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Scot Consultoria

Perdas e desperdício de alimentos no Brasil e no mundo


Quinta-feira, 30 de setembro de 2021 - 11h00

Alcides Torres é Engenheiro agrônomo, formado pela Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ, da Universidade de São Paulo, é diretor-fundador da Scot Consultoria. É analista e consultor de mercado, com atuação nas áreas de pecuária de corte, leite, grãos e insumos agropecuários. É palestrante, facilitador e moderador de eventos conectados ao agronegócio. Membro de Conselho Consultivo de empresas do setor e coordenador das ações gerais da Scot Consultoria.

Amanda Skokoff é médica-veterinária pela Universidade de São Paulo - USP, Campus Pirassununga.


Foto: Shutterstock


Artigo originalmente publicado no Broadcast Agro, da Agência Estado, em 27/09/21

Introdução

Em 29 de setembro se comemora o Dia Internacional da Conscientização sobre o Desperdício Alimentar, e em função disso chamar a atenção sobre os desafios para a minimização de perdas e desperdícios nas cadeias produtivas de alimentos vem a calhar.

Contexto

Segundo dados projetados pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), até 2050 a produção de alimentos precisará crescer de 60% a 70% para atender a uma população de 9,8 bilhões de pessoas. Diante desse cenário, foram levantados questionamentos relacionados à capacidade da cadeia produtiva de alimentos suprir essa demanda.

Os incrementos tecnológicos no campo resultaram em maior produtividade, entretanto, segundo levantamento realizado pela FAO, um terço do alimento produzido mundialmente é desperdiçado. Acredita-se que com a redução de perdas e de desperdícios na cadeia, o aumento na produção de alimentos para suprir a demanda projetada para 2050 não precise ocorrer em grande escala.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), de 2013 a 2018 houve um aumento na insegurança alimentar no Brasil.

Ainda, segundo pesquisas realizadas pela VigiSAN, vigilância sanitária, de 2018 a 2020 esse aumento se deu de maneira ainda mais expressiva. Em 2020 no Brasil apenas 44,8% da população se encontrava em situação de segurança alimentar, ou seja, grande parcela da população não tinha acesso a alimentos seguros.

Em 2015 a ONU propôs para os países membros uma agenda, estabelecendo metas para um desenvolvimento sustentável até 2030. Alguns dos objetivos foram desenvolvidos para que todos tenham acesso a alimentos seguros, para que se reduza pela metade o desperdício de alimentos per capita, e haja redução das perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento.

Combater o desperdício de alimentos é um atalho para atingir a oferta de alimentos que será consumida futuramente, concomitantemente com os objetivos de desenvolvimento sustentável.

Perdas do campo ao atacado

As perdas associadas ao processo produtivo estão presentes em toda a cadeia, com os envolvidos até mesmo antes do processo de plantio.

Um relevante gargalo observado no campo está associado à aptidão agrícola. A falta de conhecimento técnico para o uso e manejo adequado do solo resulta em menor produtividade e baixo rendimento.

Ainda, a falta de capacitação da mão de obra gera elevadas perdas resultantes das dificuldades em se adequar às técnicas de colheita e ao manuseio excessivo e inadequado de produtos, entre outros fatores.

Após a colheita, destacam-se as questões associadas ao armazenamento e embalagem. O armazenamento em temperatura e umidade inapropriadas, armazenagem simultânea de produtos incompatíveis com os alimentos e uso de embalagens inapropriadas, resultam em danos e perdas.

Outro ponto de impacto é o transporte. A falta de logística, estradas mal pavimentadas, transportes rudimentares, sem refrigeração ou com superlotação de carga, afetam a qualidade final do alimento.

Portanto, informar todos os elos da cadeia, estabelecendo conexão e interação entre eles, resultará em menores perdas no processo produtivo. A evolução da agroindústria 4.0 com soluções tecnológicas inteligentes também validam e asseguram a qualidade do produto, mas para se obter êxito, qualificar e treinar a mão de obra é essencial.

Perdas e desperdícios, do mercado atacadista ao consumidor

Segundo estudo realizado pela Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS) em 2014, as perdas no varejo brasileiro sobre o faturamento se equiparavam ao lucro das empresas. Em 2020 houve uma evolução nesse sentido e as perdas foram reduzidas, no entanto, estima-se, ainda representa R$ 7,6 bilhões.

Para esse elo da cadeia as maiores perdas estão relacionadas às embalagens e manuseio dos produtos. Em um comparativo realizado entre a produção tradicional e a de produtos orgânicos foi possível avaliar que na produção tradicional 5,5% das vendas foram perdidas, e para os produtos orgânicos esse número foi de 1%, isso ocorreu porque os produtos orgânicos estavam adequadamente embalados e manuseados minimamente.

Um segundo ponto de atenção está na validade dos produtos. Em levantamento realizado pela ABRAS, foi observado que 37,4% das perdas para produtos perecíveis e 42,5% das perdas para produtos não perecíveis aconteceram por causa de prazo vencido.

Nesse sentido, um dos trabalhos elencados para ser feito junto ao governo é de buscar alternativas na legislação para que, embora o produto esteja vencido, se não está impróprio para o consumo, esteja liberado para o aproveitamento humano. Um exemplo citado é o modelo best before, que aborda o “consumir antes de”, onde o produto até certa data pode ter perdido algumas características nutricionais e sensoriais, mas ainda é seguro para ser consumido.

Nesse cenário o consumidor também desempenha papel fundamental. A compra e consumo consciente geram redução no desperdício de alimentos e geração de resíduos.

Bancos de alimentos

Em 2020 os bancos de alimentos alimentaram aproximadamente 3 milhões de brasileiros através da distribuição de cestas básicas e refeições prontas. A origem dos alimentos distribuídos para a população tem diferentes doadores.

Os bancos de alimentos precisam, no entanto, serem fortalecidos para continuarem prestando esse serviço, para isso são necessárias mais ações e políticas públicas voltadas a esse fim. A lei no. 14.016, sancionada em 24 de junho de 2020, regulamenta a doação de alimentos e fundamenta o trabalho realizado pelos bancos de alimentos.

Ainda, fortalecer a cultura da doação e responsabilidade social corporativa também impacta na destinação adequada de produtos aptos ao consumo e que seriam condenados ao descarte.

Considerações finais

O trabalho a ser desenvolvido para a redução das perdas e desperdícios na cadeia de alimentos deve ser atribuído a todos os elos. A conscientização sobre o impacto e papel desempenhado por cada parte na produção sustentável de alimentos e segurança alimentar tem papel fundamental na melhoria do cenário atual.

Conjuntamente o estabelecimento de propósitos de toda a cadeia, maiores investimentos em pesquisa, políticas públicas e conselhos curadores, são fundamentais para desenvolver e perenizar estratégias de redução da perda e desperdício de alimentos.


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