Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tomou uma decisão importante que reforça o entendimento de que a indenização financeira por dano ambiental só é necessária quando não for possível realizar a recuperação total da área afetada.
No julgamento do Recurso Especial nº 2.078.222, a 2ª Turma do STJ analisou a responsabilidade ambiental de proprietários rurais em casos de degradação e a possibilidade de evitar uma sobrecarga de penalidades para o produtor que já cumpre com obrigações de recuperação ambiental.
Essa decisão traz um importante precedente, em especial para o setor rural, ao confirmar que a indenização pecuniária deve ser aplicada com cautela.
No caso em questão, os réus foram condenados a várias obrigações de recuperação ambiental, incluindo a demolição de construções, retirada de entulho e recomposição florestal em uma área de preservação permanente (APP) de 100 metros. A decisão da corte foi de que, dado o elevado custo da recuperação integral da área, a exigência de uma indenização financeira adicional seria excessiva e desnecessária.
Contextualizando o caso, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região já havia decidido em primeira instância que a recuperação ambiental da área degradada seria suficiente para reparar o dano causado, e que uma indenização pecuniária poderia ser dispensada nesse caso específico.
O STJ, ao manter essa decisão, concluiu que, quando há medidas de recuperação efetivas em andamento, a imposição de uma indenização financeira não é obrigatória.
O Ministro Mauro Campbell, relator do recurso, destacou que a indenização financeira, embora seja uma alternativa viável em casos de danos irreparáveis, não deve ser cumulativa se a recuperação ambiental da área puder ser realizada de forma eficaz. Em sua argumentação, o Ministro citou outros precedentes do STJ que também reforçam esse entendimento, como os AgInt no AREsp nº 1.539.863/SC e AgInt no AREsp nº 1.217.162/RS, que estabelecem que a recuperação direta da área deve ser priorizada sempre que possível.
Para entender o impacto dessa decisão, é essencial compreender as diferenças entre dano, impacto e risco ambientais.
O dano ambiental é o prejuízo efetivo e quantificado causado ao meio ambiente, sendo ele o foco principal de reparação em casos de infrações ambientais.
Já o impacto ambiental é definido pela Resolução 01/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) como a alteração das características físicas, químicas e biológicas do ambiente causada por atividades humanas. Em outras palavras, o impacto é a mudança inicial que, se não controlada, pode resultar em dano.
O risco ambiental, por sua vez, é a possibilidade de que um dano venha a ocorrer. Identificar o risco permite ao produtor adotar medidas preventivas que, muitas vezes, evitam que impactos se transformem em danos concretos. Esses três conceitos são fundamentais para uma avaliação equilibrada dos casos de dano ambiental, ajudando o Judiciário a estabelecer penalidades mais justas.
Outro ponto central da decisão do STJ foi a questão da responsabilidade ambiental tríplice, que se desdobra nas esferas administrativa, civil e criminal. Essa responsabilidade simultânea visa garantir que o dano ambiental seja reparado e que o causador do impacto assuma as consequências de suas ações.
Na esfera administrativa, o produtor pode enfrentar penalidades como multas, embargos e a apreensão de produtos e equipamentos. A responsabilidade criminal implica sanções para condutas ilícitas que causem danos ao ambiente, podendo haver penas de detenção ou reclusão em casos graves. E, por fim, a responsabilidade civil, que exige a reparação do dano, seja por meio da recuperação direta do ambiente ou por meio de uma indenização.
No entanto, a decisão do STJ destaca que é preciso cautela ao aplicar sanções cumulativas. No caso julgado, os réus já estavam cumprindo com diversas obrigações ambientais, incluindo a remoção de construções irregulares e a recomposição da vegetação nativa. A imposição de uma indenização adicional foi considerada excessiva, pois os custos da recuperação ambiental já cumpriam a função de reparar o dano.
Segundo o STJ deve-se evitar penalidades cumulativas que sobrecarregam o proprietário que já se comprometeu com a recuperação da área. A lógica por trás desse entendimento é que, se o produtor rural já está arcando com as despesas da recuperação direta, uma indenização financeira adicional resultaria em uma penalidade desproporcional e redundante.
Na prática, o proprietário que busca regularizar sua situação muitas vezes precisa arcar com altos custos, como a contratação de profissionais especializados, a implementação de planos de plantio de mudas nativas, a construção de barreiras naturais e o acompanhamento técnico de todo o processo de recuperação.
Esses investimentos visam reverter o dano e compensar o impacto causado. O STJ reconheceu que impor uma indenização adicional, nesses casos, seria contraproducente.
A decisão reforça a importância de harmonizar as obrigações e compromissos assumidos perante diferentes órgãos de fiscalização, evitando que o produtor seja obrigado a cumprir obrigações conflitantes ou redundantes.
Essa harmonização pode ser alcançada com a assinatura de um termo de compromisso único que defina claramente as responsabilidades e as metas de recuperação ambiental.
Isso garante que o produtor cumpra suas obrigações de forma eficiente e sem a sobrecarga de sanções contraditórias, podendo focar na recuperação ambiental efetiva e na regularização de suas atividades.
Para a regularização de atividades irregulares, o produtor rural pode recorrer ao chamado licenciamento corretivo, um processo que permite corrigir problemas ambientais e obter a licença necessária para a continuidade de suas atividades. O licenciamento corretivo é uma opção válida para propriedades que não estão localizadas em áreas onde a atividade é proibida pela legislação.
Ao solicitar esse licenciamento, o produtor passa por uma avaliação dos impactos ambientais e, caso necessário, firma um termo de compromisso com o órgão ambiental, comprometendo-se a adotar medidas específicas para minimizar os impactos e recuperar a área.
Esse termo deve ser firmado em até noventa dias após o requerimento do interessado e, uma vez concluído, permite a retirada de embargos e a regularização da área.
Enfim, a decisão do STJ no Recurso Especial nº 2.078.222 é um marco no direito ambiental brasileiro e reforça a necessidade de uma aplicação equilibrada das sanções ambientais.
É um avanço importante para o setor rural, especialmente para aqueles que enfrentam o desafio de recuperar áreas degradadas, oferecendo mais segurança jurídica para os produtores e incentivando a preservação ambiental.