Engenheiro agrônomo e mestre em solos e nutrição de plantas pela ESALQ-USP. Com atuação profissional desde 1985 em pesquisa e desenvolvimento em sistemas de produção agrícola em empresas nacionais e multinacionais, trabalhou por 24 anos na geração dos principais herbicidas para pastagens hoje no mercado. Atualmente, é consultor independente, fundador da NTC ConsultAgro, focado no manejo da vegetação em pastagens, reflorestamentos e áreas não agrícolas.
Foto: Scot Consultoria
Agosto é um mês crucial de decisão para muitos pecuaristas, em relação ao que fazer em algumas de suas pastagens. Alguns pastos estão degradados, muito infestados por plantas daninhas, e na grande maioria dos casos a opção de manejo recai sobre a renovação da pastagem.
Nesse artigo discutiremos aspectos de identificação do nível de degradação das pastagens, e se necessariamente devemos ir para o extremo da renovação, ou se podemos optar por uma solução bem mais acessível, rápida e econômica: a recuperação.
O tema Renovação x Recuperação de pastagens tem sido foco recente e recorrente de diversos trabalhos em publicações e palestras em eventos do setor, sempre abordado de forma muito feliz pelos autores e palestrantes, que dão uma visão holística e abrangente do problema. Meu interesse em reforçar esse tema aqui, frequente como disse, é enfatizar esse problema sob a ótica das plantas daninhas, logicamente sem esquecer os demais importantes fatores relacionados.
Em 2003, o pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, Moacyr Bernardino Dias Filho, reportava que 60% ou mais das pastagens do país apresentavam algum nível de degradação. Hoje, em 2020, esse quadro não parece ser muito diferente disso e esse parece ser um círculo vicioso, o X da questão, que determina a baixa produtividade média da pecuária de corte no Brasil, da ordem de 4,5@/ha/ano.
A partir do momento que se principia a exploração de uma pastagem implantada, inicia-se também sua degradação, e caso não haja intervenções corretivas no decorrer do tempo, a deterioração vai se intensificando, até um caminho sem volta, que leva à necessidade da sua renovação, ou reforma, como alguns se referem.
A degradação da pastagem se dá por diversos fatores. O mais rápido e de maior impacto se dá pelo erro de pressão de manejo, principalmente com o super pastejo, que leva a eliminação da população de forragem, não permitindo sua recuperação adequada entre ciclos de pastejo, seja pelo corte abaixo das gemas de rebrote das touceiras, seja pelo pisoteio excessivo. Esse fator leva à compactação do solo e deterioração geral da população de plantas forrageiras, criando falhas e solo exposto, que leva a um segundo problema, a proliferação das plantas daninhas nas áreas de solo desnudo.
O pecuarista pode ter sempre como regra: se errou na pressão de manejo, consequentemente permitiu a infestação por plantas daninhas. Isso causa muitas frustações, porque mesmo o pecuarista tendo um histórico de bom combate das invasoras, caso haja erro na pressão de pastejo, o pasto infesta como se nada tivesse sido feito antes.
Quem me conhece sabe que digo com frequência: o capim é o melhor herbicida para a pastagem. Havendo cobertura de solo e boa população de plantas forrageiras, não se cria o ambiente propício ao aparecimento das invasoras, pois as daninhas estão lá, no solo, com suas sementes dormentes, prontas a germinarem na primeira ocasião favorável ao seu desenvolvimento.
Outro fator capital que leva à degradação da pastagem é a não reposição dos elementos essenciais ao adequado desenvolvimento da forrageira, ou adubações de manutenção, principalmente os macronutrientes que vem da calagem (cálcio e magnésio), da gessagem (cálcio e enxofre) e das adubações NPK. Nosso mestre Dr. Moacyr Corsi não cansa de enfocar a importância das adubações nitrogenadas a cada ciclo de pastejo em áreas intensificadas, dada à resposta que se observa na produtividade da pastagem.
A não adequada cobertura do solo também leva a outro problema, que é a erosão, que se inicia de forma laminar, evoluindo para sulcos e culminando com as voçorocas. Vamos lembrar que o ponto zero da erosão se dá com o impacto da gota de chuva no solo desnudo, desestruturando os agregados que o compõe, permitindo o arraste de suas partículas constituintes na água que corre superficialmente.
Secundariamente, podemos citar como fatores de degradação das pastagens o ataque por pragas, como cigarrinhas, percevejos, lagartas desfolhadoras, e mais raramente gafanhotos; e doenças como ataque por fungos, e até a temida morte do braquiarão, ainda não bem caracterizada.
Dos fatores mencionados, indicaria a erosão e a perda da população da forrageira de interesse como os fatores intransponíveis que levariam à necessidade de renovação da pastagem. Plantas daninhas e problemas de fertilidade do solo não são motivos para tal, e aí recai a opção pela recuperação.
Identificada a área com baixa produtividade, o primeiro passo é quantificar a população remanescente de forrageira e se ela se encontra minimamente apta a cobrir o solo caso as condições adversas sejam eliminadas. Como dica prática, deve-se ter em média de 2 a 3 plantas de capim por m2, e não haver muitas manchas superiores a 2 a 3 m2 sem a presença de forragem, que dificultará o fechamento da área. Uma alternativa a esse problema, para não recorrer à renovação, seria a distribuição de sementes a lanço pela área, principalmente nas manchas sem capim. Mesmo não sendo incorporadas ao solo, o que seria ideal, algumas sementes germinarão e repovoarão as clareiras de solo aberto, principalmente no início da primavera, quando se estabilizaram as chuvas.
Outra ação inicial é fazer a amostragem e a consequente análise do solo, que identificará as necessidades de calcário, que seguramente existirão, e as posteriores correções com fertilizantes, principalmente fósforo e potássio, ou só o fósforo. O nitrogênio, ou o nitrogênio com o potássio, vem posteriormente em cobertura, também na primavera, estabelecido o regime de chuvas.
A calagem pode ser feita no período seco, em superfície, sem a necessidade de incorporação. A incorporação do calcário é desejável, mas como não vamos trabalhar mecanicamente o solo, não há problema. Façamos sua aplicação ainda assim, pois o benefício será marcante. A mesma aplicação ocorre em agricultura, no sistema de plantio direto na palha, onde o solo não é revolvido e se faz calagem em superfície.
Logicamente, nesse processo de avaliação das condições da forrageira e da coleta de solo para análise química, se faz o levantamento das espécies de plantas daninhas presentes, sua distribuição e nível de infestação. Desse levantamento se montará a estratégia de controle, e aí as soluções em termos de combinações de produtos e técnicas de controle podem chegar às dezenas, e só um técnico capacitado poderá propor a melhor solução, ou quase sempre, as melhores opções, porque normalmente não há uma única resposta correta para um dado problema relativo ao controle de plantas daninhas em pastagens.
Podemos imaginar que a diversidade nesse ambiente é bastante grande, e espécies de fácil e difícil controle coexistem no mesmo ambiente. Ocorrendo isso, uma boa opção é realizar o controle foliar em área total no início da primavera/verão, não pensando num tratamento herbicida para as plantas de mais difícil controle, mas sim direcionado às plantas de médio e fácil controle, desde que presentes em maior quantidade, o que na maioria das vezes ocorre. Posteriormente, após estabelecido o resultado desse tratamento inicial, que sabidamente não controlará as plantas de difícil controle, se faz então o controle localizado das espécies remanescentes. Esse controle, num segundo momento, pode ser feito ainda no fim do verão, mas normalmente vai ocorrer no início da próxima estação chuvosa, de forma foliar localizada, ou no outono/inverno de forma basal, sem corte, ou no toco, com corte de plantas lenhosas. Essa técnica de controle em dois momentos, foliar em área total no período chuvoso, seguido de catação das plantas remanescentes no toco, ou basal, no período seco, ou foliar localizado nas próximas águas, se chama “manejo de controle”.
Utilizando o manejo de controle em dois momentos os custos podem ser mais bem equacionados e as recomendações de herbicidas mais precisas, em função das espécies infestantes. Não se preocupe em querer limpar a pastagem na primeira aplicação. Nesse primeiro momento a competição com as plantas daninhas será reduzida drasticamente, e na segunda fase se conclui o processo, normalmente tratando um número bem menor de plantas do que se fizesse essa operação antes da aplicação em área total.
Como fechamento para o sucesso desse processo de recuperação em detrimento da renovação, deve-se esperar um período de regeneração, ou repouso da pastagem, após a aplicação de herbicidas e correção química do solo no início das águas. O pasto se encontrava totalmente debilitado pela competição com as plantas daninhas e falta de nutrientes, e é preciso que a pastagem se restabeleça adequadamente para que se iniciem ciclos de pastejo. O tempo para que isso ocorra será muito variável, a ser estabelecido caso a caso, mas de modo geral, após 60 dias a pastagem normalmente já se encontra em condições de uso. A partir daí é só caprichar no manejo do gado, estando atento à pressão de pastejo para não incorrer nos erros mencionados no início de nosso artigo.
Considerando que os custos de renovação da pastagem giram em torno de R$1,2 mil a R$2,4 mil/ha, dependendo do nível tecnológico adotado pelo pecuarista, a opção pela recuperação será bastante menor, com valor de grande amplitude em função do desafio a ser enfrentado, mas pode-se esperar que dificilmente ultrapasse R$500,00 a R$700,00/ha, incluindo-se todos os custos com insumos e mão de obra.
O valor menor por si só já poderia bastar, porém outro ponto que se deve considerar é o menor tempo sem utilização do pasto. Na renovação, desde o início, com as operações de aração e gradagem, plantio, até a efetiva utilização do pasto, podem decorrer de 5 a 6 meses. Na recuperação esse período sem pastejo é essencialmente o de repouso para recuperação da pastagem, como dito, da ordem de dois meses; então, esses 3 a 4 meses de diferença devem também fazer parte das contas do pecuarista, avaliando o quanto esses meses representam no retorno em sua atividade na produção de carne, leite ou crias.
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