de 160 países se comprometeram a incluir a agricultura e a alimentação em seus planos climáticos. Isso representa um passo significativo em direção a um futuro mais sustentável e resiliente para o planeta.