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Scot Consultoria

O mercado é soberano


Segunda-feira, 8 de agosto de 2011 - 16h55

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Essa é uma tabela que gosto muito porque é uma tabela simples e direta. Ela mostra ano-a-ano o fechamento mensal do indicador já livre do funrural, para facilitar as coisas. Esses são os preços que foram pagos pelos frigoríficos desde 1994 até agora. A gente nota que existem mais verdes que amarelos aqui. Notamos também que quando começa uma sequência de amarelos, essa sequência dura bastante tempo. Depois que a sequência de amarelos acaba, ela acaba mesmo. Tivemos três sequências amarelas desde o início do plano real. A primeira foi na ressaca do início do plano real em 95~96. A segunda ocorreu na aftosa entre 05~06 e a mais recente agora, entre 9~10. Repare que o mercado ficou verde a partir de junho/10 e está deste jeito desde então. Mês após mês a arroba está terminando acima do que tinha terminado no ano anterior. Por exemplo, julho de 2010 ela valia 85 reais. Este mês ela fechou valendo 100 reais. Agosto também, até agora, está sinalizando alta. Ano passado este mês de entressafra fechou valendo 91 reais. Agora a arroba está valendo 100 reais. Qual a razão de colocar um tipo de tabela dessas, caro leitor? Bom, a idéia é ajudar a colocar os preços da arroba em perspectiva. Semana passada fizemos um exercício desses. Esta semana estamos fazendo a mesma coisa, somente alterando a abordagem. Mas isso tem utilidade prática? Bom, tem hora que sim. A forte queda do mercado futuro esta semana trouxe para baixo toda a estrutura de preços deste segundo semestre de tal forma que, descontada a inflação, a arroba valerá o equivalente a 100 reais livre de impostos até o final do ano. Daí a gente faz outra tabelinha esperta para colocar a oferta de gado em perspectiva. Observe o abate brasileiro, em número de cabeças, mês a mês, medido pelo SIF. A ideia desta tabela é a mesma da tabela anterior. Verde, se o abate subiu. Amarelo, se caiu. Repare a diminuição do abate desde meados de 2007, caro leitor. Olhe o tanto de amarelos! Aqui fica evidente a razão de que não é necessário o consumo subir para o preço da carne e da arroba subirem. A oscilação da oferta no longo prazo faz isso com maestria. Mais uma evidência que quem manda no preço é a oferta. Agora reparem em 2011. Esse ano continua ainda como um ano de redução no abate. Segundo o SIF abatemos até julho 11,81 milhões de cabeças no Brasil. Nesse mesmo período do ano passado abatemos 13,02 milhões. Isso é menos 1,2 milhões de cabeça no ano. Diacho, na safra de 2011, entre abril, maio e junho abatemos praticamente 1 milhão de cabeças a menos que a safra de 2010! Espero que o leitor aprecie a relação entre as duas tabelas que coloquei. Elas demonstram a consequência da redução na oferta de gado nos preços da arroba. Não tem como ser mais direto que isso, leitor. Esta relação mostra que um abate menor de gado traz consequências altistas para os preços da arroba. Este ano está sendo diferente? Quero dizer, esta relação até agora não procede? O mercado está se comportando em 2011 de forma diferente que se comportou no passado? A lei da oferta versus demanda parou de funcionar? Até agora, não. Mas o mercado espera que sim. Pelo menos, é essa a opinião que a gente chega ao olhar para a bolsa. Mas calma lá. Faltam computar as exportações. Os números dizem o seguinte. Ano-a-ano o abate está 8% menor agora. O Anualpec 2011 e também a Scot Consultoria dizem que o abate de 2010 foi ao redor de 42 milhões de cabeças. Uma queda de 8% significa em números redondos, 4 milhões de cabeças a menos e geraria um abate de 38 milhões em 2011. Somos 191 milhões de brasileiros, segundo o IBGE. O consumo interno é de 36 quilos por habitante, segundo a Conab. Isso equivale a 31 milhões de cabeças consumidas no mercado interno. Sobram 7 milhões de cabeças para exportações. As exportações até agora já escoaram 2,5 milhões de cabeças, 20% abaixo do que foi exportado ano passado. A ABIEC espera queda de 15% no ano. Vamos usar este número. O mercado externo não está ruim, diga-se de passagem. Os EUA estão pegando boa parcela desta fatia que estamos deixando de exportar. Fazendo uma projeção terminaríamos com uma exportação equivalente de apenas 4 milhões de cabeças. Observe a tabela acima. Se tínhamos 7 milhões de cabeças para exportar e exportaremos algo ao redor de 4 milhões em 2011, o mercado interno terá que absorver as 3 milhões de cabeças restantes. Como enxergo isso? Quer dizer que vai sobrar carne no mercado interno? Não vejo a coisa dessa maneira. Esta sobra de carne já está ocorrendo aos poucos ao longo dos meses, sobrando um pouquinho cada mês. Não é que vai sobrar boi e concentrar agora no final do ano. Então, mesmo com um abate menor e mesmo com as exportações abaixo do ano passado e essa carne sobrando no mercado interno, a arroba caiu durante o ano? Ao contrário, o consumo doméstico tem sustentado o preço da arroba. Acabamos de passar pela melhor safra da história. Isso quer dizer, para mim, que o consumo esse ano está mais firme ainda que o consumo do ano passado, caro leitor. O cidadão está comendo um pouco mais do que comia ano passado. Talvez não ele, mas outras pessoas que não consumiam carne bovina passaram a consumir de forma regular. E agora chegamos nos contratos da entressafra. Eles estão enxergando um cenário baixista. Aliás, no decorrer do ano, este foi o tom do mercado — apostar na baixa e no final do mês a arroba terminar mais cara. Excluindo-se maio e junho, os outros meses da safra evoluíram assim, como demonstrado abaixo, o preço no início e no final do mês do contrato futuro com o ajuste do indicador. Agora, na entressafra, o mercado continua no mesmo tom. O indicador fechou sexta feira valendo ao redor de 100 reais à vista, livre de impostos. O contrato de agosto, setembro, outubro e novembro fecharam, respectivamente, 100, 101, 102 e 102 reais, livre de imposto. Isso significa que na prática o mercado não enxerga mais altas para 2011. Isso significa que em 2011 não teremos entressafra. Será? É compreensível se desanimar com o cenário mundial financeiro, só que uma coisa é crise de títulos dos governos e outra é a dinâmica e inércia do movimento populacional e de renda migrando do ocidente para o oriente. Uma coisa é o cidadão deixar de comprar iPhone e outra é ele deixar de comprar carne. Tenho minhas dúvidas se este movimento poderia ser abortado assim em questão de dois, três meses, como o mercado futuro tenta antecipar. Mas, é claro, o mercado é soberano. Pode fazer o que quiser. Ele pode estar certo agora no segundo semestre de 2011? Claro que sim. Ele pode estar sendo assustado pelos participantes liquidando suas posições de forma precipitada, por stop-loss de quem comprou esse mercado acima de 106 no outubro? Pode ser... Saberemos mais nas próximas semanas com a movimentação do mercado físico.
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