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Indústria de algodão é abalada por quebras de contratos


Quarta-feira, 5 de setembro de 2012 - 14h49

O mercado do algodão, uma das mais antigas commodities do mundo, tem sido sacudido por uma onda de quebras de contrato por agricultores e fábricas de tecidos.

Nos últimos dois anos, os preços do algodão quase triplicaram para logo perder quase dois terços do valor, provocando a quebra de contratos. Tanto os produtores mundiais de algodão quanto as fábricas de fiação e tecelagem estão renegando acordos assinados anteriormente agora que os preços estão se voltando contra eles.

Até 20% das centenas de milhares de contratos assinados desde 2010 - por um valor total que se aproxima de US$12 bilhões - foram descumpridos ou reescritos, calcula Terry Townsend, diretor executivo do Comitê Consultivo Internacional do Algodão, uma associação de governos com interesses na cotonicultura.

"Nunca houve uma quantidade tão grande de casos de arbitragem por quebra de contrato quanto agora", diz Marco Antonio Aluísio, vice-presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Algodão, uma entidade setorial sediada em São Paulo.

"Isso destrói a confiança das pessoas nesses mercados", diz Neal Gillen, antigo vice-presidente executivo da Associação Americana de Exportadores de Algodão. A indústria foi abalada, segundo ele, pela "enorme quantidade de prejuízos, a audácia dos compradores, a sensação de que eles podem simplesmente não honrar os compromissos."

Os operadores dizem que a frequência de contratos cancelados tem sido muito maior no mercado de algodão do que no de qualquer outra commodity.

"O número de contratos não cumpridos neste momento é preocupante", diz Kai Hughes, diretor-gerente da Associação Internacional de Algodão, que tem sede em Liverpool. "Se não podemos manter a validade de um contrato, acabamos com um ambiente muito volátil e inseguro de negociação que só pode empurrar os preços para cima."

Até cartas de crédito estão mais difíceis de obter porque os bancos que as liberam estão com medo de inadimplência devido à onda de quebras de contratos, disse Aluísio, da Anea.

De agosto de 2010 a julho de 2011, o algodão foi a matéria-prima mais volátil das 64 commodities negociadas em bolsa. Os operadores dizem que os contratos descumpridos exacerbaram a instabilidade dos preços. A volatilidade diminuiu este ano, apesar de os produtores de algodão dos EUA estarem batalhando contra um segundo ano de seca. As disputas, no entanto, continuam inundando os tribunais e comissões de arbitragem, já que as negociações entre as partes em conflito não têm produzido acordos.

Os contratos de algodão geralmente estipulam que as divergências devem ser resolvidas fora dos tribunais, com a ajuda de painéis de arbitragem. O volume desse tipo de casos aumentou acentuadamente, apesar de representarem apenas uma fração dos negócios desfeitos porque são processos demorados e caros. Um recorde de 242 casos de arbitragem foram apresentados à Associação Internacional do Algodão em 2011, contra apenas 73 em 2010. Este ano, foram apresentados 175 pedidos de arbitragem e a associação concedeu US$317 milhões em casos de arbitragem, comparado com US$76,7 milhões em 2011 inteiro.

Alguns comerciantes de algodão que ganharam casos de arbitragem têm tido dificuldade em fazer valer as decisões em alguns países, com a indústria têxtil na Ásia, América Latina e em outros lugares muitas vezes recusando-se a pagar, dizem líderes do setor. Cerca de 520 empresas devem US$251 milhões em decisões de arbitragem da Associação Internacional de Algodão que remontam a 1988, segundo a entidade.

O Brasil exportou 800.000 toneladas de algodão em 2011, ou 45% da produção total, disse Sérgio de Marco, presidente da Abrapa, a Associação Brasileira de Produtores de Algodão. Ele diz que cumprir contratos, mesmo quando os preços se tornam desfavoráveis ao produtor, é a única forma de o país se manter competitivo no mercado externo.

O algodão geralmente muda de mãos pelo menos sete vezes no ciclo desde a semente até o produto têxtil, através de acordos que cruzam o globo. Comerciantes de algodão fazem acordos com agricultores para comprar a safra ainda não cultivada e negociam separadamente o produto com a indústria têxtil. Para mitigar o risco de que os preços variem significativamente enquanto tentam combinar vendedores com compradores, os comerciantes procuram os mercados de futuros, onde tomam posições que compensam as transações com a commodity física.

O rompimento de contratos pode causar estragos nessa complexa teia de negócios, provocando grandes prejuízos aos comerciantes. O problema começou em 2010, quando os preços do algodão começaram a subir e muitos agricultores decidiram não cumprir seus contratos.

A Loeb & Co., uma firma do Alabama especializada no comércio de algodão, está travando uma batalha num tribunal estadual da Carolina do Norte contra um produtor que acusa de ter quebrado um contrato no qual se comprometia a entregar 800 fardos de algodão, depois de ver que poderia vender sua colheita por mais. A Loeb diz que teve um prejuízo de US$300.000. 

 

Ao mesmo tempo, a Loeb está lutando no exterior para fazer cumprir uma decisão de um painel de arbitragem que lhe outorga US$263.556, mais juros, contra uma fábrica têxtil na Turquia, que ela acusou de ter cancelado uma ordem de compra quando os preços caíram.

"Nós respeitamos nossos contratos", disse o proprietário Jamie Loeb. "Isso é o que os produtores devem fazer. Isso é o que as fábricas deveriam estar fazendo."

A fábrica têxtil na Turquia, a Ari Ambalaj, concordou em comprar 1.144 fardos — pesando 500 libras (227 quilos) cada —, em 31 de dezembro de 2010, fixando o preço em US$2,03 a libra em fevereiro de 2011, ou cerca de US$1,2 milhão no total, de acordo com a decisão do painel de arbitragem.

A fábrica recebeu os primeiros 176 fardos, mas, à medida que os preços foram caindo, ela cancelou a compra dos 968 fardos restantes, diz Loeb. A Ari Ambalaj sustenta que "as condições de mercado adversas [...] a impediram de honrar sua obrigação contratual", de acordo com a decisão da arbitragem. Um representante da fábrica recusou um pedido de entrevista.

A fábrica também rompeu contratos com vários outros vendedores, diz Jordan Lea, ex-presidente da Associação Americana de Exportadores de Algodão, que era um árbitro na disputa da Loeb. A fábrica turca está agora nas "listas de devedores" da Associação Internacional do Algodão e da Associação Mundial de Exportadores de Algodão, o que significa que os membros desses grupos não estão autorizados a fazer negócios com ela.

Líderes da indústria nos EUA estão tentando exercer pressão política sobre as empresas estrangeiras para que honrem seus contratos. Em uma carta no dia 2 de maio, um funcionário do Conselho Nacional de Algodão dos Estados Unidos pediu ao representante comercial dos EUA, Ron Kirk, que transmita aos países do Pacífico "a séria preocupação do governo dos EUA sobre o enorme volume de inadimplências contratuais em cada oportunidade que encontrar."

A equipe de Kirk disse que as autoridades americanas têm abordado o tema com governos da Indonésia, Tailândia, Vietnã, Guatemala e outros países. Funcionários do Conselho do Algodão não quiseram comentar.

Colaboraram Di Pinheiro, em Nova York, e Yeliz Candemir, em Istambul.

 Fonte: The Wall Street Journal. Por Michael Rothfeld e Carolyn Cui. 4 de setembro de 2012.

 


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