Artigo originalmente publicado na revista Agroanalysis da Fundação Getúlio Vargas
Em maio, começou a semeadura da safra brasileira de trigo. A semeadura, até 26/5/24, porém, está atrasada (tabela 1).
Tabela 1.
Semeadura do trigo no Brasil.
Fonte: Conab
O Paraná e o Rio Grande do Sul são os maiores produtores, e ambos têm passado por desafios com relação à semeadura.
No Paraná, onde os trabalhos estão mais adiantados. A temperatura elevada e o tempo seco predominam, diminuindo a qualidade das lavouras desde o início da semeadura – com destaque para o Norte do estado, cuja semeadura começa primeiro e há falta de chuva desde 18/4/24 (Deral-PR).
A condição das lavouras tem piorado. Em 27 de maio, 82% das lavouras apresentavam boas condições, 14% com condições medianas e 4% com condições ruins. Há um ano, a condição das lavouras eram 93% com boas condições e 7% com condições medianas.
No Rio Grande do Sul, as enchentes geram incertezas quanto à condição do solo para a semeadura – que ganha ritmo no estado em junho e julho.
Em maio, a Conab reduziu em 700 mil toneladas a estimativa de produção nacional, agora prevista em 9 milhões de toneladas. Estimativa que poderá ser revisada para baixo nos próximos meses.
A semeadura começou com os preços apresentando forte reação no mercado nacional e internacional.
Nos últimos trinta dias, para se ter uma ideia, a referência no mercado físico (figura 1) subiu 14,2%, estando cotado no Paraná em R$1.464,50/t (24/5/24), Cepea/ESALQ.
Em Chicago (CBOT), referência para o trigo, os preços também subiram no período. Considerando o contrato de vencimento mais próximo (jun/24), a referência subiu 13,7% ( 24/5/24).
Figura 1.
Preços do trigo em Chicago (US$c/bushel) e no Paraná (R$/tonelada).
Fonte: CBOT, CEPEA. Elaboração: Scot Consultoria
Uma série de fatores estão dando sustentação aos preços.
A entressafra e a produção de trigo de menor qualidade em 2023 - o Rio Grande do Sul é o principal produtor, e sofreu com chuvas em excesso durante a colheita em setembro/outubro - colaborou para a internalização do cereal. Esse cenário, combinado com a alta do dólar e as incertezas quanto a oferta da safra nacional e internacional, em função do clima, deram firmeza aos preços.
Em maio, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, em inglês), apresentou as primeiras projeções quanto à safra global de trigo em 2024/25.
O balanço global, que já está apertado há algumas safras, deverá continuar assim no ciclo vindouro. Mesmo com expectativa de crescimento para a produção global, devemos observar, novamente, redução dos estoques finais.
Para 2024/25, o estoque projetado é o menor dos últimos 6 anos (tabela 2). Essa redução e aperto do estoque global vai na direção contrária do milho e da soja.
Tabela 2.
Balanço de oferta e demanda global de trigo, em milhões de toneladas
Além da estimativa do balanço apertado, há problemas relacionados ao clima e a exportadores globais.
De acordo com o USDA, 25% das áreas com trigo de inverno nos Estados Unidos apresentam algum problema relacionado à seca (figura 2). O Kansas, principal produtor, tem 76 % das lavouras sob alguma condição de seca.
Figura 2.
Seca em áreas com trigo de inverno nos Estados Unidos (21/5/24).
Fonte: USDA
Na Rússia, principal produtor global, a ausência de chuvas e o clima seco (figura 3) em importante região produtora (responsável por cerca de 30% da produção) tem justificado as preocupações quanto à oferta.
Figura 3.
Anomalia de precipitação nos últimos trintas dias (27 de abril a 26 de maio) na Europa e em parte da Rússia.
Fonte: NOAA
Além disso, geadas recentes nas lavouras ucranianas colocaram em dúvida o potencial da produção no país.
Esses fatores têm trazido volatilidade para as bolsas internacionais e favorecido as cotações do trigo. Em curto prazo, a perspectiva é de preços firmes para o mercado do trigo.
Conforme comentamos, a estimativa para a produção brasileira em 2024 é de 9 milhões de toneladas. A expectativa é de aumento na produtividade nacional, em função da La Niña, que tende a favorecer os rendimentos na região Sul.
Mas, em função das enchentes ocorridas no Rio Grande do Sul em maio, que é o maior produtor nacional, será necessário avaliar quais serão os impactos na cultura.
Se confirmada a expectativa atual (9 milhões de toneladas), a relação estoque/consumo aumentará – o que poderá pressionar os preços.
Contudo, se a alta no mercado internacional continuar e o câmbio não cair abaixo dos R$5,00/USD, os preços internos deverão subir. Se houver retração da produção nacional ou perda de qualidade, elevando a necessidade de importação, a paridade será importante na apreciação do cereal.
Há a possibilidade de que os preços caiam durante a colheita, no segundo semestre, flutuando segundo a sazonalidade da oferta. No entanto, o cenário global ajustado e um quadro não tão favorável em alguns produtores internacionais, devem fortalecer a paridade de exportação e manter os preços firmes.
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