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Scot Consultoria

Conversa com a taxa de reposição


Segunda-feira, 6 de dezembro de 2010 - 15h17

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Olha, taxa de reposição, não se preocupe não. Gosto de você. O pessoal tem te humilhado, dizendo que você não é importante, que você é ultrapassada. Releve isso, querida taxa. Na realidade esse pessoal não te entende. Eles só enxergam seu corpinho velho, enrugado. Desdenham a sua idade. Dizem assim: “Isso aí não dá mais para nada. Isso é passado.” É assim mesmo. O pessoal mais novo é cheio de energia, cheio de convicções, cheio de certezas. Não fique assim tão triste, taxa de reposição. Olha só, se você olhar para trás, aos trancos e barrancos, foi assim na maioria das vezes que o progresso chegou, não é mesmo? O progresso chegou através do desafio ao status quo. Ok, pode ser aqui o desafio só pelo desafio, mas não sabemos disso de antemão. É que esse pessoal mais novo tem o peito cheio, o ar inflado. A cabeça cheia de certezas acaba ocupando todo o espaço, não deixando lugar para mais nenhum outro sentimento. Acaba não deixando espaço para a prudência, por exemplo. Veja você, minha querida taxa de reposição, até mesmo a sabedoria acaba tendo que ceder espaço para a pressão do ar. O ar inflado acaba retirando a ponderação que seria necessária para entender você. Esse pessoal tem pressa. Não andam mais a cavalo. Só lêem relatórios. A pressa não lhes permite parar para refletir o que você representa. Não lhes permite perceber a sutileza da mensagem que você transmite. Mas pode ficar tranqüila. Eu sei o que você representa. Você esteve sempre em meus pensamentos. Estivemos sempre juntos em toda essa jornada nesses últimos quinze anos. Pois é. Quantos anos... Os anos passam, as modas chegam e também passam. A moda agora é te depreciar. Dizer que o lucro é tudo que se precisa saber para mexer com boi. Mas não é verdade que você já dizia isso há muito tempo? Você nunca falou mal do lucro, nem que os custos de produção não são importantes. Quem pouco te compreende é quem fala isso. A verdade é que você sempre disse: ao conectar o bezerro e boi gordo através da divisão dos dois, através de um forma simples, uma conta elegante, você estava mostrando a direção que os lucros estavam cursando. Sim, você é, antes de mais nada, onde o lucro busca inspiração. Com seu jeito quieta de ser, low profile, passando despercebida na multidão, você subia... e a rentabilidade, o lucro da engorda, também subia. Quando você caia, o lucro também caia. Você nunca disse que seu valor era igual ao lucro, porém, quando você se mexia, era certo que o lucro se movia na mesma direção. Não é isso que os antigos, sem fazerem contas, sem computador, calculadora, anotando tudo em uma caderneta, sabiam? Eles sabiam, pelos anos de experiência comprando e vendendo bois, investindo nas fazendas, comprando e vendendo terras, aumentando ou não o seu rebanho que de alguma forma não tão bem explicada eles sabiam que você era importante. Eles sabiam. Sabiam que era importante aproveitar os momentos em que você mostrava reposições altas. Sabiam também que era melhor esperar quando você estava muito baixa. Eles sabiam que é inseparável o ato de produzir um boi gordo do ato de comercializá-lo. Sabiam que o lucro do boi se dá em duas pontas — na hora de comprar e na hora de vender. E eles sabiam, ah, como sabiam, que é exatamente isso que você representa! A arte de comprar e vender bem os animais! Você representa as duas pontas da pecuária. A entrada e a saída. O bezerro e o boi gordo. Você é o instantâneo da atividade, dia-a-dia. Sim, é verdade. Através do seu jeito simples... um numerozinho apenas, entre tantos outros, inofensivo, não é verdade que você representa a variação da lucratividade da pecuária de engorda? Não se não estou enganado, é através deste gráfico esquisito... ...que você sempre quis se mostrar? Que você representa a oscilação da rentabilidade? Eu sei o que está implícito no gráfico, me desculpe ter que te desnudar desta forma. Ter que abrir o seu jogo. Ter que mostrar ao público o que os antigos sabiam como instinto, porém o pessoal mais novo, com zilhões de informações, não conseguiu extrair em conhecimento. Eu sei, querida taxa de reposição, que você não é a rentabilidade. Sei que você nunca será a prova matemática da rentabilidade. Faço jus a você, aqui: é exatamente isso que este gráfico esclarece. Esse gráfico expõe em números facilmente checáveis a sua mensagem mais importante: que o curso da rentabilidade é induzido através de você. É só observar as setas. Cada seta preta tem sua correspondente em vermelho. A gente não está errado ao dizer quando a reposição está alta, naquele momento, e só naquele momento, a rentabilidade também estará melhor versus o passado recente. O inverso também é verdadeiro. Na realidade provar isso é demorado... Não é mesmo? Só esse gráfico tem oito anos mostrando isso. É por isso que peço: releve quem te olha torto, taxa de reposição. É que não dá tempo para quem está com pressa perceber sua sutileza. Aliás, não é só uma questão de tempo. Tem que saber os seus custos também. Tem que ter a disciplina de não deixar a peteca cair. Essa disciplina ao acompanhar a sua dinâmica entre o boi gordo/bezerro é a mesma disciplina que tento ter aqui ao acompanhar a dinâmica do boi gordo/boi magro. Você tem muito a ver com o boi magro. Sei que é tudo dentro da família, querida taxa de reposição, mas tenho que dizer a verdade. Sinto muito se vou te magoar. A taxa de reposição boi gordo/boi magro é sua irmã, mas ela é bem mais comportada que você. E exatamente por ser muito mais comportada ela é ainda muito mais ignorada. Praticamente ninguém sabe que ela existe ou a utiliza. Mas deixemos essa questão familiar de lado. Essa dinâmica entre os seus dois componentes, o boi gordo e o bezerro também se mostram de uma forma complementar ao que você diz em seus próprios números. Vamos ver os dois em separado? Observe o gráfico abaixo e... ...me diga que não é realmente impressionante o que seus dois filhotes fizeram nestes últimos cinco anos? Está aí uma bela história. Tem de tudo. Alegria, pânico, desespero, medo, esperança, ódio. Se fosse um roteiro de cinema não seria mais completo. Você se recorda que essa história começou no finalzinho de 2005 com o problema da aftosa, não se lembra? Pois é. Quem diria que a partir de lá iríamos ter uma das maiores valorizações do boi e do bezerro? Olhe o tanto que aconteceu depois disso. E olhando para trás, agora, parece que passou tudo tão rápido. Mas tenho que te perguntar uma coisa. Porque você insiste em salientar que o boi tem que acompanhar o bezerro? Já sabia disso. Você já tinha me dito anteriormente que o teto do boi é o bezerro. Mas por que essa regra tão inflexível? Ora, pensei muito e acho que já até sei a resposta. Ela é simples, não é? E exatamente por ser simples é ignorada. O bezerro é o começo da história, não é isso? É onde a “pecuária de corte” começa — e irá se desenvolver nos anos seguintes. Então, se o bezerro é o início da história, quem é que faz essa história acontecer? Ah, entendi... Danadinha. É por isso que a gente acompanha a variação do abate e retenção de fêmeas, não é? Então, acompanhando a variação do abate e retenção de fêmeas a gente consegue espiar o início da história da pecuária que irá evoluir nos próximos anos. Claro, se a quantidade de fêmeas reprodutivas em determinado momento origina a quantidade de parições que teremos no futuro, então é natural prestarmos atenção no que elas estão fazendo. É o mais próximo do que poderíamos chegar de discernir o que teremos que fazer para nos preparar ao impacto desses acontecimentos... ...antes que eles realmente aconteçam. Querida Taxa de Reposição. Confesso que te conhecia, mas em um último suspiro de inspiração humilde e sincera, deixe-me abrir o coração para você aqui. Sabia que havia algo misterioso em você. Você funciona tão bem no dia a dia... Sabe, faz anos que tenho os meus custos de produção. Ao acompanhá-los e olhar para você ali do lado sempre notei que havia algo em seu comportamento. Você trazia consigo alguma verdade que eu ainda não tinha conseguido desvendar olhando para os meus próprios números. Mas isso faz vários anos agora. Ainda bem que te descobri. Descobri o seu segredo. Descobri seu verdadeiro significado. Minha rentabilidade melhorou muito depois que pude aprender a te respeitar e me antecipar aos avisos que você transporta. Por isso quero te dizer que, por todo o papel que você fez, representou e continua a representar para a história da pecuária e pela importância que representa para mim, profissionalmente, como pecuarista, deixo aqui meu respeitosamente e altivo: Muito obrigado.
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