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Scot Consultoria

O Conto da Operação Jorge Chávez


Sexta-feira, 22 de novembro de 2013 - 17h40

É professor titular de planejamento e estratégia na FEA/USP Campus Ribeirão Preto e coordenador científico do Markestrat.


Os convido a me acompanharem em viagem para a interessante, exótica e culturalmente riquíssima cidade de Lima, no Peru. Uma condição única de ser beira mar e não ter chuva, em cima de uma falésia e a costaneira lá em baixo, com lindos bairros como Miraflores e San Isidro, e outros não tanto, mas em transformação.

Usei a manhã livre para caminhar pelas ruas de Miraflores, muito policiadas, lembrando Zeca Pagodinho e "deixando a vida me levar", observando como cientista os comportamentos, comércios e ambientes. Tomei um inesquecível expresso, fotografando a cafeteria recém inaugurada Juan Valdez, dos produtores colombianos. Uma culinária espetacular, recomendo conhecerem o La Mar Cevicheria, e a sequência com seis pratos, inesquecível.

O Peru tem grande riqueza na história. Palco de cultura, de golpes, de movimentos terroristas, e principalmente de reformas econômicas que permitem ser um país com incrível velocidade de crescimento e transformação, a China da América Latina.

Um taxista disse que o temível grupo terrorista Sendero Luminoso, tanto nos natais como nas passagens de ano, exatamente à meia noite em Lima, cortava a energia, para mostrar sua presença. Pouco tempo atrás. Comprei um livro para conhecer mais a história deste grupo e seu líder, professor universitário como eu, hoje detido em estrutura militar no capricho geográfico que avança junto ao mar, em frente a Lima. Voltarei  em novo conto com esta obra interessante.

A ida ao Peru foi para debate com economistas baseados nos EUA, na Europa e na América do Sul (o renomado Hernando de Soto), e ex-ministros do Chile e do Peru, nos Governos de Bachelet e Alan Garcia. Poucas pessoas falando no evento de macroeconomia e agricultura, entrei nesta segunda parte, uma honra no meio destas autoridades.

No jantar do dia anterior ao evento, 60 grandes empresários da América Latina, público-alvo dos organizadores. Fiquei na mesa dos palestrantes, completa com empresários. Se até então o conto está interessante, começa a apodrecer o ceviche.

A conversa rola para como está sendo a experiência nos EUA, a agricultura e como vejo a América do Sul, depois viajamos para a macroeconomia e comparações entre os países. Todos dão opiniões semelhantes do Brasil: um país bonito, povo bacana, mas difícil de se investir, um país caro, um país violento e que não cresce mais como crescia.

Na última vez que senti vergonha assim foi quando morava na Holanda, em 1998 e sempre sofria com estas conversas que diminuíam meu país, e ocorriam na mesa.  Para mim uma sensação nova, o Brasil saindo de moda. Estar na moda foi gostoso.

Depois de muito tempo na questão econômica, o assunto vai para amenidades. Perguntaram sobre os estádios da Copa, disse que parte já está em uso, alguns terão dificuldades econômicas depois, alguns com orçamentos estourados, mas todos ficarão prontos e lindos, padrão FIFA. Gosto deles, apesar das críticas. No sonho de que o Brasil lidere o futebol mundial, isto é importante.

E os aeroportos? Disse que após diversos, diversos e mais diversos anos e centenas de estudos, três foram finalmente privatizados, e nestes se vê grandes obras, que ficam prontas para o mundial. Sobre os outros não soube informar, pois dependem da estatal dos aeroportos, que mesmo tendo gente muito boa nos seus quadros, apareceu muito na mídia, porém em espaços não nobres, fruto da partilha do Estado.

Na sequência perguntaram como iremos fazer, já que o Brasil está muito violento, muito inseguro. A esta altura, já nervoso, me acalmei respirando fundo e percebendo que não estavam querendo me irritar, e sim, que tinham razão. Disse que faremos igual na Rio + 20, que foi um sucesso de segurança. Nosso Exército assume com a Polícia, a parcela selvagem se recolhe até que a Copa termine, o Exército volta para as suas funções e os selvagens voltam às ruas outra vez.

Porém, nesta hora tive um lampejo, uma pequena vingança e disse que poderiam ir sim ao Brasil, mas principalmente aqueles que conseguirem a classificação, e não serão todos nesta mesa...

O jantar foi delicioso, conversa cordial, mas indigesta. É duro assimilar tantas críticas, ver o sonho de país de primeiro mundo mais distante devido a nós mesmos, à nossa pouca capacidade de gestão.

Aproveitei a primeira chance e fui embora ao Hotel, com a desculpa da palestra. No taxi, um executivo de Banco, que vive em Nova York, mas cuida da América Latina, disse que a Cidade do México em quase todos os sentidos, está se tornando melhor que São Paulo. Fui a nocaute. Depois de algum tempo em silêncio, só me restou falar do Neymar. Aí venci, pelo talento individual.

Fiquei sabendo na mesa que a Presidência do Brasil esteve no mesmo dia em Lima. Dia seguinte, pego o El Comércio, principal jornal, ainda depressivo, e não vejo nenhuma nota da visita na primeira página. Não há também nenhum editorial, entre uns 15, que falasse da visita. Ocupamos metade da página cinco com uma foto, onde a Presidente dizia querer o comércio entre os países chegando a US$10,0 bilhões em cinco anos, uma excelente e louvável meta.

Foi criado um grupo de trabalho para estudar a integração ferroviária, que a meu ver, pela importância do tema, deveria ter sido criado há três anos, e nesta visita já assinarem as obras. De papel mesmo, três convênios de cooperação: na área de meio ambiente, trabalhista e em comunicações (para que populações fronteiriças não paguem ligações internacionais) além de ajudá-los na instalação de farmácias populares. Com base no jornal de Lima, achei uma agenda sem grande destaque, talvez por isto fugiu da primeira página. Torço para ter sido enganado pelo jornal. Há enganos que são gostosos.

Segue o evento, e entre as apresentações dos economistas, uma foi mortal. Mostrava indicadores aceitos internacionalmente sobre reformas feitas nos países, visando torná-los mais competitivos. A comparação era entre 2009 e 2013 e, entre uns 20 a 30 países, piores que nós, apenas Bolívia e... Venezuela, este lindo país, mas em triste retrocesso graças às "chaves maduras".

Continuam aparecendo dados de crescimento econômico e desenvolvimento, e também estamos mal na tábua comparativa. A mensagem é a de que os emergentes passaram a ser diferentes, e estas diferenças devem ser observadas pelos investidores, e para nossa tristeza, perdeu-se em parte o encanto com o Brasil, fomos para segunda divisão da América do Sul.

Mas... porque este conto se refere a operação Jorge Chávez?

Sou curioso com estas coisas, li que o nome do "Aeropuerto Internacional Jorge Chávez" em Callao, servindo Lima, é uma homenagem a um engenheiro e aviador nascido na França em 1887, filho de peruanos, que foi o primeiro a cruzar os Alpes em 1910, mas sofreu avarias, se acidentou no pouso e morreu quatro dias após.

Sua história, o jantar e a experiência no Peru me trouxeram o Brasil. Decolamos, subimos, passamos, entramos na moda, mas... descemos, pousamos e paramos. Não tão drasticamente como o aviador Jorge Chávez, espero e... os próximos anos dirão.

Para acabar o conto e partirmos temporariamente do Peru, um pouco de humor... Ao simpático, idoso e educado taxista que me conduzia ao aeroporto, quase noventa minutos de aprendizado da história peruana, perguntei sério, para sentir sua reação: Este Jorge Chávez do aeroporto foi parente do falecido Hugo, "acá del nuestro país vecino"? Ele prontamente me respondeu: "no... no... no... pelo amor de Dios, no".


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