O governo do estado de São Paulo deve anunciar até o fim deste mês uma restrição ao uso de água na agricultura. O foco são as plantações irrigadas localizadas nas bacias hidrográficas que estão em situação crítica do ponto de vista do abastecimento humano. A medida deve afetar produtores responsáveis por 50% do abastecimento de hortifrútis do estado.
A estimativa inicial da Secretaria de Agricultura paulista é de que cerca de três mil propriedades rurais sejam afetadas pela restrição prevista para a irrigação nas bacias do Alto Tietê e do PCJ (Piracicaba, Capivari e Jundiaí), que abastece o Sistema Cantareira. A ideia é restringir a captação nos locais que comprometem a formação dos reservatórios que abastecem o consumo humano, a prioridade neste momento.
As áreas mais críticas podem ter restrição total, afirmou ontem ao Valor o secretário de Agricultura, Arnaldo Jardim, que está há menos de um mês no cargo. Sistemas de irrigação ineficientes serão desativados, como é o caso dos pivôs centrais, que usam muita água para pouco efeito na produtividade. A visão é que não há mais espaço para esse tipo de tecnologia defasada.
Somente no entorno da bacia do Alto Tietê - atualmente com apenas 10% de sua capacidade e considerado mais importante do ponto de vista da irrigação - existem seis pivôs com essas características, pertencentes a médios produtores, conforme levantamento dos técnicos da secretaria. Na visão do governo, não é possível dar o mesmo tratamento a um produtor que usa pivô central e a outro que usa a tecnologia de microaspersão, que é muito mais eficiente.
O número exato de municípios afetados pela medida ainda está sendo levantado, em um trabalho conjunto das secretarias de Agricultura, do Meio Ambiente e do Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo (DAEE), responsável pelas outorgas no uso da água.
A princípio, restrições no uso da água devem atingir cerca de três mil produtores, a maior parte de pequeno porte que cultivam hortaliças, frutas e flores. A região que engloba Holambra, o maior polo de floricultura do país, não está na zona de maior criticidade dos reservatórios, apesar de ficar no complexo hidrográfico do Piracicaba, Capivari e Jundiaí.
Do total dos cultivos que são irrigados a partir de captações feitas na bacia do Alto Tietê, 90% são as chamadas hortaliças folhosas, tais como rúcula, alface, agrião e brócolis. Na mesma região, 13% da produção é de flores e 7% de frutas.
Na bacia do Piracicaba, Capivari e Jundiaí, a restrição deve afetar, em um primeiro momento, a faixa que vai de Limeira a Campinas. O foco são as regiões de irrigação cuja retirada de água interfere na formação dos reservatórios em situação de maior escassez hídrica.
"Entendemos a gravidade do momento. A diretriz do governo do estado de dar prioridade ao abastecimento humano é correta. Estamos buscando uma alternativa que resulte em um impacto mais ameno possível à agricultura", declarou Arnaldo Jardim.
Uma linha de apoio à renda dos produtores afetados também está sendo estudada pela pasta. O poder público ainda não tem ideia do impacto econômico da restrição, mas reconhece que trará perdas de produtividade aos cultivos, ainda que não comprometa totalmente a atividade.
O governo paulista ainda estuda o formato jurídico e como funcionará na prática essas limitações ao uso de água. Mas é certo que os primeiros alvos serão os produtores que captam água nos rios que compõem essas bacias sem autorização legal (outorga).
Ainda não há uma dimensão de qual volume de consumo precisará ser cortado para amenizar a escassez. Faltam informações sobre quanto é de fato retirado dessas bacias. No Alto Tietê, por exemplo, há autorizações para captar 2,53 por segundo, mas para técnicos do governo um volume bem abaixo desse limite está sendo, de fato, retirado.
Paralelamente às restrições de captação, a secretaria pretende priorizar um programa de pesquisa nos institutos vinculados ao órgão para desenvolver culturas mais resistentes à escassez hídrica.
O secretário de Agricultura de São Paulo afirmou que outra medida será usar o plano de regularização ambiental do Estado para acelerar a recomposição de matas ciliares. "Essa recomposição não gera mais água, mas evita assoreamento de cursos dágua e preserva sua qualidade", afirmou.
Em 2008, o uso de água para irrigação significou cerca de 20% da demanda hídrica do estado, seguido pelo setor industrial (31%) e abastecimento (49%), conforme dados do DAEE. A previsão, contida em estudo concluído em 2013 pelo departamento, é de que a demanda para esse tipo de uso alcançasse 21,8% do total em 2018. O Alto Tietê representava, em 2008, 10,32% da demanda de irrigação de São Paulo, enquanto a região da bacia do PCJ, 28%.
Fonte: Valor Econômico. 22 de janeiro de 2015.
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