Produtores e consumidores de países em desenvolvimento poderão utilizar até US$4 bilhões para se proteger contra grandes oscilações nos preços dos alimentos, conforme planos anunciados nesta terça-feira, 21, pelo Banco Mundial. Os recursos serão gerenciados pela instituição do Banco Mundial voltada ao setor privado, a Corporação Internacional de Finanças (IFC, na sigla em inglês), em parceria com o banco J.P. Morgan. O objetivo é permitir que os produtores, cooperativas e bancos se protejam da exposição ao risco nos mercados agrícolas.
Por meio da ferramenta de Gerenciamento de Risco de Preço Agrícola, o IFC vai destinar até US$200 milhões em crédito a clientes que usam produtos específicos de hedge (proteção contra riscos). O J.P. Morgan disponibilizará a mesma quantidade de recursos. O comunicado do Banco Mundial diz que "como a exposição associada às operações de gerenciamento de risco é tipicamente menor do que a quantidade principal de hedge disponível para os clientes, essas exposições combinadas devem resultar em US$4 bilhões em proteção contra riscos de preços, que será organizada pelo J.P. Morgan para produtores e compradores agrícolas de mercados emergentes".
A nova ferramenta é especialmente importante porque pequenos produtores de mercados emergentes, e também consumidores, costumam ter dificuldades para acessar os sofisticados instrumentos de hedge disponíveis no mundo desenvolvido.
Em teleconferência, o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, afirmou que o grupo está conversando com outros bancos para expandir o esquema. "Isso pode mostrar como instrumentos financeiros podem trazer segurança para milhões de fazendeiros, produtores e consumidores."
"Estar totalmente exposto aos altos e baixos dos preços significa estar muito vulnerável", declarou. "(O novo sistema) pode ajudar os países a resolver seus próprios problemas na promoção de investimentos em agricultura." O crescimento da produtividade de arroz e trigo em países em desenvolvimento, que representam 80% da população global, desacelerou para 1% ao ano, ante 3% na década de 1970.
A proteção contra o risco, especialmente em mercados voláteis, ajuda os produtores e processadores de alimentos a melhorar suas estratégias de investimento no longo prazo. Charles Ogang, presidente da Federação Nacional de Produtores de Uganda, destacou recentemente a necessidade de que os países em desenvolvimento tenham estruturas de mercado mais confiáveis e transparentes para bilhões de pequenos proprietários.
O lançamento do novo sistema de gerenciamento de risco ocorre pouco antes da reunião de ministros de agricultura do grupo das 20 maiores economias do mundo (G20), que ocorrerá em Paris na quarta-feira e na quinta-feira. Eles discutirão um acordo para conter a volatilidade sem precedentes nos preços dos alimentos. Entre as propostas avaliadas estão melhorar a transparência nos mercados físico e futuro; formar estoques para amortecer oscilações de preço; e desenvolver ferramentas de gerenciamento de risco para os mais vulneráveis.
Os preços dos alimentos atingiram nível recorde em fevereiro, de acordo com as Nações Unidas, cujo relatório publicado na semana passada indicou os preços da comida podem ficar em média 30% mais altos durante a próxima década, pois a desaceleração do crescimento da produção deve se contrapor à rápida expansão da demanda.
Grupos de assistência social e caridade alertam que o número de pessoas cronicamente famintas deve crescer para mais de 1 bilhão neste ano, por causa do aumento do custo de vida. A produção global de alimentos terá de crescer 70% até 2050 para alimentar a população prevista de mais de 9 bilhões de pessoas, de acordo com a ONU.
Segundo Zoellick, "os preços dos alimentos, altos, incertos e voláteis, são a ameaça mais grave para os mais vulneráveis no mundo em desenvolvimento".
G-20
As expectativas para a adoção de novas medidas internacionais que garantam a segurança alimentar foram impactadas pela declaração do presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, de que as discussões sobre as principais políticas propostas até o momento devem ser adiadas ou abandonadas no encontro de ministros das 20 maiores economias do mundo (G-20). Os ministros se reúnem amanhã e quinta-feira, em Paris, para discutir medidas que combatam a volatilidade dos preços agrícolas. A França, que preside o G-20, transformou em prioridade do grupo as questões de segurança alimentar, depois que os preços dos alimentos atingiram nível recorde em fevereiro.
Zoellick afirmou à imprensa, em teleconferência, que a proposta de criar uma rede internacional de estoques de alimentos provavelmente "não é a melhor política" e que seria difícil transformá-la numa política internacional do G-20. Autoridades dos Estados Unidos demonstraram resistência aos planos de criar reservas regionais de alimentos para uso de emergência - um passo sugerido para que os países do G-20 reduzam a fome no mundo em desenvolvimento.
O presidente do Banco Mundial também alertou que tal política pode preocupar os produtores, pois eles temem que "isso seja usado para controlar preços com a liberação (da oferta estocada)".
Zoellick acredita que as discussões relacionadas à especulação nos mercados de alimentos serão adiadas para outro momento neste ano. "Sobre questões como limites de posição, o G-20 vai contar com os grupos financeiros, que terão mais discussões sobre políticas regulatórias para futuros e derivativos", disse. O presidente da França, Nicolas Sarkozy, avalia que os especuladores nos mercados de commodities ajudaram a impulsionar os preços dos alimentos.
No entanto, Zoellick espera que os ministros do G-20 anunciem o lançamento do Sistema de Informação de Mercado Agrícola (Amis, na sigla em inglês), uma iniciativa cujo objetivo é aumentar a transparência nos mercados de agricultura, como ocorre com o mercado de petróleo, disponibilizando mais informações sobre estoques e produção de alimentos no mundo.
Mas mesmo essa ideia deve enfrentar resistência. Economistas disseram que será difícil convencer países como a China - um grande importador de alimentos - a contribuir com dados que podem comprometer suas estratégias comerciais. A Rússia também se mostrou contrária à proposta que visa a restringir as intervenções dos governos nos mercados. Isso a impediria de suspender as exportações quando há alta de preços no mercado interno, como fez no ano passado com os grãos - fator que também impulsionou as cotações internacionais.
Zoellick espera "resistência dos principais produtores agrícolas para abrir mão da opção de usar as restrições de embarque como uma ferramenta" para controlar os mercados. As informações são da Dow Jones.
Fonte: Agência Estado. Por Filipe Domingues. 21 de junho de 2011.