Germán Muñoz olhou para o rio à sua frente e falou sobre a época em que golfinhos nadavam ali, a 90km do mar. "A onda fazia barulho feito um trem", disse ele, descrevendo a pororoca que subia do golfo da Califórnia pelo rio Colorado. "Havia peixes de todo tipo pulando. Aí os golfinhos apareciam, perseguindo os peixes."
Isso foi na década de 1950, quando o Colorado ainda desaguava no golfo, carregando areia e lodo das montanhas rochosas para formar um delta vasto e fértil. No último meio século, por causa das represas que estrangularam o Colorado e desviaram sua água para abastecer o crescimento do Oeste americano, o rio na prática passou a terminar na fronteira com o México.
Os manguezais e sinuosos canais do delta do Colorado - outrora um refúgio para peixes e aves migratórias - viraram um deserto.
Em 1963, a última das grandes barragens do Colorado, a do cânion Glen, começou a reter água 1.100km a montante. "O rio não chega mais até aqui", disse Muñoz.
Mas agora há razão para otimismo. Uma emenda em um tratado firmado sete décadas atrás pelo México e os EUA, chamada de Minuta 319, fará com que a água volte a correr rio abaixo e irá amparar os esforços para restaurar o habitat nativo e atrair animais.
O delta continuará sendo um filete de água em comparação aos enormes volumes bombeados para as cidades, fazendas e indústrias, mas a emenda também prevê uma grande liberação de água de uma só vez, para imitar as inundações que antigamente rejuvenesciam o delta a cada primavera, limpando os sedimentos e a vegetação velha e abrindo áreas para que novas plantas crescessem. Durante essa enxurrada, o Colorado deverá novamente alcançar o mar.
"O novo acordo irá definitivamente ajudar a restaurar o Colorado", disse Efraín Nieblas, diretor da agência de proteção ambiental do estado mexicano da Baixa Califórnia.
No estuário da extremidade norte do golfo, o afluxo de água mais fresca irá reduzir a salinidade, o que será bom para os indígenas da etnia Cucapá e para outros nativos que pescam corvinas e camarões no local. "É realmente importante conectar o rio ao oceano", disse Nieblas.
O delta nunca mais será como era antes das represas - o canal principal do rio, por exemplo, chamado de corredor ripário, está agora em grande parte cercado por lavouras irrigadas -, e Muñoz certamente não voltará a ver os golfinhos brincando na frente da sua casa. Mas ambientalistas americanos e mexicanos dizem que o acordo é um bom primeiro passo. O objetivo é restaurar em cinco anos cerca de 900 hectares a montante e a jusante, a um custo de US$8,50 milhões.
Cerca de 90% do fluxo anual do Colorado, de cerca de 18 trilhões de litros, vai para a Califórnia, o Arizona e cinco outros estados do Oeste dos EUA. Pelo tratado de 1944, o México tem direito a quase 2,00 trilhões de litros. Essa água chega à fronteira na represa de Morelos, a última do rio, onde ela faz uma acentuada curva à direita, entrando em canais que a levam a cidades e fazendas mexicanas.
Geralmente, a água não chega ao outro lado da represa e ao leito principal. Há água do Colorado em partes do delta, mas ela fica dando voltas por lá. A Leste do leito fluvial, o Ciénaga de Santa Clara, um manguezal que serve de parada para aves aquáticas migratórias, é alimentado pela água drenada dos algodoais irrigados do Arizona.
No entanto, há a necessidade de mais água, e ela deve vir pelo corredor ripário. O rio precisa fluir. Como parte do acordo, grupos ambientalistas se comprometeram a fornecer a água para o fluxo básico, cerca de 13 bilhões de litros por ano, adquirindo licenças ociosas para o uso da água de agricultores mexicanos.
A ideia não é reduzir o volume usado por lavouras e cidades, segundo Francisco Bernal, diretor do escritório de Mexicali da Comissão Internacional de Limites e Águas, mas poupar água por meio de melhorias na conservação - das quais algumas serão pagas por distritos hídricos nos EUA em troca de parte da água mexicana. "Queremos conservar água suficiente para partilhar com o ambiente", afirmou ele.
Fonte: New York Times. Por Henry Fountain. 24 de abril de 2013.
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