No dia 28 de agosto, sexta-feira, o caderno Cincia do jornal A Folha de So Paulo trouxe uma reportagem sobre a ameaa do gs hilariante ou xido nitroso ou N
2O e os malefcios para a camada de oznio.
A manchete no podia ser pior para a agricultura: Gs emitido pela agricultura ameaa camada de oznio. E a matria manteve na linha costumeira do caderno, resumindo alguma pesquisa ou estudo publicado por especialista.
O artigo descrevia o histrico, as conquistas e as ameaas que ainda persistem sobre a camada de oznio.
Na linha de argumentao, os articulistas lembraram que, com o objetivo de conservar a camada de oznio que protege a Terra contra os raios ultra-violetas, em 1987 as Naes Unidas assinaram o Protocolo de Montreal, que baniu a produo de CFCs, ou clorofluorcarbonos. Mas, segundo a matria, no proibiram as emisses do xido nitroso gs hilariante.
Com a reduo da emisso de outros gases, que eram originados de processos industriais ou de alguns produtos (como sprays, por exemplo), evidente que a importncia de outros gases acaba aumentando proporcionalmente. Neste caso, o outro gs o xido nitroso.
A matria atende a proposta do caderno Cincia. Mas, infelizmente, a forma com que foi colocada desinforma mais do que informa. Por exemplo, quando fala da proibio da emisso dos outros gases, a reportagem taxa que o gs hilariante, porm, ficou de fora destas proibies.
Tambm no explica como emitido o xido nitroso pela agricultura. Da forma como so colocadas ambas as afirmaes, fica a impresso de que as emisses so voluntrias, negligentes e poderiam ser evitadas por algum decreto.
Embora os dados sejam reais, a falta de informao, e colocaes mal explicadas, acabam por levar o leitor a concluses erradas sobre a agricultura e as emisses do xido nitroso.
A principal forma de emisso deste gs pela agricultura se d atravs da adubao nitrogenada. Aplica-se nitrognio e as reaes qumicas acabam por produzir o gs, que ser perdido para a atmosfera.
No simpsio de Nitrognio e Enxofre, realizado em Piracicaba em 2006, Carlos Clemente Cerri, pesquisador do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), estimou que para cada 100 kg de nitrognio aplicado por hectare, ocorre uma liberao de 1,96 kg de xido nitroso para a atmosfera.
O setor agropecurio atento a essas emisses. Sabe-se que em termos de aquecimento da atmosfera, o xido nitroso equivale a 296 vezes o gs carbnico. Por isso os efeitos do xido nitroso na agricultura so contabilizados na forma de balano de carbono. O balano do carbono hoje o tema central das questes ambientais e emisses gasosas para atmosfera.
Sendo assim, para cada 100 kg de nitrognio, aplicado via adubao, haveria uma emisso de 580 kg de equivalente gs carbnico na atmosfera. Como o carbono representa 27,2% do gs carbnico, as emisses de xido nitroso, para cada 100 kg de nitrognio aplicado ao solo, equivaleriam a 158 kg de carbono emitido.
Por sua vez, quando se aplica fertilizantes nitrogenados, h o aumento considervel na produo vegetal, ou seja, h tambm o seqestro de carbono.
Considerando uma participao mdia de 2% de nitrognio nas plantas, cada 100 kg de nitrognio aplicado deveriam ser suficientes para proporcionar 5 toneladas de matria seca vegetal. Matria seca o volume total produzido descontando a gua.
Com base no aumento da produo de massa verde (ou massa seca), e na relao entre carbono e nitrognio na matria seca, pode-se esperar que a adio de nitrognio ao sistema melhore o seqestro de carbono.
Em mdia, 60% da composio da matria seca das plantas carbono. As plantas mais eficientes em produo (milho, pastagens, cana-de-acar, sorgo) possuem relao carbono/nitrognio (C/N) alta. Estas relaes so em torno de 40/1 (carbonos para cada nitrognio) at 60/1.
Quando materiais ricos em carbono (como estas plantas citadas anteriormente) so adicionados ao solo, melhoram-se as condies para a atividade de microrganismos. No entanto, a falta de nitrognio pode limitar essa atividade microbiolgica.
A melhor relao carbono/nitrognio seria entre 33/1 e 17/1. Nestes casos, a imobilizao tende a ser igual a mineralizao do nitrognio. Acima de 33/1, o processo de imobilizao do nitrognio superior a mineralizao. Abaixo de 17/1, a mineralizao do nitrognio superior imobilizao.
Imobilizao a transformao do nitrognio da forma mineral para o nitrognio em formas orgnicas. Mineralizao a transformao do nitrognio orgnico para formas minerais, mais disponveis s plantas.
Grosso modo, nos restos de plantas de relaes altas em C/N os microorganismos tendem a roubar nitrognio do solo para o processo de decomposio. Em relaes C/N baixas, h maior disponibilidade de nitrognio para o processo e, na falta de carbono e microorganismos, esse nitrognio perdido para a atmosfera.
Neste processo, de decomposio por mineralizaco, os microrganismos usam os materiais orgnicos como fontes de energia e de carbono. Os produtos finais so gs carbnico, gua, sais minerais e alguns compostos nitrogenados.
A decomposio da matria orgnica vai ocorrendo at que se atinja a relao carbono/nitrognio prxima de 10/1, que a relao natural existente na matria orgnica do solo, ou do hmus propriamente dito. A partir da a velocidade de decomposio reduz-se significativamente.
Portanto, de se esperar que, quanto maior a quantidade de nitrognio no sistema, maior ser a quantidade de carbono fixado no solo, para que se mantenha a relao. Ao mesmo tempo, as condies do solo melhoram num processo inverso ao que ocorre quando se queima a matria vegetal (queimadas) e quando se revolve o solo. O revolvimento do solo oxida (queima) a matria orgnica.
Para analisarmos se vivel ainda aplicar nitrognio nas plantaes, do ponto de vista ambiental, transformamos todas as emisses de xido nitroso em equivalente carbono. Foram usadas as propores citadas anteriormente para a equivalncia de carbono, ou seja, cada 100 kg de nitrognio aplicado tende a emitir o equivalente a 158 kg de carbono por hectare.
Foram usados dois parmetros para comparar o efeito inverso, ou seja, a expectativa de seqestro de carbono na rea: seqestro potencial e efetivo de carbono, os quais esto descritos a seguir.
Em mdia, h 20 kg de nitrognio em cada tonelada de matria seca vegetal e h tambm 600 kg de carbono. Sendo assim, para cada 100 kg aplicados em nitrognio, espera-se a produo potencial de 5 toneladas de matria seca, das quais 3 toneladas sero carbono.
Considerando aquela relao ideal de carbono/nitrognio na formao do hmus, pode-se considerar que sero devolvidos entre 40% a 60% de todo o carbono para atmosfera, sendo o restante seqestrado efetivamente passando a compor a composio do solo.
Lembre-se que aquele carbono que volta atmosfera j estava anteriormente na prpria atmosfera. Pela fotossntese, a planta foi transformando o carbono do gs carbnico em carbono orgnico.
A figura 1 apresenta o potencial de seqestro de carbono nas plantaes, a estimativa mais pessimista para o seqestro efetivo de carbono e as emisses diretas em formas de xido nitroso, segundo dados de pesquisa e mdias de perdas de nitrognio nas adubaes na forma de xido nitroso.
Observe que para cada quilo de equivalente carbono emitido na forma de xido nitroso, sero seqestrados 6,2 kg de carbono em matria vegetal que ser convertida em hmus.
Ainda pode-se considerar a quantidade de carbono nas razes ou aprimorar ainda mais os clculos. Mesmo alterando as propores de nutrientes na planta, que variam de acordo com as espcies ou mesmo com as condies gerais do ambiente, o saldo ainda ser positivo.
Por isso vlido reforar a necessidade de se informar corretamente como acontece este processo na agricultura. A base de toda boa soluo um bom diagnstico. E no h meio de se produzir um bom diagnstico com informaes de m qualidade.
A melhor forma de se reduzir as emisses de xido nitroso pela agricultura melhorando a eficincia no aproveitamento do nitrognio aplicado. E no h maior interessado nesse aumento de eficincia do que o prprio produtor.
Cada unidade de xido nitroso que vai para a atmosfera representa prejuzo para o produtor. H como reduzir as emisses. Para tanto preciso pesquisas, divulgao e receptividade por parte dos agricultores.
<< Notícia Anterior
Próxima Notícia >>