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Curiosidades verbais


por Otaliz

Sexta-feira, 25 de janeiro de 2008 - 18h19

É médico veterinário e instrutor do Senar – RS.


Em alguns artigos ou contos que escrevi, usei o vocábulo tambo referindo-me à propriedade que explora o gado leiteiro. Um leitor mais atento chamou minha atenção para o fato de que essa palavra é ininteligível para pessoas que não vivem no Rio Grande do Sul. E tem razão o leitor. De fato, esse vocábulo é de origem espanhola e designa tarro, ou seja, o recipiente onde se coloca o leite para transporte e venda. Por conseqüência, o produtor que comercializava o leite era identificado como tambeiro. Com o passar do tempo, tambo passou a ser indicativo da propriedade que explora o gado leiteiro, ou leiteria como é conhecida nos demais Estados do Brasil. No entanto, no Rio Grande do Sul, no Uruguai e na Argentina, até hoje tambo é palavra de uso corrente e definitivamente incorporada à dialetologia popular. AS INFLUÊNCIAS NO LINGUAJAR GAÚCHO Ocorre que, desde a sua origem, o linguajar gaúcho foi sendo formado a partir de três vertentes: o espanhol, o português e o indígena. No início do século XVI a colonização (ou seria dominação?) dos campos mais ao sul do país, até então ocupados exclusivamente por indígenas, foi realizada alternadamente por espanhóis e portugueses em constantes conflitos, onde os índios eram usados como “bucha de canhão”. Por oportuno, é importante registrar que os limites fronteiriços entre Brasil, Uruguai e Argentina, em termos práticos, ainda não estavam completamente definidos. Os exércitos eram constituídos por brasileiros, uruguaios, mestiços e índios dos dois lados da fronteira. O convívio estreito e contínuo desses grupos de distintas origens foi, paulatinamente, moldando uma cultura comum e forjando o tipo humano que definiu a figura do gaúcho sul-americano. A propósito, o vocábulo gaúcho ou gaucho, como é pronunciado no Uruguai e na Argentina, define o homem, independentemente da sua origem ou nacionalidade, que é habilidoso cavaleiro, guerreiro corajoso e, nos tempos de paz, dedica-se a cuidar dos rebanhos bovino e ovino. Enfim, um campeiro. Posteriormente, no RS, o termo ganhou uma conotação gentílica e passou a designar todas as pessoas nascidas neste Estado, da mesma forma que outros adjetivos gentílicos como carioca, barriga-verde, capixaba e fluminense. EXPRESSÕES REGIONALISTAS Mas o uso de vocábulos ou expressões de cunho regionalista não é privilégio do RS. Em todos os Estados brasileiros são utilizados dialetos particulares. Às vezes uma determinada palavra ou expressão tem a mesma grafia nas diferentes regiões, mas sentidos diferentes. O vocábulo boi é um exemplo. Para nós gaúchos, boi é o macho bovino castrado antes de atingir a idade reprodutiva. Portanto jamais será um reprodutor. No entanto, em outras regiões do país é comum ouvir-se de produtores rurais e até mesmo de técnicos, a palavra boi, como indicativo de macho reprodutor, ou seja, touro. Causa-me surpresa também, ouvir pessoas de outras regiões dizerem que gostam de comer carne de carneiro. Com certeza jamais consumiram esse tipo de carne posto que, carneiro é o macho ovino adulto e a carne desse animal é dura e exala um cheiro muito desagradável. O que foi consumido sim, foi carne de cordeiro, ovelha ou capão (macho castrado antes da fase reprodutiva). O importante é que não há nada de errado com essas diferenças. Trata-se apenas de curiosidades verbais que servem para enriquecer esta aquarela cultural que deu forma e sentido a este tipo humano maravilhoso que é o brasileiro – pacífico por natureza, simpático, receptivo e amante da paz e do progresso.
Otaliz de Vargas Montardo é médico veterinário e instrutor do Senar – RS
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