O governo e o setor privado brasileiros vo ter que decidir entre o imediato e o longo prazo na recente disputa com a Rssia: resolver logo o embargo russo s carnes de 85 estabelecimentos exportadores de trs Estados do pas ou suportar a dificuldade do momento e garantir um melhor acesso de maneira permanente na Rssia.
Em negociaes bilaterais, que duraram quase toda a semana passada em Genebra, ficou claro que, quanto mais o Brasil apertar Moscou por concesses no mbito da entrada da Rssia na Organizao Mundial do Comrcio (OMC), mais os russos vo apertar em questes de sanidade para alavancar sua posio.
As autoridades em Braslia foram advertidas por especialistas de que no seria possvel ganhar nos dois tabuleiros, tanto na acesso na OMC como na obteno de resultados satisfatrios na rea sanitria quando Moscou est na defensiva. Os russos tm pressa em finalizar a demorada negociao porque querem entrar no OMC at o fim do ano, durante a Conferncia Ministerial do rgo.
O Valor apurou que nas negociaes em Genebra, a cota total que a Rssia oferece para a carne suna de 472 mil toneladas, mas 60% j foram dadas aos EUA e Unio Europeia, sobrando muito pouco para o Brasil, que est na categoria "outros". O pior problema est na cota global para carne de frango, que os russos querem fixar em pouco mais de 250 mil toneladas, menos da metade de dois anos atrs. Para carne bovina, a cota total de em 530 mil toneladas.
Desde o comeo das discusses, os russos alertaram os brasileiros sobre problemas na inspeo sanitria nas carnes exportadas para seu mercado, pavimentando o terreno para a retaliao.
Na quinta-feira, quando o embargo a 85 unidades frigorficas de Paran, Rio Grande do Sul e Mato Grosso j tinha sido anunciado, foi a vez de a delegao brasileira dar um aviso aos russos: se com o embargo esperavam forar um resultado rpido na OMC, trilhavam o caminho errado. Ao mesmo tempo, porm, em Braslia surgiam acusaes de "corpo mole" por parte dos negociadores para fechar um acordo com os russos.
S que est em jogo o acesso futuro para os produtos no mercado russo. Se o Brasil aceitar agora um acordo de cotas na OMC nas condies oferecidas pelo governo Putin, para Moscou levantar logo o novo embargo s carnes, o acesso ficar limitado de maneira permanente no mercado russo.
Nas negociaes em Genebra ficou claro que Moscou est numa situao complicada porque se comprometeu com a maior parte das cotas de carnes para os EUA e a UE, enquanto o Brasil se queixa em relao aos volumes que restaram a seus exportadores. Numa situao inusitada, representantes russos chegaram a sugerir que o Brasil procurasse os EUA para negociar um pedao maior das cotas. A resposta foi de que quem tem de fazer isso so, evidentemente, os russos.
No caso de sunos, o Brasil tem perdido terreno por causa da discriminao feita pelos russos em favor dos produtores americanos e europeus. A fatia brasileira caiu de 58% para 39,6% das importaes russas entre 2002-2009.
Na mesa de negociaes para a entrada na OMC, os russos voltaram a fixar cota de 472 mil toneladas para carne suna. Em dezembro, tinham reduzido o volume para 250 mil toneladas. Mas o novo volume s dura at dezembro de 2014 e garante 202 mil toneladas para os americanos e 80 mil para os europeus. Sobram 40% para os outros fornecedores, incluindo o Brasil. A tarifa intra cota seria de 15% e a extra cota, de 75%.
A partir de janeiro de 2015, a cota diminui para pouco mais de 300 mil toneladas, sendo 180 mil para os EUA e a UE. Essa reduo seria compensada por alquota extra cota menor, de 60%. Em 2020, acabaria o sistema de cotas e a tarifa consolidada final para importao de carne suna seria de 20%. No caso do frango, antes havia cota de 700 mil toneladas quase toda destinada aos Estados Unidos.
Depois de brigar com Washington, a Rssia props cota de pouco mais de 250 mil toneladas, mas com espao tambm para outros exportadores. Quanto carne bovina, o montante acenado por Moscou era de 530 mil toneladas. Nos ltimos anos, o Brasil forneceu metade do total comprado pela Rssia.
O setor privado brasileiro e o Ministrio da Agricultura sempre pediram para a diplomacia ser dura na negociao. Mas quem conhece o assunto sabe que no d para ganhar nos dois cenrios ao mesmo tempo, diante da defensiva russa. Hoje, representantes de produtores de carnes e do governo brasileiro discutem o tema. (AM)
Fonte:
Valor Econmico Online. Por Redao. 6 de junho de 2011.
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