A tendência de acomodação das cotações internacionais de soja e milho em patamares mais baixos que os observados nos últimos anos, que deu o tom nesses mercados nos últimos meses e poderá se aprofundar no segundo semestre de 2013, impõe desafios importantes às respectivas cadeias de produção estabelecidas no país.
À tendência de recomposição da oferta mundial após as estiagens que prejudicaram as colheitas de ambos os grãos na América do Sul e dizimaram plantações (sobretudo de milho) nos Estados Unidos, o fator inicial da pressão para a queda dos preços somou-se, nos últimos dias, a confirmação de uma desaceleração do crescimento da economia chinesa e novos movimentos especulativos que ampliaram as apostas de baixas. Resultado: previsões mais pessimistas para o comportamento das cotações nos próximos meses. Um alívio para a chamada inflação dos alimentos, mas um desafio para os agricultores e para as grandes tradings exportadoras.
Cálculos do Valor Data mostram que, na bolsa de Chicago, a cotação média dos contratos futuros de segunda posição de entrega (normalmente a de maior liquidez) da soja alcançou US$14,80 por bushel (medida equivalente a 27,20 quilos) no primeiro trimestre deste ano, 10,4% menos que no quarto trimestre de 2012. É verdade que, em relação ao intervalo entre janeiro e março do ano passado a valorização ainda foi de 24,9%, mas, se nenhuma intempérie climática afetar a safra que começa a ser plantada no Hemisfério Norte (2013/2014), alguns analistas já estimam que os preços possam se aproximar de US$11,00 no segundo semestre deste ano.
No mercado de milho o cenário é semelhante, com o agravante de que, por enquanto, as perspectivas apontam para uma recuperação plena da colheita nos Estados Unidos após a quebra do ano passado, que se aproximou de 100 milhões de toneladas. Em Chicago, a segunda posição registrou cotação média de US$7,39 por bushel (25,20 quilos) no primeiro trimestre, 4,8% menos que no último quarto de 2012, mas ainda 17,4% acima da média do primeiro trimestre do ano passado. Mas também aqui a maior parte das apostas é de quedas mais significativas a partir de agosto.
Com menos "liquidez" do que a soja, que se tornou o carro-chefe do agronegócio brasileiro há mais de uma década, o milho é o produto agrícola que mais concentra a atenção dos técnicos do governo no momento. Na quinta-feira (18/4), em evento que reuniu companhias do setor de agronegócios na BM&FBovespa, na capital paulista, mais uma vez o milho alimentou boa parte das discussões.
Nesse contexto, os preços do milho já estão em queda livre em Mato Grosso, cuja segunda safra foi o grande destaque no tabuleiro nacional do cereal na temporada 2011/2012 e será também volumosa no ciclo atual, cuja colheita começará a ganhar força nas próximas semanas. "A situação agora tende a se inverter. Viemos de preços altíssimos, em função de um cenário americano, mas agora a situação (da produção dos EUA) é diferente. E a produção brasileira vem despontando como recorde, o que por si só é uma pressão", afirmou Tomé Luiz Freire Guth, gerente de oleaginosas e produtos pecuários da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) .
De acordo com ele, os preços do milho devem recuar abaixo do preço mínimo definido pelo governo, particularmente em Mato Grosso, o que já vem motivando uma série de pedidos de intervenções por parte da Conab. Segundo Guth, os produtores brasileiros de milho voltarão a ficar dependentes do mercado doméstico, uma vez que a maior produção americana tende a reduzir o apetite de estrangeiros pelo milho brasileiro, destaque nas exportações do setor tanto em 2012 quanto no primeiro trimestre deste ano.
Na safra de verão desta temporada 2012/2013, o preço mínimo para o milho nas regiões Sul, Sudeste, e Centro-Oeste (exceto MT) foi estabelecido em R$17,46 a saca de 60 quilos. Em Mato Grosso e Rondônia, esse valor é de R$13,02 e no Norte (exceto RO) e no Nordeste, R$20,76. Mas, apesar do cenário baixista para o milho, o gerente da Conab não acredita que o plantio do cereal cairá significativamente na próxima safra (2013/2014), que começará a ser semeada no terceiro trimestre deste ano. Segundo ele, mesmo se os EUA confirmarem uma produção recorde de milho, o produtor brasileiro só teria condições de substituir o plantio de milho pelo de soja na primeira safra (de verão), enquanto na safrinha (inverno) as opções são mais limitadas.
Além disso, afirmou, a segunda safra de milho em Mato Grosso se estruturou e agora é parte do modelo de negócio de grandes produtores e empresas agrícolas que moldaram a cadeia da soja, azeitada e voltada ao mercado externo . "O agricultor faz as contas: ganha com a soja perde com milho, mas não reduz o plantio". Dependendo da intervenção do governo, essas perdas talvez nem existam.
No caso da soja, a questão é mais estratégica e diz respeito ao momento da venda da safra que começará a ser plantada em setembro (2013/2014), uma vez que a colheita de 2012/2013 foi, mais uma vez, bastante rentável. Capitalizado, os sojicultores podem escolher o melhor momento para comercializar sua produção, e a antecipação de negócios já começou. Os sinais indicam que essas vendas antecipadas poderão ser fortes, justamente para evitar que grandes volumes tenham que ser vendidos no segundo semestre, época de escoamento da produção dos EUA.
Fonte: Valor Econômico. Por Fernando Lopes e Luiz Henrique Mendes. 19 de abril de 2013.
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