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Scot Consultoria

Dez perguntas sobre consumo (de quase tudo) de bovinos


Quarta-feira, 1 de setembro de 2021 - 11h00

Engenheiro agrônomo, formado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo, com mestrado e doutorado pela mesma universidade. É pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste e especialista em nutrição animal com enfoque nos seguintes temas: exigência e eficiência na produção animal, qualidade de produtos animais e soluções tecnológicas para produção sustentável.


Foto: Scot Consultoria


O consumo é um dos aspectos mais determinantes da produção animal. É, também, um dos assuntos em que existem as maiores dúvidas, alguns mitos e respostas contraintuitivas. Abaixo, um painel que junta algumas das perguntas mais comuns, desde o consumo de suplemento mineral até o de água.

1) O bovino consome os minerais até satisfazer suas exigências?

Apesar de, por vezes, ainda alguém reviver a teoria da “sabedoria nutricional” do animal, infelizmente, isso não acontece. Segundo essa teoria, o bovino, tendo acesso a um cocho provido de subdivisões, em que cada uma delas tivesse um mineral, ele lamberia cada uma dessas fontes na medida exata das suas exigências. Na realidade, o único mineral que, inequivocamente, os animais procuram avidamente é o sal comum (cloreto de sódio). Exatamente por isso, o sal comum é o motivador do consumo e os demais vão de arrasto. Por isso, ele é usado como referência, considerando que o animal consome até a exigência desse mineral ter sido atendida, o que, apesar de poder ocorrer ou não, é o que nos resta para formularmos as misturas minerais e, na média, parece funcionar relativamente bem.

2) A ureia, quando adicionada a um sal mineral para fazer um sal ureado, controla o consumo?

A inclusão da ureia pode ajudar a alterar o padrão de consumo dos animais do suplemento, em geral sem reduzir o consumo diário, por um aumento no número de visitas ao cocho. A crença de que ela pode restringir o consumo é perigosa, pois ingestão elevada de ureia (mais do que 30-40 g/100kg de PV) pode causar intoxicação e risco de morte. Não custa lembrar, inclusive, que deve ser feita adaptação dos animais ao sal com ureia, com consumo de 1/3 da dose na primeira semana e 2/3 na segunda, diluindo-o com um sal mineral sem ureia.

3) O teor de sal comum garante o correto consumo do proteinado?

A quantidade de inclusão do sal comum nos proteinados é muito maior do que a necessidade para as exigências de sódio, mas a função mais importante dele nesse tipo de suplemento é reduzir a taxa de ingestão pelos animais, ajudando para que todos os animais consigam sua vez de chegar ao cocho e consumam o produto. Conseguir o consumo-alvo de um proteinado, na pinta, acaba sendo um evento raro. O importante é que esteja mantendo o valor mais próximo possível da média planejada. No caso de subconsumo, pode-se reduzir o teor de sal comum na fórmula e vice-versa, caso o objetivo seja reduzir o consumo. Todavia, se reduzir muito o teor de sódio, podemos ficar sem o efeito de redução de taxa de consumo. Assim, uma alternativa para controlar o excesso de consumo sem reduzir o sódio é a colocação de uma quantidade fixa por um número determinado de dias, digamos três, e a não reposição no terceiro dia, mas só no dia seguinte. Para evitar que animais submissos do lote fiquem sem sua parte do consumo, deve-se atentar para a disponibilidade linear do cocho e aumentar se notar muita competição entre os animais.

4) A suplementação concentrada em pastagem pode ser controlada?

Quando se usa quantidades maiores de concentrados para suplementar animais em pastagem, como em semi-confinamentos ou confinamento em pastagem, ao contrário do proteinado, não há sal comum que chegue. Nesse caso, o que resta ao produtor é dar espaço de cocho para que todos os animais consigam comer ao mesmo tempo, pois somente assim podemos ter a esperança de que cada um dos animais coma exatamente a parte que planejamos a eles.

5) O bovino consome mais silagem do que feno?

A característica do alimento que mais interfere no seu consumo de matéria seca (MS), desde que ele não tenha algum outro fator anticonsumo, é sua digestibilidade. Agora, consideremos uma gramínea que foi colhida com 80 dias de crescimento, e que metade dela ensilamos e a outra metade foi transformada em feno. Em seguida, a silagem e o feno são oferecidos a dois lotes de animais idênticos, um em cada piquete. Depois de alguns dias, o consumo médio de cada um dos piquetes é avaliado, com a silagem com consumo de 33,33 kg/cabeça/dia e o feno de 11,11 kg/cabeça/dia. Para um leigo em nutrição de ruminantes, a resposta estaria clara e com larga vantagem para a silagem. Ocorre que, para ruminantes, em questão de nutrição, nós desconsideramos a água, pois ela é muito variável em importantes fontes alimentares, especialmente nas forragens e outros volumosos. Nesse caso, sendo os teores de MS, respectivamente, para silagem e feno, de 27% e 81%, temos que a quantidade de MS é exatamente a mesma, ou seja, 33,33 kg/cabeça/dia X 27/100 = 9,00 kg de MS, assim como 11,11 kg/cabeça/dia X 81/100 = 9,00 kg de MS. Portanto, em geral, a maior parte da variação de consumo entre feno e silagem costuma mesmo ser o teor de MS. Nesse caso, o consumo foi igual, pois tanto a silagem como o feno eram de uma mesma planta e o que contou para determinar seu consumo foi sua digestibilidade. Nessa consideração, assume-se, também, que o processo de fermentação da silagem foi bem-sucedido, pois, quando não, compostos secundários de fermentação subótima podem reduzir a ingestão das silagens.

6) Existe um teor de MS ideal da dieta para consumo?

Não existe esse valor para teor de MS ideal para consumo, pois, para o animal, o que conta é a MS ingerida, como no exemplo acima.

7) Um bovino em pastagem pode apresentar consumo voluntário, isto é, comer até perder a vontade?

Sim, ele pode, mas isso costuma não acontecer, ou seja, em pastagens a regra é o animal não consumir tudo o que desejaria. Um dos parâmetros sugeridos, no qual ocorreria o consumo voluntário, seria a oferta de forragem maior do que três vezes o consumo voluntário do animal, o que só acontece em pastos com muita massa e baixas lotações. Nessa situação é tão grande a quantidade de forragem que, por facilidade de apreensão da forragem e pela maior possibilidade de seleção das partes mais nutritivas das plantas, o animal pode comer até atingir sua exigência energética e perder o interesse em continuar pastejando.

8) Quanto mais consumo, mais o animal ganha peso?

Essa é aquela pegadinha, que todo mundo vota “sim”, mas que só é verdade se for comparando o mesmo alimento ou a mesma dieta. Um bom exemplo são dietas “quentes” de confinamento, ou seja, dietas com predomínio de concentrados. Quanto mais usamos concentrado, que tem maior teor de energia do que os volumosos, mais rapidamente o animal atingirá sua necessidade energética, pois precisa cada vez menos alimento para que isso ocorra, ou seja, com menor consumo.  

9) O animal cresce porque come ou come porque cresce?

Outra pegadinha: a maior parte das pessoas escolhe a opção “cresce porque come”, pois ela está na ordem lógica dos processos, ou seja, o animal primeiro come e depois, com os nutrientes, cresce. Todavia, várias informações científicas mostram que é o crescimento do animal que é o “puxa” da ingestão de alimentos. Tive um bom exemplo disso no meu experimento de doutorado: o suplemento usado como tratamento reduziu a gordura do leite e, portanto, uma das respostas possíveis seria que as vacas tratadas teriam menor necessidade de consumo, afinal a gordura é o componente mais energético do leite. Todavia, a resposta das vacas tratadas foi aumentar a produção de leite em volume, mas exatamente na quantidade que resultou no mesmo gasto de energia para o menor volume com mais gordura das vacas controle. Enfim, o consumo de matéria seca foi o mesmo, comprovando a tese segundo a qual o animal come em função das suas exigências e não o contrário.

10) Qual o consumo recomendado de água para um animal?

O consumo recomendado de água para um animal é que ele beba toda a quantidade que tenha vontade. Simples assim. Especialmente em um país tropical como o Brasil devemos ter cuidado, pois a água é fundamental não só por questões nutricionais, mas porque ela tem um importante papel na regulação térmica e em aliviar o estresse calórico principalmente pelo processo de sudorese. Quanto mais quente, mais água o animal perde pelo suor e mais sede ele terá. É uma grande lástima quando o desempenho animal é limitado por falta desse atendimento tão básico. O importante é reconhecer a importância da água e ficar de olho em oferecê-la em abundância aos animais.

Esperamos que alguma dessas informações sejam úteis e/ou que ajudem a uma melhor compreensão do consumo nas várias dimensões e aspectos aqui abordados. O importante é sempre estar atento ao consumo e se perguntando se tudo o que pode ser feito para obter os melhores resultados está sendo feito, afinal, o sucesso do animal depende muito dele.


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