A semana era para ser leve e curta, para que todos pudessem ir diminuindo o ritmo até os feriados de quinta e sexta. Começou cheia de assuntos na economia: a inflação não está em queda, há reunião do Copom, a S&P pôs em perspectiva negativa a dívida americana e o euro caiu com medo da renegociação da dívida de alguns países do bloco. No Brasil, além dos índices altos de inflação, há muito ruído em torno do tema.
O IPC-S divulgado ontem deu 0,83%. É um dos muitos índices do país, mas não é dos mais conhecidos. O IPCA-15 de abril, uma espécie de prévia do índice oficial, vai ser divulgado exatamente no dia em que o Banco Central decidirá a taxa de juros. Ele deve ficar em 0,80%, na opinião do professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio. As apostas mais moderadas são de 0,70%, como faz o Bradesco.
O problema é que ela permanece alta, mesmo com o começo da queda da inflação de alimentos. Se o IPCA do mês ficar nesta faixa de 0,80%, a inflação no acumulado de 12 meses vai para o teto da meta. Há grande risco de que o índice chegue a 7% nos próximos meses.
Em maio, o índice deve cair em relação a abril, mas o acumulado do ano continuará no limite da meta. Vai cair porque alguns grãos estão entrando na safra, o álcool está sendo moído, as verduras e legumes estão mais fartos nessa época do ano. Isso afetará favoravelmente os preços de alimentos, alimentos in natura e combustível.
Mesmo assim, a conta em 12 meses ficará alta principalmente em junho, julho e agosto. No ano passado, nesses três meses houve inflação próxima de zero, explica Luiz Roberto Cunha. Isso significa que qualquer alta elevará o acumulado em um ano.
- Quando estiver em torno de 7% começará a negociação de setembro dos dissídios de categorias fortes como bancários, petroleiros e metalúrgicos. O mercado de trabalho está aquecido e a economia ainda é muito indexada. Isso fará com que os sindicatos pressionem por aumentos elevados.
Nos últimos três meses do ano, há chances de a inflação em 12 meses cair, porque no ano passado os índices ficaram muito altos no fim do ano. É nisso que aposta o Banco Central, mas qualquer choque que houver será perigoso.
- O ano de 2012 entrará sob o peso de um aumento forte de salário mínimo. Isso significa que há pouca chance de a inflação de serviços cair - disse o economista.
O que torna esse quadro mais preocupante é o fato de que as expectativas não estão ancoradas. Não se sabe se o governo vai de fato pagar o preço de derrubar a inflação. Esse é sempre o ambiente no qual as remarcações aumentam, principalmente nos mercados onde há pouca competição.
A MB Associados avalia que os preços das commodities vão cair, superando o efeito que a consultoria define como "devastador" do La Niña, no final do ano passado. Mas da mesma forma que Luiz Roberto Cunha, a MB explica que os preços caem, mas não voltam a patamares de 2009. A demanda mundial por commodities, principalmente as agrícolas, continua muito alta. O cenário de queda forte desses preços só ocorre em momentos de crise, como foi em 2009.
No resto do mundo, as dúvidas continuam. A decisão da Standard&Poors de pôr em perspectiva negativa a dívida americana espanta pelo inusitado, mas não quer dizer que a dívida será rebaixada. Tem alguma possibilidade de nos próximos anos isso acontecer, caso não haja alguma mudança das perspectivas. Mas esse movimento foi o suficiente para provocar queda nas bolsas do mundo inteiro.
Na Europa, as dúvidas que sempre reaparecem é de que haja uma onda de reestruturação das dívidas de alguns países, com tudo o que isso pode representar de contágio pela estreita ligação entre os sistemas bancários.
O Japão continua se debatendo para encerrar a crise nuclear; a recuperação econômica passou a ser assunto a ser tratado no futuro. Na China, a inflação alta ameaça seu papel de fornecedor de produtos de baixo custo. A inflação chinesa tem sido alimentada também pelo crescimento econômico que não obedece a ordem de reduzir o ritmo dada pelas autoridades. Há avaliações de que os números reais de inflação são piores do que os que são informados pelo governo.
Não é um bom momento para tanta dúvida sobre qual é, afinal, a política econômica e o diagnóstico do governo sobre a inflação. O diagnóstico do Ministério da Fazenda é de que este é um problema mundial, provocado pelas commodities, e que estão sendo tomadas todas as medidas necessárias para evitar que ele se propague na economia. É um pouco isso, mas é mais complicado. É um problema mundial, mas há características locais que o tornam ainda mais complexo.
O Brasil tem uma longa história de superinflação indexada, tem ainda muita indexação na economia, há outras fontes de pressão inflacionária, o índice de serviços está acima de 8%, e os estudos mostram que a inflação já está com um nível alto de dispersão na economia. Até a explicação que o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles teve que dar sobre o que aconteceu, ou deixou de acontecer no governo anterior, mostra como o ambiente está sensível e cheio de ruídos.
O atual presidente, Alexandre Tombini, disse que o país está no meio de um ciclo de aperto monetário, mas depois teve que se explicar melhor. Enfim, o governo Dilma ainda não conseguiu se comunicar nessa área. Num momento de expectativas fluidas, crise externa e inflação perto do teto, o Banco Central decidirá os juros amanhã.
Fonte:
O Globo. Por Míriam Leitão. 19 de abril de 2011.
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