Advogado (OAB/MS 16.518, OAB/SC 57.644) e Professor em Direito Agrário, Ambiental e Imobiliário. Comentarista de Direito Agrário para o Canal Rural. Organizador e coautor de livros em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio. É membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA) e membro das comissões de Direito Ambiental e Direito Agrário da OAB/SC. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. Doutorando em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Desenvolvimento Local (2019) e Graduado em Direito (2008) pela Universidade Católica Dom Bosco.
O objetivo do presente texto é abordar a situação dos imóveis rurais demarcados como terras indígenas tradicionalmente ocupadas e a possibilidade de indenização por benfeitorias realizadas na propriedade.
A legislação não possui previsão de indenização às terras demarcadas como tradicionalmente ocupadas por indígenas, e somente em alguns casos são indenizadas benfeitorias.
Isto porque, juridicamente seria aberto um precedente para considerar a existência de uma desapropriação indireta por parte do Estado em favor daquele que teve suas terras demarcadas como sendo indígenas, uma situação que só acontece em casos excepcionais. A desapropriação indireta não seria admitida nestas situações, por algumas razões.
A primeira delas porque as áreas demarcadas, após todo estudo e instrução do processo, apontaria para situação em que a propriedade particular um dia teria sido de índios que foram expulsos, portanto, estaria no interior de terras indígenas tradicionalmente ocupadas, ou seja, teriam sempre pertencido à própria União Federal, nos termos do art. 20, XI, da Constituição Federal.
Consequentemente, não teria havido esbulho de propriedade particular, nem ato ilícito da Administração Pública, nem desapropriação indireta, não cabendo a desapropriação indireta e indenização pelo valor da terra nua.
Neste raciocínio, presume-se a existência de prévio e regular processo administrativo, no qual são realizados estudos de natureza fundiária, antropológica, sociológica, cartográfica, etno-histórica, jurídica e ambiental, bem como garantidos o contraditório e a ampla defesa, tudo em consonância com o Decreto 1.775/1996, cabendo discussões nestas situações.
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.097.980/SC, já decidiu que a regular demarcação de terras indígenas tradicionalmente ocupadas, nos termos do artigo 231 da Constituição Federal, não possui natureza de desapropriação indireta.
Já no caso de benfeitorias indenizáveis, apenas cabe pagamento daquelas benfeitorias consideradas de boa-fé, como determina do § 6º do artigo 231 da Constituição Federal. Portanto, é necessário comprovar a boa-fé daquele que possuiu e edificou sobre o imóvel rural demarcado.
De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, no Mandado de Segurança 4810 julgado em 1997, deveria o possuidor de boa-fé, em ação própria, provando o seu domínio, depois de concluído o processo de demarcação, solicitar a indenização, reforçando a necessidade de realizar laudos periódicos de avaliação de benfeitorias.
A Fundação Nacional do Índio (Funai) publicou orientações neste sentido, com relação ao pagamento das benfeitorias derivadas de ocupação de boa-fé em terras indígenas.
A Instrução Normativa (IN) nº 2/2012, entrou em vigor no dia 06/02/2012, orientando o que seria caracterizado boa ou má-fé, os critérios utilizados para indenização, além de estabelecer uma fase de recurso, com prazos definidos.
Segundo a normativa citada, somente seria autorizado pagamento de benfeitorias implementadas no período da boa-fé, aquele da publicação da portaria do Ministério da Justiça que declara que a terra é indígena, sendo que a caracterização de má-fé pode ser verificada antes mesmo da portaria declaratória.
Um exemplo de má-fé é o fato de o ocupante saber que a área se tratava de terra indígena e, ainda assim, ter se apossado dela. Outro motivo é a posse violenta. Ou ainda a ocupação que tenha resultado em degradação ambiental.
Por isso, no caso de desmatamentos, a Funai exige a apresentação das licenças fornecidas pelos órgãos competentes. Se for constatado o dano ambiental, esse dano será quantificado e compensado pelo valor que o ocupante teria a receber pelas benfeitorias.
A instrução normativa também determina pagamento das benfeitorias por seu valor de mercado e quando não for possível avaliar por preço de mercado, será utilizado o método de reedição da benfeitoria, que é o cálculo do valor pelo material usado para sua construção, depreciado de acordo com o estado de conservação. A Funai não paga lucros cessantes ou expectativa de valorização.
Portanto, conforme temos orientado há alguns anos, já é passado o tempo de verificar os cadastros obrigatórios da propriedade rural e documentar periodicamente as informações de produtividade do imóvel rural para diversas finalidades, dentre elas a mitigação dos prejuízos causados por situações como a demarcação de terras indígenas outrora tradicionalmente ocupadas.
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