Repercutiu bastante a enorme mobilização dos agricultores em várias cidades e rodovias nos Estados do Sul e no Centro-Oeste do país. Um legítimo “tratoraço”. Milhares de produtores, veículos e máquinas agrícolas bloqueando ruas e estradas. Discursos, panfletos e protestos diante de agências bancárias... Tudo para chamar a atenção do governo para a difícil situação do setor primário. Justo, muito justo! Afinal, é notório o processo de empobrecimento e de descapitalização do homem do campo.
Ninguém duvida que o setor primário está pagando muito caro para garantir a estabilidade da economia do país. Nos discursos inflamados as principais reivindicações – prorrogação das dívidas de financiamentos anteriores e liberação de mais recursos financeiros com juros mais baixos. Se alcançados estes propósitos, estarão resolvidos os principais problemas do setor primário? Penso que não.
Ocorre que invariavelmente as mobilizações dos produtores rurais concentram-se numa ou noutra questão pontual, isolada e, às vezes de ocorrência eventual. Outros problemas crônicos, subjacentes às crises, passam despercebidos, sem merecer a atenção, a reflexão, o debate e a tomada de posições no sentido de contorná-los. Vejamos...
OUTROS PROBLEMAS
Elevação constante dos custos de produção. Isto ocorre porque a relação entre os diferentes elos das cadeias agroindustriais é muito frágil, pouco transparente e eticamente pobre.
Cada segmento, particularmente o elo “antes da porteira”, olha apenas para o seu próprio umbigo, buscando índices de rentabilidade cada vez maiores, sem considerar o sacrifício que esta atitude impõe aos segmentos adjacentes. Na base do “eu quero o meu, o resto que se dane”!
Os preços dos insumos (defensivos, fertilizantes, etc.) e das máquinas e equipamentos agrícolas sobem em ritmo de ”Fórmula 1“, ao mesmo tempo em que os preços recebidos pelos produtores de grãos, carnes e leite, vêm sendo comprimidos ano a ano.
Dados da FGV e da CONAB mostram que no período de 1990 a 2003, o percentual de aumento dos preços dos insumos foi de 331%; dos combustíveis 406%; dos fertilizantes 319%; das máquinas e equipamentos 332%. E o preço pago pelos produtos agropecuários foram reajustados nas mesmas proporções? Nem pensar! Pelo contrário, em valores comparativos vêm despencando ano após ano.
O desfecho não poderia ser diferente – profunda crise no setor da produção primária. E daí, quem está discutindo seriamente esta questão? Excetuando-se algumas iniciativas meritórias como a implantação da Casa Rural – Centro do Agronegócio, através da FARSUL-RS, que propicia a negociação em bloco por grupos de produtores tanto na compra de insumos e equipamentos como na venda de seus produtos, já com resultados animadores, o que se observa é uma situação de subserviência das classes produtoras rurais às imposições dos mercados de insumos, de máquinas e equipamentos, setores fortemente oligopolizados.
DENTRO DA PORTEIRA
Mas “dentro a porteira” também há problemas que devem ser encarados com urgência e seriedade, e que influem significativamente no desempenho econômico das empresas rurais.
Entre eles, a meu juízo, cito o baixo grau de profissionalização do produtor rural brasileiro como o mais importante. Na origem deste problema está o deficiente nível de escolaridade das pessoas do campo.
O sucateamento do ensino no meio rural impede o acesso à cultura, restringe a capacidade de pensar e de buscar soluções para os problemas que se avolumam, oblitera a capacidade de entender e de se ajustar às extraordinárias e cada vez mais freqüentes mudanças que exigem do setor da produção uma agilidade maior para se adaptar às novas exigências dos mercados.
Resultado – o produtor desinformado compra o que não precisa, paga preços absurdos por mercadorias de qualidade duvidosa, imobiliza capital muito acima da capacidade da sua empresa, explora atividades incompatíveis com o perfil da sua propriedade rural e passa a caminhar a passos largos rumo a falência.
O pior é que o desinvestimento público no meio rural, representado pelo fechamento de escolas, continua em franco processo de crescimento.
Levantamento do INEP (MEC) mostra que 67% dos jovens rurais em idade escolar, não estão freqüentando regularmente a escola. Isto significa que a próxima geração de produtores e trabalhadores rurais também terá baixo grau de escolaridade e, por conseqüência, não terão condições de se tornarem profissionais competentes em suas áreas de atuação. Pergunta-se: a classe rural está preocupada com esta questão? Algum movimento reivindicatório para reverter esse quadro?
Quem sabe a gente pára pra pensar um pouco? Vamos desligar o aparelho de TV, legítima “máquina de fazer doidos” (saudades do Sergio Porto - Stanislaw Ponte Preta), e vamos aproveitar esse tempo para pensar, analisar, buscar informações e nos capacitarmos para uma eficiente administração das nossas empresas rurais.
Vamos tentar?