A discusso sobre o Brasil ter metas de reduo de emisses de gases de efeito estufa (GEEs) gerou um caloroso debate pr-COP15, at que o governo anunciou o compromisso voluntrio de reduzir entre 36,1% e 38,9% de suas emisses projetadas at 2020.
Apesar de essa meta no ser comparvel com as dos pases desenvolvidos, que levam em conta um ano base, esse anncio foi politicamente importante para o Brasil.
Como as principais fontes de emisso de GEEs brasileiras so uso da terra e agropecuria, ao contrrio dos pases desenvolvidos (energia e transporte), vrias aes de mitigao prometidas pelo governo brasileiro focam esses setores: (a) reduzir o desmatamento no bioma Amaznia em 80% e no Cerrado em 40%; (b) recuperar 15 milhes de pastagens degradadas; (c) incentivar a integrao lavoura-pecuria (ao menos, 4 milhes de hectares); (d) aumentar as reas com plantio direto; (e) incrementar o uso de biocombustveis; (f) estimular o uso de carvo vegetal renovvel na siderurgia; (g) incentivar o uso da fixao biolgica do nitrognio em diferentes culturas.
Gostaria de enfatizar o papel da recuperao de reas degradadas, do plantio direto e da integrao lavoura-pecuria, que representam 13,63% da meta brasileira. Hoje, essas prticas j so aplicadas na agricultura brasileira e, portanto, j colaboram para reduzir as emisses de GEE. No entanto, apesar de o Protocolo de Quioto prever que boas prticas agrcolas podem trazer benefcios para o clima, preciso avanar na contabilidade dessas redues de emisso ou seqestro de GEEs.
Isso leva a um dos pontos da negociao do clima que exigir muita ateno em 2010, que toca na extenso das prticas ligadas a uso da terra, mudanas no uso da terra e florestas (LULUCF). A negociao sobre uso da terra tende a acolher boas prticas no uso e manejo do solo, ponto essencial para a agricultura brasileira. A partir da ser necessrio criar metodologias para que seja possvel fazer projetos, gerar crditos de carbono e vend-los no mercado.
Como a ideia do governo contabilizar essas redues para o compromisso nacional e no viabilizar a venda de crditos de carbono para outros pases crucial saber de que forma os diferentes ministrios e, principalmente, o Ministrio da Fazenda, pretendem incentivar prticas que favoream a mitigao de GEEs.
urgente discutir abertamente uma poltica de baixo carbono para a agricultura brasileira, o que pode significar: a) isenes fiscais e crditos a juros atrativos para fomentar prticas menos emissoras e a adoo de novas tecnologias; b) pagamento por servios ambientais; c) outras formas de subsdios verdes - permitidos pela OMC - que ajudem a promover a agricultura de baixo carbono.
Como as metas de reduo previstas na Poltica Nacional sobre Mudana do Clima ainda precisam ser regulamentadas, no est claro se sero usados somente instrumentos de incentivo para o setor agropecurio. A implementao da lei pode, por exemplo, criar metas especficas para diferentes setores, o que exigiria redues de emisso no necessariamente via incentivos, refletindo a tese de criar um mercado brasileiro de reduo de emisses. No acredito que isso acontecer em 2010, mas preciso qualificar esse debate e a criao dos decretos setoriais previstos pelo governo.
Como no factvel pensar em financiamento externo para aes de mitigao que no estejam ligadas reduo do desmatamento, a grande questo saber se o governo dar incentivos ou vai somente esperar que os setores agrcolas implementem essas prticas por si s.
Paralelamente a isso, necessrio lutar para que boas prticas agrcolas possam gerar crditos de carbono. Vale notar que a discusso da lei climtica nos Estados Unidos envolve fortemente a agricultura como redutora de emisses e geradora de crditos de carbono para os setores mais emissores (energia e transporte).
De acordo com a proposta do governo, somente a integrao lavoura-pecuria, o plantio direto e a recuperao de pastagens devero reduzir 145 milhes de toneladas de CO
2 equivalente at 2020, o que equivaleria, caso essas prticas pudessem gerar crditos de carbono, a 1,6 bilho de Euros (estimando a tonelada de carbono a 11 Euros). Se a reduo de desmatamento, acrescida a todas as aes apresentadas pelo governo que envolvem uso da terra forem consideradas, esse valor chegaria a 10,2 bilhes de Euros.
evidente que esses nmeros dependero da adoo de metas ambiciosas pelos pases desenvolvidos e da aceitao dessas prticas no contexto do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), ou de outro mecanismo de flexibilizao que venha a ser adotado na Conveno do Clima. Mas, para que esses potenciais benefcios se concretizem, o setor agropecurio brasileiro precisa acompanhar de perto as negociaes climticas internacionais e pressionar para que a conveno incorpore as prticas agrcolas nos futuros mercados de carbono.
No incio de junho os pases retomaro as negociaes tcnicas sobre temas essenciais como uso da terra, REDD plus e aes de mitigao. No plano domstico, o cronograma de implementao da lei federal prev que at agosto os planos setoriais ligados agropecuria e ao uso da terra estaro prontos. essencial evoluir nesta discusso de forma estratgica, evitando o uso poltico do tema por conta das eleies.
Cortar o desmatamento uma questo de honra, no s para a agricultura, mas para toda a sociedade e o governo. E isso vai ocorrer naturalmente. O ponto que precisa ganhar fora a incluso ainda maior dos setores agrcolas na agenda de baixo carbono interna, por conta da lei brasileira e das leis estaduais de clima e, no plano externo, pelas negociaes que levaro at a COP 16, pela discusso da lei americana, e pela tnica do mercado de carbono.
A agricultura pode cada vez mais se tornar uma aliada do clima. O grande desafio como fomentar e acelerar esse processo.
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