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Scot Consultoria

Logística


Segunda-feira, 24 de maio de 2010 - 14h27


Todos os rios correm, finalmente, para o mar. Disso ninguém duvida. Curiosamente, porém, aqui, no Brasil, certos rios parecem seguir ao contrário, rumo ao interior. Em São Paulo, o Rio Tietê anda para trás, até encontrar o Paraná. Já pensaram se eles desaguassem em Santos? Nos EUA, o Rio Mississippi faz direitinho o seu trajeto. Ele sai lá do interior, no Meio-Oeste norte americano, e deságua direto no Golfo do México. Transformou-se, assim, desde o início da colonização americana, numa privilegiada via de navegação. Serve às pessoas e, principalmente, ao transporte de cargas. Situado a 1.500 km de distância, os agricultores de Iowa, Ohio, Illinois contam com a bênção das águas doces para escoar sua produção. A hidrovia do Mississippi torna barato o cereal dos gringos na exportação. Sorte da natureza, misturada, claro, com investimentos públicos na famosa hidrovia. Aqui, os produtores rurais que se aventuraram pelo Centro-Oeste brasileiro, abrindo as fronteiras de Mato Grosso e Goiás, incluindo agora Mato Grosso do Sul e o Tocantins, passam agruras maiores, advindas de sua distância. Eles dependem de esburacadas rodovias para descarregar sua safra de grãos, que viaja de caminhão por cerca de 2 mil km até o Porto de Santos, ou Paranaguá. Demora demais, causa perdas e encarece o frete. Essa questão, chamada logística, virou um pesadelo para os agricultores nacionais, especialmente os mais apartados do litoral brasileiro. Na roça, o produtor rural domina a tecnologia, sabe cultivar, obtém resultado, dorme em paz, rezando apenas pela chuva no tempo certo. Na hora de vender o fruto de seu trabalho, todavia, ele se amargura. O preço se rebaixa no desconto do frete. Nos últimos anos, dependendo do preço da tonelada de soja, o custo do transporte em Mato Grosso representou de 32% a 48% do grão desembarcado na China. Incrível. Somente o trajeto até o destino final sobrepuja o custo, somado, do fertilizante, do óleo diesel, dos agroquímicos, da colheita. Deprime a concorrência. O conceito da logística remete aos líderes militares desde os tempos bíblicos. Longas e distantes guerras de conquista exigiam o deslocamento de vultosas cargas, tropas, equipamentos, alimentos. Toda a organização das tarefas necessárias ao sucesso da brutal empreitada cabia aos especialistas, responsáveis por assegurar recursos e suprimentos para a guerra. Trazida para os tempos modernos, a ideia da logística militar passou a ser utilizada na gestão empresarial, englobando basicamente transporte, armazenagem e informação. Nas atividades rurais, dadas as distâncias da produção, tornou-se uma disciplina essencial. Estudiosos do desenvolvimento a consideram fundamental na infraestrutura de um país. Pois bem, dez entre dez especialistas da economia rural salientam que na deficiência da logística reside o maior gargalo da agropecuária nacional. Portos antigos e mal aparelhados, em parte dominados por grupos corporativos, alguns mancomunados com a corrupção, restringem os embarques. Filas quilométricas se formam na chegada, aguardando a lentidão da saída nos navios. Brutal ineficiência. Da roça até o porto, então, nem se fala. Péssimas rodovias freiam o tráfego, quebram molas, causam perdas. No país dos caminhões, as ferrovias viram miragens, a exemplo da Norte-Sul, em construção desde 1987. Quando existem, os trens não mostram vantagem de custo sobre a rodovia, conforme se verifica no trecho entre Alto Araguaia (MT) e Santos. O poder de monopólio da concessionária equipara o frete da rodovia ao da ferrovia. Contrassenso total. Quanto às hidrovias, sua construção anda devagar, qual tartaruga. Duas rotas aquáticas funcionam bem: a hidrovia Tietê-Paraná e a Madeira-Amazonas. Mas ambas, juntas, transportam apenas 13% da produção agrícola do Centro-Oeste. Dificuldades no licenciamento ambiental ou escassez de recursos não explicam a demora na operação de novas hidrovias. Falta, isso sim, decisão política para investir na infraestrutura da produção. Uma questão de planejamento. Quer dizer, de sua falta. Puxado pela agropecuária, cuja agronomia aprendeu a dominar o cerrado, um virtuoso processo de interiorização acomete a economia brasileira há, pelo menos, 20 anos. Desde 1985 até 2005 o Centro-Oeste cresceu 63,5%, bem acima da média nacional, de 39,8%. Somados, os Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás, mais o Distrito Federal, respondem hoje por 37% da safra nacional de grãos. Lideram, também, o rebanho bovino. Com estruturas administrativas menos viciadas e mais enxutas, ostentando 11,5 milhões de habitantes (exceto Brasília), o eldorado nacional se desenvolve, mesmo contra os gargalos da infraestrutura. A nova fronteira de progresso foge da costa atlântica, alcançando ainda Rondônia, Tocantins, o Sudoeste baiano, o Sul do Maranhão, parte do Piauí. Cresce a riqueza longe das mazelas metropolitanas. Sensacional. É verdade que a expansão da fronteira agrícola apresenta problemas ambientais, interferindo no desmatamento, tanto na Amazônia quanto no cerrado. Também se pode argumentar que a distribuição fundiária mostra um padrão concentrado, grandes fazendas em poucas mãos. Mas, no fundo, tais questões negativas refletem o descaso governamental com essa virtuosa agenda. Falta um projeto do Estado para organizar a nova fase do desenvolvimento do Brasil. Logística, na cabeça do homem simples do campo, deriva do raciocínio. Pergunte-se a qualquer um deles. Não faz sentido produzir alimento ou matéria-prima e, na hora da venda, ver seu dinheiro sumir na mão do intermediário que banca o frete. Não tem lógica. Melhor, falta logística.
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