Existem no Brasil várias gramíneas ou capins infestantes de pastagens, mas os que têm trazido maiores prejuízos à pecuária são os capins Annoni (Eragrostis plana); o Barba-de-paca, ou BM, ou Capeta, ou Cortisia, ou de Luca, ou Mourão (Sporobolus indicus) e o Capivara, ou Cabeçudo, ou Navalha, Navalhão, ou Taripuco, ou Tiriricão (Paspalum virgatum). Além destes, que atualmente são os que mais preocupam os pecuaristas, ainda tem os capins Amargoso (Digitaria insularis), Arroz (Echinochloa spp.), o Custódio (Pennisetum setosum), o Pé-de-galinha (Eleusine indica), o Orvalho (Eragrostis pilosa), e o Rabo-de-burro, ou Bezerra, ou Peba, ou Vassoura (Andropogon bicornis). Destes últimos, o capim Amargoso tem apresentado nos últimos anos um potencial muito grande de disseminação pelas pastagens do país e se tornar um sério problema no futuro como são hoje os capins Capeta e o Navalha.
Nos campos sulinos, principalmente no Bioma Pampa, no Rio Grande do Sul, predomina o capim Annoni (Região Sul); enquanto o capim Navalha é mais encontrado nos Biomas Amazônico (norte da Região Centro Oeste e na Região Norte) e Mata Atlântica (parte leste das Regiões Nordeste e Sudeste), e o capim Capeta é encontrado nos Biomas Amazônico (norte da Região Centro Oeste e na Região Norte), Cerrado (Regiões Centro-Oeste, oeste da região Nordeste, Sudeste etc.,), Mata Atlântica (parte leste das Regiões Nordeste e Sudeste) e Pantanal (no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul).
As áreas de pastagens mais infestadas atualmente pelos capins Capeta e Navalha são a faixa litorânea da Região Nordeste (Bioma Mata Atlântica), o vale do Araguaia nos Estados de Goiás, Mato Grosso e Tocantins; e toda a Região Norte.
Eu digo que quase nada é novo na pecuária, nem as soluções e nem os problemas. Eu tive que começar a estudar e a pesquisar sobre estes capins infestantes em 1997, primeiro em Curionópolis, na região sul do Estado do Pará, em Bioma Amazônico, depois em 2000 na região pastoril de Itapetinga, leste da Bahia, região de Bioma Mata Atlântica. Um detalhe: naqueles anos a presença daqueles capins ainda não preocupavam a maioria dos pecuaristas que atendi e de técnicos que conheci. Em levantamentos botânicos feitos pela Embrapa no final das décadas de 70 e 80 em pastagens degradadas no Bioma Amazônico aqueles capins não foram listados como espécies frequentes e muito menos como plantas daninhas.
Na região pastoril de Itapetinga, Bahia, eu vi pecuaristas e gerentes mais atentos e preocupados com o controle de capins infestantes, principalmente do capim Capeta, fazendo controle mecânico manual, arrancando as plantas. Mas eles cometiam um erro: não retirava as plantas arrancadas da área e levá-las para longe para serem queimadas. Como este método é muito lento, trabalhoso, envolve muita mão-de-obra e caro, eu comecei a pesquisar outros métodos de controle e me dediquei mais ao método de controle químico porque já sabia que para o controle de plantas daninhas de folha larga é o mais eficaz e de melhor relação de benefício/custo no médio/longo prazo. Quando comecei a estudar estas plantas encontrei experimentos avaliando herbicidas para o controle do capim Capeta no início da década de 70 em Minas Gerais, e do capim Navalha desde a década de 80, na Austrália e Cuba, e de 90, na África e no Brasil.
Na Austrália existe um programa nacional de manejo integrado do capim Capeta suportado pelo governo (empresas de pesquisas, universidades) em parceria com a iniciativa privada (associações de produtores). Esta planta daninha é lá classificada numa classe de alto risco e alto prejuízo econômico e social para o país (classe 2). Em algumas regiões, já estava nas classes 3 e 4, já que em 2007 tinha um potencial de infestar 30% da área de pastagens da Austrália, que possuía à época a maior área de pastagens do mundo. Naquele ano 450.000ha apenas nos estados de Queensland e New South Wales, já estavam infestados por este capim, com potencial de infestar 60% do território do estado de Queensland. Ao iniciar a infestação em uma propriedade o produtor era obrigado a avisar aos órgãos do governo. Aí um especialista ia até a fazenda para identificar e classificar se de fato é o capim-capeta. E se fosse, orientaria o seu manejo e controle.
Então, a infestação de pastagens por estes capins infestantes não é um problema particular da pecuária brasileira. No gênero do capim Navalha, o Paspalum spp, existem 400 espécies espalhadas pelas regiões tropicais e subtropicais do mundo, sendo que no Brasil já foram catalogadas 220 espécies, enquanto no gênero do capim Capeta, o Sporobolus spp, há mais de 160 espécies espalhadas pelo mundo, tanto em regiões tropicais e subtropicais, mas também nas temperadas, sendo que no Brasil já foram catalogadas 28 espécies. A espécie Sporobolus indicus é nativa da Índia e no Brasil chegaram duas variedades, a indicus e a pyramidalis. Esta espécie é encontrada infestando margens das rodovias, terrenos baldios, parques, áreas nativas, agrícolas e de pastagens pelo mundo afora. Já a espécie Paspalum vigartum é nativa das Américas Central e do Sul.
Como a maioria das plantas daninhas que têm alta capacidade de colonização de áreas agrícolas e de pastagens, os capins infestantes aqui tratados apresentam as seguintes características:
- São ecotipos (nativas ou naturais) ou naturalizadas (não são nativas, são exóticas, como o capim Capeta, mas se adaptam muito bem a uma nova região que possui condições ambientais semelhantes àquelas da sua região de origem). Ou seja, se adaptam muito bem às condições restritivas do ambiente (clima, solo). O capim Capeta é muito tolerante à seca. O capim Navalha adapta-se muito bem a solos mal drenados, enquanto o capim Capeta adapta-se bem a solos compactados e ressecados, rasos, com pedregosidade e cascalho. Ambos se adaptam bem a solos de baixa fertilidade. São tolerantes a estresse bióticos (insetos pragas e doenças), ao fogo e às roçadas;
- Florescem, frutificam e produzem sementes ao longo de todo o ano ou ao longo de quase todo o ano. Produzem grandes quantidades de sementes. Por exemplo, uma planta adulta de capim Navalha produz entre 8.000 e 15.000 sementes por ano, enquanto uma planta adulta de capim Capeta produz entre 45.000 a 200.000 sementes por ano. As sementes têm uma longevidade muito grande. Para as sementes de capim Capivara foi encontrada mais de 75% de viabilidade mesmo 10 (em campo) a 11 anos (em laboratório) após a sua produção. A produção anual de sementes de capim Capeta pode alcançar 80.000 sementes por metro quadrado, por isso o banco de sementes pode atingir 20.000 sementes por metro quadrado. Apresentam alto percentual de sementes dormentes, inicialmente de apenas 2% após sua colheita, aumentando para 43% somente após cinco meses, o que dificulta seu controle.
-As sementes lançadas ao solo em um ano não germinam uniformemente. São várias gerações de novas plantas provenientes da germinação de sementes ao longo de muitos anos, o que dificulta grandemente o seu controle. As sementes por serem muito leves são facilmente dispersadas pelo vento, pelas águas das chuvas, nos pelos e cascos dos animais. No caso das sementes do capim Navalha estas são consumidas pelos animais e dispersadas pelas suas fezes. Ainda são dispersadas nos pneus, rodas, lataria, radiador etc., de máquinas e veículos, em engrenagens e discos de implementos e máquinas; nas roupas e calçados de quem passa por áreas infestadas. As sementes do capim Capeta são envolvidas por uma mucilagem, que é um composto pegajoso, viscoso que em presença de umidade (orvalho e água de chuvas) adere a toda e qualquer superfície onde elas caem e se fixam, facilitando a sua dispersão.
Além da reprodução sexuada, por sementes, também se reproduzem por via vegetativa através de gemas em seus caules e rizomas e são plantas longevas podendo durar até 10 anos.
- São pouco aceitas ou nem são aceitas pelos herbívoros, ou seja, possuem alta evolução para escaparem ao pastejo. O capim Navalha ainda é aceito no estádio vegetativo inicial, após sua roçada ou queima, enquanto o capim Capeta praticamente não é consumido pelos animais. Possuem valor nutritivo muito baixo, porque são pobres em nutrientes (na forragem de capim Capeta foi encontrado teores de proteína bruta de 5,5 e 4,0% nos estádios, vegetativo e de florescimento, respectivamente), e muito fibrosos, portanto, de baixa digestibilidade. Então crescem livremente e completam seu ciclo de vida florescendo e frutificando.
Eu considero que no Brasil tem havido negligência em relação ao potencial de prejuízo destes capins infestantes por parte dos vários elos da cadeia da pecuária: pesquisa, ensino, indústria de herbicidas, técnicos e principalmente os pecuaristas.
Os fundamentos de manejo e controle de plantas daninhas foram citados e descritos na sequência de três artigos que escrevi nos meses de setembro, agosto e julho, mas aplicados às plantas daninhas de folhas largas.
Na parte 2 dessa sequência de artigos sobre manejo e controle de capins infestantes citarei e descreverei esses métodos aplicados ao controle desse tipo específico de plantas daninhas – aguarde.