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A arroba está cara ou barata?


Terça-feira, 4 de outubro de 2011 - 15h20

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Existe uma pergunta que de vez em quando coloco aqui nesses textos. À primeira vista é uma pergunta inocente, bem básica, mas que de tempos em tempos, por algum motivo existencial qualquer, sabe lá, talvez por estar em modo introspectivo, ou por uma ou duas noites mal dormidas, pensando nos preços e aparece a sensação que nos encontramos em encruzilhada no mercado, esse tipo de pergunta aparece na minha cabeça. Ela simplesmente vem do nada; e a curiosidade de procurar a resposta torna a obsessão similar àquelas músicas que não saem por dias da sua cabeça. A arroba está cara ou barata, caro leitor? Como disse, à primeira vista, é uma pergunta inocente. Passam-me pela cabeça, pelo menos umas dez formas diferentes de respondê-la. Outra coisa que complica a questão: qual o período de tempo que você quer responder? Ou seja, a arroba está cara ou barata em relação à semana passada, ao ano passado, a dez anos atrás, ou a quarenta anos atrás? Dependendo da janela de tempo que você quer analisar, existem indicativos técnicos de preço apropriados, que lidam melhor com o curto prazo ou com o longo-prazo, tal como o bate-papo técnico que tivemos na semana passada. Não é só isso, o tempo que está em jogo. Você pode analisar a arroba do boi com o preço do bezerro e ver se o boi compra muitos ou poucos bezerros. Compara também com a vaca, se a arroba dela está próxima ou longe da arroba do boi. Compara também com o ouro, como fizemos estes dias atrás. Se você tiver os seus custos de produção, dá para verificar se ela está boa de preço mediante a sua lucratividade. Você observa também a arroba perante a inflação. Como ela está se comportando? A inflação corrói os preços, tal como cupim em madeira. Os preços têm sempre que subir para acrescentar mais sustentação na casa, substituir a madeira corroída, senão a casa cai. Ou não? Você pode complicar mais ainda, comparando a arroba perante o movimento de taxa de juros brasileira ou até mesmo a taxa de juros americana. Fiz um comparativo destes há uns tempos com a taxa de juros americana, para brincar, e vi que isso colocou umas coisas interessantes à mesa. Outro dia entro nisso. Enfim, caro leitor, estou dizendo essas coisas não para demonstrar arrogantemente o quanto sei sobre pecuária, ou o quanto sei sobre o mercado pecuário. Digo essas coisas para demonstrar, na realidade, a minha ignorância sobre o assunto. Não sei nada de concreto, o conhecimento vai evoluindo junto com a experiência e o tempo que se dedica ao assunto. Só sei o seguinte. Não existe resposta definitiva para a pergunta “A arroba está cara ou barata?”. A gente tem a obrigação de tentar correr atrás de todas as respostas e pontos de vista que aparecem na nossa frente. Em cada uma das respostas você tira um tipo de análise, um ponto de vista. Para cada um desses itens, uma conclusão é atingida. É que nem passar por uma ponte quebrada. Você quer ter certeza de olhar de todos os lados, checar todas as tábuas, observar todos os detalhes, os pregos, até mesmo, se possível, ir debaixo da ponte para checar sua estrutura antes de passar com o seu carro. Depois você soma tudo e tira uma ideia geral do que fazer para conduzir em segurança até do outro lado. E depois disso tudo, você tem que contar com a sorte. Sorte de vislumbrar para onde o mercado poderá ir — e o mercado realmente ir para aquela direção mais ou menos quando você achou que ele iria. Ou seja, você tem que acertar o timming. Há um ditado no mercado: “Os cemitérios de Wall Street estão cheios de homens que estavam certos — cedo demais.” Separei um estudo aqui que pode — ou não — ser interessante para nós. Ele parte da suposição que um sujeito que compra um bezerro para engordar, espera ficar com esse animal mais três anos na propriedade, e o animal será abatido ao redor de quatro anos de idade, em média. OK, não estou falando da SUA fazenda. Você compra o bezerro e joga no pasto adubado, dá ração o ano inteiro e no final joga no confinamento e abate ele com 20 meses, não é mesmo? Ok, você é o máximo, está de parabéns, mas não é a média da pecuária nacional. Vamos falar na média aqui. Você conhece algum pecuarista que compra bezerro e fica com ele até o abate? Acho que sim. Hei, espere aí, vai ver você mesmo faz isso. A variação da arroba é o que nos interessa. Se ele comprou um bezerro com a arroba, por exemplo, valendo 70 reais lá atrás, duas coisas podem acontecer dali para frente enquanto esse animal vai crescendo e engordando nos próximos três anos. Na hora em que ele for vender o boi, a arroba do boi gordo pode estar abaixo de 70 reais ou pode estar acima de 70 reais. Sim, isso é importante porque em três anos muita coisa pode acontecer. Você tem o custo de compra do animal, os custos de frete e comissão para colocar este animal na fazenda. Esses custos você sabe na hora, pois acabou de comprar os animais. Depois disso, o que você só vai ficando sabendo aos poucos são os custos mensais para manter esse animal na fazenda nesses anos. Por exemplo, esse animal pode ter começado te custando 10 reais por mês e no final, 20 reais por mês. Aonde que aumentou os custos assim? Sal mineral, salários, impostos, energia... Essas coisas são reajustadas com o passar dos anos, certo? Além dessas coisas que você efetivamente paga, tem outra — a inflação. Ela está sempre ali, presente, com aquele sorrisinho cínico, te olhando desafiadoramente sugerindo que você não vai dar conta de superá-la nos três anos. Por último, o que você não sabe, infelizmente, é o preço de venda desse animal. De forma bem simples, você compra e espera que lá na frente a arroba esteja valendo mais do que vale agora e nessa diferença entre o que pagou pelo bezerro, o que gastou durante os meses e o que vendeu, descontando a inflação, ganhar alguma coisa. Pois bem, dá para medir isso de uma forma bem simples se a gente isolar o que realmente nos interessa. Sabemos que os custos são crescentes e que eles são em média muito parecidos entre as fazendas. Todos usam sal, vermífugo, vacinas e vaqueiros. Todos pagam ITR. Todos compram diesel, possuem tratores quebrados e cercas para consertar. Vivemos em um mundo com inflação. Isso significa que a arroba do boi tem que estar valendo acima de algum patamar que não sabemos para poder pagar por tudo isso e ainda sobrar grana no bolso do produtor. Se não sobrar lucro na engorda, a venda desses animais vai ficando mais difícil e os frigoríficos ficam com dificuldade de comprar animais. Resultado, a arroba tem que subir de preço para compensar a engorda. Observe o gráfico abaixo. Ele é a variação de três anos nos preços da arroba do boi e resume de forma bem simples tudo isso que falamos acima. Bom, esse gráfico é desde 1997 para cá e cobre o plano real. É o que nos interessa, obviamente, mas como alguns já sabem não me contento com isso. Chequei essa lógica com toda a base de preços da arroba que começa há mais de 50 anos atrás. A lógica do nosso raciocínio se mantém em todo esse período. Notem os momentos em que a valorização da arroba veio ao redor — e abaixo — de zero. Marquei-os com as linhas pontilhadas de vermelho. A arroba naqueles momentos valia o mesmo preço que valia três anos antes — situação ruim para o sujeito que engordava o bezerro. Nesses períodos das linhas em vermelho, os bezerros comprados três anos antes, e que foram vendidos como bois gordos, infelizmente não deram um resultado muito positivo em termos de lucratividade. Isso é raro, caro leitor. Essas linhas em vermelho ocorreram apenas nove vezes desde 1950. Por ser raro, é importante. De qualquer forma, foi isso o que ocorreu caro leitor, e isso é história. Serve para nos situar na pecuária e ajudar a responder se a arroba do boi em determinado momento está cara ou barata. E eis que estamos aqui em 2011, no último trimestre, já olhando para 2012. A linha da valorização beliscou 0% esses dias e agora deu uma subidinha. Isso significa que a arroba até recentemente não estava lá grandes coisas em termos de lucratividade. Ainda não está. Os piores momentos de lucratividade ocorreram esse gráfico entre 0% e –10%. O que esperar para frente? Bom, acredito que a pressão dos custos atuais talvez possa estar mais forte que estava lá em 2006 e 2007, da última vez que esse fenômeno ocorreu. Talvez o consumo interno possa dar esse colchão que tanto precisamos para sustentar a arroba. Com o dólar daí onde está para cima, talvez as exportações possam voltar a dar um gás. Dito isso, talvez os péssimos “0%” ocorridos no gráfico sejam o “basta”. É o cenário com o qual estou trabalhando. Com o qual estou fazendo minhas contas para 2012. Enquanto essa valorização de três anos se sustentar acima de zero, acredito que isso é construtivo para a arroba. Então, caro leitor, no português claro. Hoje a arroba está barata. A pressão dos custos que falamos aqui, somando ao que dissemos nessas últimas semanas nos levam a crer que talvez, talvez... Deixe-me repetir, talvez veremos algo melhor para 2012. Isso pode mudar, é claro, é por isso que acompanhamos todos os dias os preços. Se vier abaixo de 0% aí saberemos que estou me antecipando demais aos eventos. Por enquanto, isso é o melhor que podemos fazer. Se mudar os preços, ou se eu mudar de ideia, pode ter certeza que você será o primeiro ao saber. Mas não conta para ninguém, tá? É segredo nosso.
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