Os principais argumentos ligados reforma do Cdigo Florestal mostram, de um lado, uma viso apaixonada e idlica sobre o mundo e, de outro, a importncia da produo de alimentos e os impactos que o Cdigo traz para os produtores em todo o pas. A tese de que desnecessrio alterar o Cdigo atual, a importncia dada ao papel da cincia e moratria do desmatamento so alguns dos temas em pauta.
Infelizmente, a maioria desses argumentos baseia-se numa viso enviesada de que a reforma do Cdigo Florestal deve beneficiar s um dos lados, o meio ambiente ou a produo agrcola.
Qual governana do uso da terra o Brasil ter em 2020? A produo agrcola ir estagnar-se ou poder expandir em harmonia com a conservao ambiental? Ser possvel reduzir o desmatamento e dar valor floresta em p? Os produtores deixaro de ser taxados de bandidos e podero regularizar suas propriedades?
Parcialidade - A movimentao de ambientalistas e movimentos sociais de pequenos agricultores contrrios alterao do Cdigo visivelmente parcial. A insegurana jurdica o elemento mais marcante do Cdigo atual e isso fruto de dezenas de mudanas introduzidas no texto desde 1965.
O fato de que a lei no clara sobre a existncia da Reserva Legal em todo o Cerrado, antes de 1989, quando polticas pblicas incentivaram o desmatamento na regio, somente um dos exemplos que corroboram a importncia da reforma. Se as regras fossem claras, os produtores buscariam se adequar, afinal, exatamente o que querem.
A proposta de uma moratria de cinco anos a qualquer desmatamento outro ponto absurdo. Partir do princpio de que preciso proibir o desmatamento legal para estruturar o uso da terra no Brasil significa, no mnimo: (I) reconhecer que o Estado brasileiro incapaz de cumprir seu papel numa reforma que essencial para o pas; (II) penalizar os produtores que cumprem a lei e possuem reas de Preservao Permanente (APPs) e Reserva Legal ntegras e, por isso, podem desmatar legalmente; (III) afugentar investimentos e criao de empregos; (IV) manter o ambiente de insegurana jurdica.
Desafio - Na prtica, o maior desafio do novo Cdigo dar valor floresta em p. Enquanto as reas com vegetao nativa tiverem valor infinitamente menor do que reas consolidadas, que so utilizadas para produzir alimentos e energia, no haver lei que iniba o desmatamento ilegal. um absurdo que um hectare de floresta bem preservada custe entre R$100 e R$300 na Amaznia, enquanto reas produtivas pas a fora valham entre R$2.000 a R$20.000.
essa realidade que a reforma do Cdigo precisa combater, pois somente assim ser possvel transformar florestas em ativos. O custo de oportunidade da terra precisa ser considerado, caso contrrio, o Brasil continuar a ter uma governana precria do uso da terra.
O mais intrigante que florestas renem fauna e flora, gua, carbono, populaes locais, indgenas, frutos, madeiras, animais, essncias, e inmeros ativos que j so valorizados internacionalmente. Tarda para que esses recursos sejam sustentavelmente explorados, pois essa a nica forma de manter as florestas nativas, produzir alimentos e energia, gerar empregos, renda e dar uma vida digna a milhes de pessoas. A economia verde depende disso, e se o Brasil quiser realmente dar este salto, precisa fazer uma reforma do Cdigo Florestal que rena todos esses elementos.
Alteraes - Por fim, vale lembrar que o papel da cincia comumente citado como elemento base para fundamentar as alteraes do Cdigo. Nesse sentido, o livro Cdigo Florestal e a Cincia, contribuies para o dilogo, publicado pela Academia Brasileira de Cincias (ABC) e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Cincia (SBPC) salienta o lado das cincias biolgicas, mas no pode ser entendido como a palavra final e absoluta de toda a comunidade cientfica.
Do ponto de vista ecolgico, pode-se argumentar que preciso aumentar as APPs, restringir ainda mais a produo agrcola e restaurar milhes de hectares de reas a ttulo de Reserva Legal. No entanto, no s a ecologia, a geologia e a biologia devem ser contempladas pelo Cdigo Florestal. A economia, a agronomia, o direito, dentre outras cincias humanas precisam fazer parte da lei, que no trata apenas do meio ambiente.
Cincia - Por isso, os argumentos da ABC e da SBPC no podem ser acolhidos como as evidncias cientficas que faltavam para solucionar o debate sobre as mudanas no Cdigo Florestal. Pela lgica puramente ambiental faz sentido aumentar os limites mnimos das APPs, congelar em 80% a Reserva Legal na Amaznia e diminuir a produo de alimentos. Mas sustentabilidade exige equilibrar os aspectos econmicos e sociais tambm. Seria o caso de sacrificar toda sociedade em prol de radicalismos?
uma questo de escolha entre modelos: o novo Cdigo dar nfase conservao pura, o que exclui necessidades vitais do ser humano, e sua interao com o meio, ou buscar o equilbrio entre proteo do meio ambiente e produo sustentvel?
essencial lembrar que o Brasil possui 63% de vegetao nativa que ainda no foi devidamente valorizada. Preservar por preservar no sustentvel, pois no contempla o vis social e econmico, inerente ao conceito de sustentabilidade.
O nico pas do mundo que pode expandir sua produo em sintonia com a conservao ambiental o Brasil. Cabe aos produtores, aos ambientalistas, aos polticos, aos cientistas e a toda a sociedade construir uma nova lei moderna, efetiva, que equilibre produo e conservao. Se essa oportunidade for desperdiada, todos perdero uma chance indita na histria do pas.
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