Engenheiro agrônomo, formado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo, com mestrado e doutorado pela mesma universidade. É pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste e especialista em nutrição animal com enfoque nos seguintes temas: exigência e eficiência na produção animal, qualidade de produtos animais e soluções tecnológicas para produção sustentável.
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O mundo assiste um grande aumento de interesse pela pauta ambiental e, mesmo com toda a urgência da pandemia, ela tem sido colocada na agenda dos governos, das populações e dos sistemas produtivos. Remanescentes naturais preservados e áreas de conservação bem cuidadas não são um luxo dispensável, mas fatores essenciais para a manutenção de um ambiente minimamente equilibrado e/ou que sejam capazes de se recuperar nos momentos de algum desequilíbrio.
Tanto a manutenção do equilíbrio ou sua retomada após uma perturbação, natural ou não, ocorrem porque a natureza presta diversos serviços ecossistêmicos (SE), como a regulação climática, a produção de águas, o controle biológico e muitos outros.
Apesar de todos dependerem desses serviços ecossistêmicos, não há ninguém mais dependente deles do que o produtor rural e sua “indústria a céu aberto”. No contexto da unidade produtiva, quando sob a responsabilidade e interferência de um proprietário, o serviço ecossistêmico passa a se chamar serviço ambiental. Hoje, há até estimativas de seu valor monetário e uma lei, esperando aprovação presidencial e posterior regulamentação, de pagamentos por serviços ambientais (PSA).
O grande desafio é achar fontes de recursos para que o PSA se materialize. Remunerar os agropecuaristas por PSA seria um grande avanço e facilitaria muito termos avanços na preservação e conservação do ambiente, especialmente no que tange aos pequenos e médios proprietários, em geral menos capitalizados e, portanto, com mais dificuldades para arcar com custos necessários para uma boa governança ambiental.
Esse texto traz uma sugestão para juntar lazer, gastronomia, cultura, natureza e agropecuária para tentar fazer-nos uma potência turístico-agroambiental, com benefícios para todos os envolvidos e a sociedade em geral.
O turismo rural no Brasil já é uma realidade, com excelentes opções e casos de sucesso. A proposta aqui seria, sem prejuízo para o que já existe, fomentar uma aliança entre vários setores e fazê-la em uma escala inédita, tão grande quanto o próprio Brasil, com o intuito de gerar um fundo para o pagamento de serviços ambientais.
Algumas ideias:
- Seria interessante um projeto nacional, mas com foco no município. As esferas federal e estadual ajudariam com recursos financeiros para facilitar a adesão ao programa. O município ficaria responsável pelo funcionamento.
- Os municípios mobilizariam os agentes privados ligados à hospedagem, serviços e ao turismo em geral, bem como proprietários rurais com interesse em participar, abrindo suas porteiras aos turistas.
- Empresas privadas poderiam apoiar o projeto, em troca de associar seu nome a um projeto que oferece novas opções de lazer, mas, ao mesmo tempo, ajudando a produção sustentável de alimentos e a defesa e boa conservação do ambiente.
- Os supermercados e demais varejistas de alimentos poderiam ser apoiadores ativos do projeto, não só com apoio financeiro, mas, principalmente, sendo promotores da iniciativa, tanto por sua capilaridade, como porque são, de fato, o ponto de encontro entre o produtor (ou a agroindústria) com a população em geral.
- A sociedade civil (ONGs, Sistema “S”, associações, etc.) poderia também aderir, tanto diretamente como em questões de aprimoramento dos envolvidos como, por exemplo, treinamento de guias para as visitas, desenvolvimento de opções especiais de turismo agroambiental (exemplos: excursões escolares, excursões para pessoas com deficiência etc.).
- Cooperativas agrícolas e congêneres podem participar no apoio, mas também como opções de visita, especialmente no caso de processos de produção de alimentos ou outro processo que possa causar curiosidade para turistas com interesse no rural.
Basicamente, o programa pode ter um funcionamento bem simples. O interessado contrata o passeio com o selo “Turismo-agroambiental” (TAA). No valor pago, ficaria destacado um pequeno valor fixo que seria destinado ao fundo ambiental, tanto para remuneração de PSA, como para ajudar na regularização ambiental de pequenos e médios produtores. Os prestadores de serviço também contribuiriam com uma alíquota, também baixa, para o mesmo fundo e, se necessário, para a promoção do programa de TAA.
Os prestadores de serviço tanto podem ser empresas e profissionais já da área do turismo, como os próprios produtores rurais que tenham estrutura de hospedagem, o que pode ser incentivado pelo TAA, ou seja, construir ou viabilizar a hospedagem na própria propriedade.
Os interesses para as visitas podem ser os mais variados, desde o simples contato com o ambiente rural, estar mais perto da natureza, ter interesse em como os alimentos são produzidos, conhecer a cultura e gastronomia rural, que seriam os mais óbvios. A esses, podem se somar oportunidades de interesse mais específico, como o turismo técnico, quando o interesse é aprender algo novo a ser replicado. Outro turismo alternativo poderia ser o interessado em ter alguma experiência de trabalho rural, como a colheita de uvas ou cuidar de um bezerreiro.
Talvez, especialmente no início, seria recomendado estimular o turismo de final de semana, atraindo a população urbana mais próxima dos locais de visitação. Com o engajamento de patrocinadores privados, tentar fazer esse turismo oportunizar aos participantes concorrerem a prêmios, dentro de um programa de fidelização. Por exemplo, quanto mais vezes a pessoa fizesse turismo dentro do programa, maiores as chances dela ser premiada.
Ainda nessa linha de premiação, os supermercados e varejistas que participassem, poderiam dar, como prêmios aos seus fregueses, excursões do TAA.
Como vantagens, podemos citar:
1) Levantamento de recursos da sociedade em geral para o PSA e regularização ambiental;
2) Transferência de renda da cidade para o campo, podendo beneficiar especialmente médio e pequenos produtores;
3) Geração de oportunidades de emprego, desde com baixa necessidade de capacitação até profissionais altamente especializados;
4) Possibilidade de aproveitamento de capacidade ociosa de hospedagem, bem como do trabalho de várias entidades que já atuam nos setores da indústria, comércio e produção rural (por exemplo, Sistema S, universidades);
5) Melhorar o conhecimento da realidade rural por pessoas do meio urbano;
6) Estímulo para mais produtores aderirem às boas práticas de produção e à regularização ambiental, de modo a participarem do programa;
7) A combinação das duas últimas vantagens acima é o aumento de transparência do setor para com seus consumidores e a população em geral;
8) Outra vantagem desse programa seria que ele pode atender públicos dos mais variados níveis sociais ou de poder aquisitivo;
9) Por ser um programa que visa ajudar o ambiente, há grande chance de atrair voluntariado, o que seria muito interessante para reduzir custos e, possivelmente, melhorar a qualidade. Um programa para aposentados que poderiam ajudar no programa, compartilhando sua experiência e sabedoria;
10) Outra opção que poderia juntar passeio, diversão e voluntariado poderia ser a organização de mutirões como, por exemplo, de plantio de árvores em áreas de recuperação ambiental.
A situação atual, de um ano de mobilidade reduzida pela pandemia do covid-19 e um grande número de pessoas sem emprego deixam ainda mais oportuna a realização desse programa. Seria, em tese, possível planejá-lo o quanto antes para que, logo na volta da vida sem essas restrições, fosse possível ser lançado, aproveitando o provável desrepresamento da demanda reprimida por novas aventuras turísticas.
Trata-se de uma oportunidade excelente para uma ampla soma de esforços coletivos de toda a sociedade que aumentaria a conexão entre os brasileiros do campo, grandes fornecedores de alimentos e bens diversos, e o brasileiros das cidades, grandes consumidores dos primeiros. Todos, contudo, dependentes de um ambiente saudável e menos imprevisível.
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