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Scot Consultoria

Carta Boi - Coloquemos a carne bovina ao lado do peru neste final de 2023


Quinta-feira, 7 de dezembro de 2023 - 06h00

Foto: Scot Consultoria


Se você não é um peru, essa época do ano costuma ser motivo de alegria, pela aproximação das datas festivas de final de ano. Essas festas são oportunidades de reencontrar amigos e parentes, de dar boas risadas e para colocar a conversa em dia. Nem sempre, porém, há assunto suficiente para manter bons papos por tanto tempo e com tantas pessoas.

O conteúdo desse texto visa, exatamente, oferecer alguns tópicos que podem servir de gancho para falar de um assunto que, em geral, interessa a maioria das pessoas e que, por vezes, pode ser motivo de controvérsia: a produção de carne bovina no Brasil. As controvérsias frequentemente envolvem informações distorcidas e, portanto, essas conversas são oportunidades para repassar fatos que mostram que o sistema de produção de carne bovina brasileiro tem inúmeras importantes virtudes. Claro que temos nossas mazelas, mas, para estas, já tem gente demais falando e eles não precisam de ajuda...salvo, frequentemente, serem corrigidos.

Seguem, assim, dez perguntas (no modo “Você sabia que?”), cada uma sobre algum destaque da nossa pecuária, um pequeno texto com considerações sobre cada um deles e uma sugestão de presente virtual para alguém que você deseja que fique mais bem informado sobre aquele assunto. Vamos lá!

Você sabia que?

1.     No tempo que você leva para ler essa frase foram produzidas mais de 1,7 toneladas de carne bovina no Brasil?

Com essa frase, comecei o texto da minha palestra no Simpósio de Manejo de Pastagens em 2017 e, na época, o valor estimado era de 1,5 toneladas. Assim, além de ser uma boa maneira de mostrar a grandeza do setor, mostra como ele ainda está em crescimento. O dado usado foi o de 2022 e, portanto, 12% maior do que o de 2017. Um dos motivos que ele se mantém como um setor extremamente competitivo é abordado no próximo item.

Presente de Natal Virtual: Mande essa publicação comemorativa dos 50 anos da Embrapa para alguém que queira conhecer a trajetória magistral da cadeia da carne bovina brasileira nesses 50 anos, do ponto de vista de pesquisadores da Embrapa, e aproveite os outros 49 alimentos para se orgulhar do nosso Agro e da pesquisa brasileira, que é muito mais que só o trabalho da Embrapa. Ele pode ser baixado em: https://www.embrapa.br/busca-de-publicacoes/-/publicacao/1153294/brasil-em-50-alimentos

2.     De cada 100 kg de carne produzida, 98 kg têm como base a produção em pastagens?

Considerando que pouco mais de 18% de animais são abatidos em confinamentos, com duração média de 90 dias e uma idade de abate próxima aos três anos, podemos estimar que, de cada 100 kg de carne produzida, 98 kg são feitas com base em pastagem. A maior parte dela suplementada apenas com sal mineral, mas com adoção crescente de suplementação com suplementos proteicos, proteicos-energéticos, em níveis crescentes de oferta até chegar a vários quilogramas de ração concentrada, no que se chama terminação intensiva em pasto (TIP) ou “confinamento em pasto”. Todas essas suplementações, sendo feitas estrategicamente, trazem a vantagem de intensificar a produção, aumentar a rentabilidade da atividade, mas mantendo-a com base em pastagem. Destaque para o uso de suplementação proteica em pastos diferidos na seca, na qual consumos de 1 g de suplemento por kg de peso do bovino, revertem a perda de peso para ganhos entre 200-400 g/cabeça.dia, sendo comuns retornos tão bons quanto R$ 3,00 para cada R$ 1,00 investido na suplementação.

Presente de Natal Virtual: O presente seria baixar o aplicativo Suplementa Certo (https://play.google.com/store/apps/details?id=br.embrapa.cnpgc.bcss&hl=pt_BR&gl=US&pli=1), para fazer essa avaliação de benefício: custo. Infelizmente, por falta de atualização, ele foi colocado “de castigo” pelo Google. Na indisponibilidade dele, segue a conexão eletrônica para a planilha do Excel que lhe deu origem e que tem todas as orientações para fazer a avaliação econômica citada acima. Pode ser baixada em: https://cloud.cnpgc.embrapa.br/ilpf/downloads/bcss_beta_04_04_2011/

3.     Nossas forragens chegam crescer até quase 10 centímetros por dia?

A única maneira de ter uma produção do tamanho que temos com base em pastagens é com forrageiras muito produtivas. Há uma brincadeira que, no auge do crescimento no verão, com muita luz, água e nutrientes, se você fizer silêncio e prestar bem atenção, poderá ouvir o som do capim crescendo. Exageros à parte, temos materiais que, além de muito produtivos em biomassa, ainda tem excelente valor nutricional (alto teor de nutrientes) e alimentar (alto valor de nutrientes consumidos). Além disso, com características próprias e complementares. Nosso portfólio de gramíneas e leguminosas são um tesouro que ainda pode ser muito melhor aproveitado e que, em sendo, contribuirá para a pecuária continuar crescendo com mais eficiência e de forma sustentável.

Presente de Natal Virtual: O presente é baixar o aplicativo Pasto Certo, que tem todas as informações necessárias de um portfólio abrangente de forrageiras para selecionar a melhor cultivar para sua propriedade e seus objetivos, além de ter informações sobre a implantação e manejo delas. Pode ser baixado em: https://play.google.com/store/search?q=pasto%20certo&c=apps&hl=pt_BR&gl=US

4.     Um bovino adulto pesando 500 kg pode comer quase 40 kg dessa pastagem por dia?

Esse valor é mais um para dar uma ideia dessa outra grandeza envolvida na produção de carne bovina, mas tem uma “pegadinha”: boa parte desse valor é água. No caso, cada quilograma de matéria in natura desse pasto teria apenas 250 g de matéria seca (MS), ou seja, ele teria apenas 25% de MS e 750 g seriam água. Isso seria uma situação de primavera-verão no Brasil-Central Pecuário. Mesmo na época da seca, a MS da pastagem vai ficar, a maior parte do tempo, entre 30-35%, ou seja, cada quilograma terá, em média 1/3 de matéria seca e 2/3 de água. Portanto, os mesmos 10 kg de MS consumidos quando a pastagem tem 25% de MS (40 kg X 0,25 = 10 kg), seriam “apenas” 30 kg na seca, caso não haja nenhum outro fator limitante. Na seca, com consumo exclusivo de forragem, é comum o teor de proteína ser baixo e limitar o consumo. Essa é uma das situações em que a suplementação estratégica com suplementos proteicos brilha.

https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/1135277/1/DOC-292-Final-em-alta.pdf

5.     A maior parte da energia do alimento (de 60 a 100% das exigências) vem da fermentação dele no rúmen pelos microrganismos que o habitam?

Se há uma parceria de sucesso na natureza é essa entre os microrganismos ruminais e seus hospedeiros que carregam um rúmen, como bovinos, bubalinos, ovinos, caprinos e vários animais silvestres. Nós, mamíferos com apenas um estômago, temos uma capacidade muito limitada de digerir fibras alimentares. Não temos as enzimas capazes de quebrar as principais ligações que ocorrem nelas. Humanos em dietas com alta inclusão de fibra até podem ter cerca de 20% das suas exigências energéticas provenientes da fermentação no trato gastrintestinal inferior. Ruminantes, por sua vez, podem ter até 100% das suas exigências atendidas pelos produtos de fermentação da ingesta presente do rúmen pelos microrganismos que o habitam. É por isso que eles podem produzir carne, lã, leite e ser fonte de força de trabalho quase sem competir pelos alimentos passíveis de serem consumidos por humanos.

O presente é uma publicação da FAO que mostra como a pecuária é necessária para o atendimento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, grande parte graças à parceria microrganismo ruminais e ruminantes. Pode ser baixado em: https://www.fao.org/3/CA1201EN/ca1201en.pdf

6.     Esses microrganismos ruminais podem fornecer toda a proteína necessária para o hospedeiro?

A parceria do item anterior, fica ainda mais destacada pelo comprometimento do hóspede no arranjo que, mesmo depois de morto, ainda ajuda a atender as exigências proteicas do hospedeiro. O termo é “ajuda” pois, mesmo numa dieta apenas com forragem, há uma parte da proteína alimentar que passa o rúmen e é absorvida como tal. Mas, para baixas produções, é possível ter uma dieta em que a única fonte de proteína seja a ureia, que aporta apenas nitrogênio (não proteico) no sistema. Os microrganismos ruminais são capazes de sintetizar proteína de qualquer fonte de nitrogênio disponível no rúmen. Não bastasse isso, a proteína microbiana que chega ao intestino para absorção é de alto valor biológico, ou seja, sua composição em aminoácidos (as unidades básicas que formam a proteína) é semelhante a que ocorre nos tecidos do animal, ou seja, há tudo o que precisa para se produzir novos tecidos.

Presente de Natal Virtual: O presente aqui é um dos livros mais baixados do acervo da Embrapa, o “Gado de Corte, 500 perguntas, 500 respostas” que tem informação sobre o uso de ureia em bovinocultura de corte de forma bastante simples e direta. Pode ser baixado em: https://mais500p500r.sct.embrapa.br/view/arquivoPDF.php?publicacaoid=90000017

7.     No metabolismo ruminal são formados compostos de grande valor alimentar, como vitaminas do complexo B?

E a série de vantagens da parceria ruminal ainda tem mais este belo capítulo. Várias vitaminas são produzidas pelos microrganismos ruminais como as A, D, E e K (lipossolúveis) e as hidrossolúveis, como as vitaminas do complexo B (B12, Tiamina, Niacina e Colina) e a vitamina C. O maior destaque vai para a B12, uma vez que apenas 70 g de carne moída com 30% de gordura atende a quase 90% de nossas exigências dietéticas desse nutriente. Para quem sabe o alto custo para a inclusão de vitaminas nas rações e a preocupação que elas não se degradem entre a batida na fábrica e a ingestão pelos animais, tem uma boa ideia do elevado valor desse serviço prestado gratuitamente pela microbiota ruminal.

Presente de Natal Virtual: O presente aqui é uma base de dados sobre composição e alimentos, a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA), na qual os valores de vários cortes de carne, inclusive vitaminas, podem ser observados. Pode ser acessado em: https://www.tbca.net.br/index.html#

8.     Compostos exclusivos do metabolismo ruminal são produzidos, como os ácidos graxos trans e o CLA?

Essa é uma das melhores histórias que envolvem a interação microbiota e seu rúmen. Nos anos 1990, pesquisadores procuravam por substâncias potencialmente cancerígenas na carne e acabaram descobrindo que o ácido linoleico conjugado (CLA, do acrônimo em inglês), que, não só não causava câncer, mas combatia células tumorais. Nessas últimas três décadas, toda a classe de CLAs (são vários isômeros) tem sido estudada e alguns benefícios à saúde foram relacionados a eles, como aumento de massa muscular, auxílio em perda de peso, melhor constituição óssea e outros. Ainda que mais estudos sejam necessários para que se tenha o real benefício, o que o caso do CLA revela é que a carne bovina pode ter outras substâncias derivadas das interações do microbioma com o hospedeiro que ainda nem nos demos conta de sua importância nutricional. Isso fica ainda mais importante de se levar em conta, quando a carne cultivada se arroga a ter o mesmo valor nutricional do que a carne de verdade!

Presente de Natal Virtual: O presente aqui é um texto sobre o valor nutricional da carne bovina e suas Implicações para a saúde humana. Pode ser baixado em: https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/326880/1/DOC171.pdf

9.     Um animal confinado vai produzir mais de meia tonelada de esterco, que é usado como fertilizante orgânico?

Do boi nada se perde e seus dejetos não fogem a regra. Quando os animais estão em pastagem, os dejetos são reciclados no local, mas, infelizmente, a disposição desuniforme acaba atrapalhando bastante um melhor aproveitamento. Todavia, no caso de animais confinados, considerando uma dieta com digestibilidade próxima de 70% da MS, consumo de 2,3% do peso por um animal de 500 kg de peso médio em 90 dias de confinamento, produzirá cerca de 600 kg de esterco. Além de oferecer todos os nutrientes, do NPK aos micronutrientes, a grande vantagem do esterco é a incorporação de matéria orgânica no solo e mais toda a carga de microrganismos que ele leva. Há uma excelente contribuição, também, para parte física do solo. Depois da invasão da Ucrânia pela Rússia, a tendência em se valorizar os fertilizantes orgânicos se acentuou e eles têm sido cada vez mais procurados. Hoje, fazendas com grandes produções agrícolas já usam os fertilizantes orgânicos como principais fontes de nutrientes em sua rotina.

Presente de Natal Virtual: O presente aqui é o link para um curso de compostagem “on-line” na plataforma E-Campo da Embrapa, que tem muitos outros cursos disponíveis que também podem interessar. O curso de compostagem pode ser acessado em: https://www.embrapa.br/en/e-campo/curso-online-compostagem

10.  Em geral, menos de 7% da energia total consumida pelo animal é perdida como metano...e, mesmo com todas as vantagens acima, ainda reclamam?

A produção de metano entérico, como é chamado aquele produzido no rúmen, é inerente à fermentação ruminal, mas ela é uma ineficiência do processo e podemos tentar reduzi-la, por vários meios, como melhores dietas, uso de aditivos, melhoramento animal e vegetal, suplementação, sistemas de produção integrados etc. Com inteligência, podemos passar da coluna “problema” para a coluna “solução”, ao produzir carne até com emissão negativa de carbono. Apenas considerando tratar-se de um animal que produz alimentos nobres e produtos como lã e couro, com base em capim, mesmo em áreas marginais, e do qual só não se aproveita o berro, mesmo taxas elevadas de perda de energia por metano (que podem chegar a 12% em dietas de muito baixa qualidade), podem ser consideradas “taxas” bem aceitáveis frente a todas as vantagens enumeradas.

Presente de Natal Virtual: O presente aqui é a “Coletânea de Fatores de Emissão e Remoção de Gases de Efeito Estufa da Pecuária Brasileira". Pode ser baixado em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/sustentabilidade/plano-abc/arquivo-publicacoes-plano-abc/coletanea-gee-pecuaria_web.pdf

Finalizo, desejando excelentes festas, com excelentes trocas de ideias, e que 2024 comece bem e, depois, só melhore!


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