• Quinta-feira, 24 de outubro de 2024
  • Receba nossos relatórios diários e gratuitos
Scot Consultoria

Integração lavoura-pecuária: caminho em prol da produtividade e da sustentabilidade


Quinta-feira, 24 de outubro de 2024 - 06h00

Foto: Bela Magrela


A área com pastagens no Brasil está estimada em 177,2 milhões de hectares (Lapig), crescimento de 56,5% desde 1985. 

A área ocupada com pastagens atingiu o pico em 2008, com 179,9 milhões de hectares. De lá para cá, a área diminuiu 8,4%, ou 15,1 milhões de hectares. 

Em 2002, 72,4% das áreas com pastagens apresentavam algum tipo degradação - sendo 30,7% delas com degradação severa e 41,6% com degradação moderada. Em 2021, as áreas degradadas regrediram para 60,7%, sendo 19,5% com degradação severa e 41,2% em degradação moderada (figura 1).

Figura 1.
Áreas com pastagem de acordo com nível de degradação e sem degradação ao longo do tempo, em milhões de hectares.

Fonte: MapBiomas e Lapig / Elaborado por Scot Consultoria.

Degradação das pastagens, existe?

A degradação é um processo que ocorre ao longo do tempo, com queda contínua da produtividade da pastagem e, na ausência de interferência antrópica, tende a aumentar conforme o uso da área.

A avaliação da degradação da pastagem pode ser feita acompanhando a capacidade de suporte (UA/ha/ano), pela perda da produtividade animal (ganho de peso ou da produção de leite) e observando o desenvolvimento da pastagem (pasto “rapado” ou pasto “passado”). 

Dessa forma, se ano a ano o número de bovinos mantido em determinada pastagem estiver diminuindo, os indícios são de que essa pastagem está degradando.

A observação do aumento no percentual de plantas invasoras e consequentemente o declínio no percentual de capim (ou de leguminosas forrageira), compactação do solo e erosão são indicativos que há processo de degradação.

O manejo preventivo da pastagem é a forma eficaz para evitar a degradação. O produtor deve, desde a formação da área, controlar rotineiramente a taxa de lotação, periodicamente analisar o solo e manter a fertilidade e controlar as plantas invasoras e insetos-pragas. 

Há como reverter a degradação?

Existem três opções principais para converter a degradação das pastagens, a depender do nível da degradação, do caixa disponível e da qualificação técnica do produtor.

A primeira é a recuperação direta, que consiste no controle das plantas invasoras e ajuste da fertilidade do solo por meio de adubação, com base em análise do solo. Em alguns casos, pode ser necessário a ressemeadura das forrageiras apenas em áreas de solo descoberto. 

A segunda é a renovação, ou seja, a formação em uma nova pastagem. Neste caso, além da correção da fertilidade do solo, é necessário a ressemeadura com a mudança ou não da espécie. O uso da área tem que ser interrompido por cerca de 90 dias, tempo hábil para a formação da nova pastagem.

E a terceira é a recuperação/renovação indireta, que através da integração de vários sistemas de produção se busca recuperar a fertilidade do solo, obter renda em curto prazo ou diversificação da geração de renda. A integração pode ser realizada através da lavoura e pecuária (ILP), lavoura, pecuária e floresta (ILPF) ou pecuária e floresta (IPF). 

A última opção requer mais investimentos em curto prazo, contudo, possui maior potencial de retorno do capital investido, agregando outras atividades e novas fontes de renda em uma mesma área.

Integração Lavoura-Pecuária (ILP): um sistema em prol da agropecuária

A Integração Lavoura-Pecuária (ILP), consiste na integração da agricultura, principalmente soja, sorgo e milho, com a pecuária, em rotação, consórcio ou sucessão, na mesma área, em um mesmo ano agrícola ou por múltiplos anos.  

A técnica, geralmente, é iniciada em pastagens degradadas. Ao longo de um período entre três e cinco anos, são conduzidas lavouras, após o qual a área é convertida novamente em pastagem por um período equivalente. O ciclo se repete, tornando-se um sistema estável. 

Há ainda, a possibilidade de associação da ILP com o cultivo de lavouras anuais de verão seguidas por pastagens de outono-inverno, que também servem como cobertura vegetal para as culturas de verão, podendo ser dessecadas para o cultivo de verão.

Os benefícios da implementação do sistema são inúmeros, e recíprocos entre a lavoura e a pecuária, reduzindo as causas da degradação física, química e biológica do solo, resultantes de cada uma das explorações.

Os principais benefícios da ILP para a pecuária extensiva são a diluição dos riscos econômicos, uma vez que a produção não depende exclusivamente de uma atividade, melhorias na qualidade e disponibilidade da pastagem, redução dos custos com suplementação animal, aumento do bem-estar animal, redução do impacto ambiental e aumento de rentabilidade.

Em pesquisa da Bisceglie (2024), comparando as diferenças dos resultados de fazendas que implementaram o ILP com fazendas de pecuária tradicional, contatou-se uma melhora no desempenho da recria na ILP com ganho médio diário (GMD) na ordem de 267%, passando de 0,180 kg de GMD para 0,680 kg de GMD.

Para as culturas, ocorre a melhoria da estrutura e das propriedades químicas, físicas e biológicas do solo, em função da rotação de culturas, além de aumentar a matéria orgânica e a ciclagem de nutrientes.

A rotação das culturas e/ou a presença de plantas, possibilita também a quebra do ciclo de doenças e de pragas específicas na produção. A integração oportuniza o controle de plantas invasoras, dado que a rotação diminui o desenvolvimento dessas plantas e proporciona um controle mais efetivo.

A introdução da pastagem, com subsequência, as culturas anuais, promove-se uma maior produção de grãos, uma que vez, que permite a recuperação do solo e aumento da matéria orgânica, favorecendo o desenvolvimento das culturas posteriores.

A integração de diferentes atividades, permite uma redução nos custos com insumos, como fertilizantes e defensivos agrícolas, otimização do uso do maquinário e mão de obra, e a diversificação das fontes de renda.

Dessa forma, com a existência de várias atividades em uma mesma área, diminui-se a necessidade de abertura de novas áreas para a produção, seja agrícola ou animal.

Como os sistemas de integração auxiliam na redução das pastagens degradadas?

No Brasil, não há dados oficiais referentes aos sistemas de integração. A Rede ILPF e a Embrapa, estimaram que na safra 2015/16, a área com algum dos sistemas de integração foi de 11,47 milhões de hectares, que equivale a 5,5% da área sob uso agropecuário.

Na safra 2020/21, estima-se, que a área com sistemas integrados tenha aumentado 52,0%. Ou seja, a área com integração subiu para 17,43 milhões de hectares, detendo 8,3% da área sob o uso agropecuário (figura 2).

Figura 2.
Evolução da área de ILPF implantada no Brasil em milhões de hectares.

Fonte: Rede ILPF.

De acordo com a pesquisa-expedicionária Confina Brasil 2023, organizada pela Scot Consultoria, de 180 propriedades pesquisas, 46,7%, ou 84 delas, realizam algum tipo de integração, seja lavoura-pecuária (ILP), pecuária- floresta (IPF) ou lavoura-pecuária-floresta (ILPF).

Das que fazem integração, 95,2%, ou 80 propriedades, trabalham com o sistema de ILP, enquanto o restante (4,8% da amostra) realizam IPF (2,4%) e ILPF (2,4%). A maior parte das propriedades com ILP se concentra nos estados de Mato Grosso (17,5%), São Paulo (12,5%) e Goiás (12,5%).

Os estados com maior área com algum sistema de integração são: 

Mato Grosso do Sul com 3,17 milhões de hectares (18,2%);

Mato Grosso com 2,28 milhões de hectares (13,1%);

Rio Grande do Sul com 2,22 milhões de hectares (12,7%);

Minas Gerais com 1,59 milhões de hectares (12,7%).

O Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono), foi criado em 2010, com o fim de promover a adoção de técnicas agrícolas sustentáveis.

O Plano trouxe resultados, tanto em área, quanto em mitigação de gases de efeito estufa. Em relação à recuperação das pastagens degradas, o Plano permitiu a reconstituição em 26,8 milhões de hectares e 36,01 milhões Mg CO2 eq. de mitigação de gases de efeito estufa (GEE).

O Plano ABC+, implementado após a ratificação do Acordo de Paris pelo Brasil, estabelece metas até 2030. O objetivo é recuperar 30 milhões de hectares de pastagens degradadas e mitigar 113,7 milhões de toneladas de CO₂ equivalente em emissões de GEE.

Os impactos da adoção da ILP nas fazendas

Os principais custos que englobam a atividade são com sementes e insumos, como fertilizantes e, preparo de solo com maquinário e mão de obra. 

Em sistemas com ILP, a eficiência no uso de nutrientes pode reduzir a necessidade de fertilizantes em até 30,0%, especialmente com rotação de culturas e pastagens (tabela 1). 

Tabela 1.
Número de sementes por metro quadrado no solo, em áreas de um experimento de cultivo lavoura-pastagem, na profundidade de 0-20 cm (1).

Fonte: Ikeda et al., 2007.

Estudos da Embrapa comprovaram que a associação de pastagem com lavouras aumenta o rendimento dos grãos. Por exemplo, após três anos de pastagem com Urochloa brizantha cv. Marandu, o rendimento da soja foi 17,0% (equivalente a 510 kg/ha de grãos) maior ao obtido no sistema de lavoura contínua.

Quanto à saúde das lavouras, o milho safrinha consorciado com Urochloa ruziziensis mostrou-se mais eficaz na desinfestação de solos contaminados pelo fungo do mofo-branco (Sclerotinia sclerotiorum) em comparação com o milho safrinha em monocultura.

Além disso, a palhada de Urochloa ruziziensis e de Urochloa brizantha cv. Marandu mostrou efeito positivo no controle de patógenos como Fusarium solani, Rhizoctonia solani e Sclerotinia sclerotiorum. Outro benefício notável foi a redução na população de plantas daninhas.

A integração de sistemas, ainda, proporciona benefícios à produção animal. Como a recuperação da fertilidade do solo, que permite à forrageira expressar seu potencial máximo de produtividade, assim aumentando a taxa de lotação da área.

O ganho de peso animal pode ser influenciado tanto em pastagens degradadas e recuperadas quanto em pastagens de sistemas de integração lavoura-pecuária (tabela 2). 

Tabela 2.
Produção animal em pastagens degradada e recuperada e em pastagem de sistemas de integração lavou-pecuária num Latossolo de Cerrado, Campo Grande, MS.

Fonte: EMBRAPA, adaptado de Macedo (2007).

Por fim, a ILP é um caminho sólido para transformar o agronegócio brasileiro, unindo produtividade com sustentabilidade de forma exemplar. 

Ao combater a degradação das pastagens, restaurar a saúde do solo e promover o bem-estar animal, a ILP não apenas impulsiona a eficiência das propriedades rurais, mas também se alinha com as exigências globais por práticas responsáveis frente às mudanças climáticas.

Ao adotar a ILP, o Brasil não só preserva recursos naturais, como também assegura um futuro próspero e resiliente para o agronegócio, abrindo portas para uma produção sustentável e rentável.

Referências bibliográficas

BALBINO, L. C.; BARCELOS, A. O.; STONE, L. F. Marco referencial: Integração Lavoura-Pecuária-Floresta. Brasília, DF: Embrapa, 2011, 130 p.

BISCEGLIE, D. Benefícios da integração lavoura pecuária comparados à agricultura e pecuária tradicionais: uma análise detalhada. 52f. Dissertação (mestrado profissional MP AGRO). Fundação Getúlio Vargas, Escola de Economia de São Paulo, 2024. 

COSTA, N. R.; ANDREOTTI, M.; LOPES, K. S. M.; YOKOBATAKE, K. L.; FERREIRA, J. P.; PARIZ, C. M.; BONINI, C. S. B.; LONGHINI, V. Z. Atributos do solo e acúmulo de carbono na integração lavoura-pecuária em sistema plantio direto. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 39, p. 852-863, 2015.

DIAS-FILHO, M. B. Degradação de pastagens: o que é e como evitar. Brasília, DF: Embrapa, 2017, 19 p.

FREITAS, G. S.; PRUDENCI, M. F.; SOARES FILHO, C. V. O uso de tecnologias para reduzir impactos ambientais na intensificação da pecuária de corte. Research, Society and Development, v. 11, n. 8, 2022.

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA. Plano ABC e ABC+. Disponível em: < https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/sustentabilidade/planoabc-abcmais>. Acesso em 14 de setembro de 2024.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. Cenários para pecuária de corte Amazônica: Integração lavoura-pecuária. Disponível em: < https://csr.ufmg.br/pecuaria/portfolio-item/integracao-lavoura-pecuaria/>. Acesso em 6 de setembro de 2024.

PEREIRA, M. A. Avaliação econômica de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta: as experiências da Embrapa. Editora técnica – Campo Grand, MS: Embrapa Gado de Corte, 2019.

SANTOS, H. P.; FONTANELI, R. S.; SPERA, S. T.; DREON, G. Fertilidade e teor de matéria orgânica do solo em sistemas de produção com integração e pecuária sob plantio direto. Revista Brasileira de Ciências Agrárias, v. 6, n.3, p. 474-482, 2011.


<< Notícia Anterior

Buscar

Newsletter diária

Receba nossos relatórios diários e gratuitos


Loja


Warning: Unknown: Your script possibly relies on a session side-effect which existed until PHP 4.2.3. Please be advised that the session extension does not consider global variables as a source of data, unless register_globals is enabled. You can disable this functionality and this warning by setting session.bug_compat_42 or session.bug_compat_warn to off, respectively in Unknown on line 0