Foto: Portal Agrolink
Em evento no dia 11/12, Ivan Wedekin e Suelen Farias realizaram uma série de rodadas de perguntas aos seguintes convidados:
Fernando Pimentel, engenheiro agrônomo e bacharel em direito. É diretor da Agrometrika, empresa de soluções para gestão de crédito rural.
Victoria de Sá, advogada pela Universidade de São Paulo. É sócia fundadora da Vert Securitizadora.
Roberto “Bob” Machado, administrador. Ex-diretor do Banco do Brasil e idealizador da CPR.
Abaixo algumas das perguntas realizadas pelos apresentadores aos convidados.
Ivan Wedekin perguntou a Fernando Pimentel: Fernando, como você vê a utilização da CPR nas operações de barter, algo que não existe nos EUA?
Pimentel respondeu: Vamos entender o antes para entender como era depois. Tiveram várias tentativas de buscar títulos representativos de lastro de grãos, mas o mercado sempre foi contra, pois as tradings não gostavam da ideia de ter outros participantes nesse mercado.
O barter já tinha começado em 1988, sendo feito em contratos de compra e venda. No entanto, existia uma insegurança jurídica enorme, e na hora de ajuizar havia a dificuldade de entendimento do juiz. Era um desafio muito grande, e houve muita resistência das tradings em não ter outros participantes no segmento. Quando veio a CPR, as operações foram democratizadas, o Banco do Brasil trabalhou com uma legislação própria padronizando um título de produção agrícola. Começou a trazer o barter para fora do ambiente das tradings, e grandes empresas como Monsanto e Bayer começaram a operar, percolando em toda a cadeia de financiamento do agro. Mais financiadores participavam e mais tradings também participavam.
Qual o motivo de não existir barter nos EUA? O barter é um produto nacional. Se você for ver nos EUA, Canadá e Espanha, eles possuem algo que estamos lutando há anos no Brasil que é o seguro rural. Hoje somente 10,0% da área agrícola do Brasil possui apólice de seguro e 90,0% seguem no risco climático, e o sistema financeiro não gosta desse risco não gerenciável. Enquanto isso, EUA, Canadá e Espanha possuem 90,0% das áreas agrícolas com apólice de seguro. No Brasil, o barter deu certo pois inclui travas cambiais, hedge Chicago e custo do frete, riscos que o produtor passa a não ter mais. O produtor só se preocupa em produzir.
Suelen perguntou a Victoria: Gostaria que você relacione a evolução da agropecuária no cerrado a partir da CPR.
Victoria respondeu: Acredito que um dos principais papeis nesse quesito seja a participação da Embrapa. A própria Embrapa e a forma de produção que temos hoje têm que ser valorizados.
O papel da CPR é trazer liquidez para algo que não é tão líquido, e a CPR permitiu outros entes a entrarem no meio agrícola. Quando olhamos o histórico de produção hoje, vemos a CPR financeira como um super propulsor do financiamento do agro no cerrado.
Suelen perguntou a Fernando: Com o aumento das recuperações judiciais, como você vê a situação do alto risco de crédito hoje para o produtor rural e o impacto do financiamento agropecuário brasileiro?
Fernando respondeu: Tivemos uma lei de 2023 que tinha com intuito subir o patamar da CPR, ampliando das quatro garantias admissíveis, praticamente você poder operar qualquer garantia aceita dentro do ordenamento do direito civil. Depois tivemos a oportunidade de colocar fora das recuperações como um patrimônio apartado. Isso está sendo complicado em primeiras instâncias pois alguns juízes entendem que há um critério de essencialidade e incluindo as cédulas dentro dos ativos de recuperação judicial. O objetivo do legislador foi aumentar a utilização da cédula como lastro para operação de créditos e para favorecer o nível de credibilidade dentro do mercado de capitais, pois sabemos que no final do dia a cédula vai ser lastro para operações maiores, como os fiagros.
O mercado de capitais vive em cima de credibilidade, a insegurança jurídica não pode existir. Precisamos do mercado de capitais, a cédula, ela serviu de base para que o crédito comercial prosperasse. O plano safra, no final do dia, é um volume muito pouco. O recurso livre, na real, é uma opção do banco conceder, não está nem no orçamento.
Quando o político fala de plano agrícola de R$500 bilhões, é tudo uma balela! O dinheiro que financia o agro brasileiro é o dinheiro privado! Nós temos o barter, temos vendas a prazo feitas por cooperativas agrícola, comercializadores de insumos, multiplicadores de sementes, sendo que grande parte disso é financiado através de CPR. No entanto, tudo isso pode ser colocado em risco pela insegurança jurídica, quando os juízes não interpretam direito a lei. O agronegócio brasileiro depende da proteção da cédula de produção rural.
Suelen perguntou a Bob Machado: A gente sabe que o produtor é uma pessoa muito tradicional, muito pé atrás e que não gosta de se demonstrar muito para o mercado, são pessoas mais retidas. Hoje existe a B3 falando sobre o mercado de capitais para o agro, mas o produtor ainda está mais resistente com isso. Como você enxerga a resistência do produtor e uma maneira de quebrar essa resistência?
Bob respondeu: Na realidade vemos que tudo é contato com o produtor, o título é um contato com o produtor. Pequenos produtores ainda emitem CPR. Acredito que tudo é divulgação e comunicação.
Suelen perguntou a Victoria: O agronegócio representa cerca de 25,0% do PIB brasileiro e somente 3,0 a 4,0% do mercado de capitais. Comente sobre a importância dos fiagros e a recente queda dos preços.
Victoria respondeu: Os fiagros tiveram muita entrada de capital e quando vemos esse volume de bilhões temos que lembrar que os fiagros são de 2021. A regulamentação específica do fiagro existe há um mês. Eu acho isso natural, você teve muito aporte, desbalanceamento de taxas, se deu uma expectativa de retorno muito grande para o investidor, maior do que as taxas que se pratica no agro. Os fiagros tiveram tombos, mas quando olhamos para a cena total está longe de ser desastrosa. Saímos de anos muito bons na agricultura. Guerras, dólar, taxa de juros, quebras de safras, ou seja, um cenário mais bagunçado que também afeta. Acho que o mercado de capitais está entendendo que são ciclos e precisamos entender que o agro são ciclos, é difícil o agro deixar de pagar, mas ele pode atrasar no pagamento.
Ivan Wedekin perguntou a Fernando: O COPOM está reunido hoje (11/12), vai subir a taxa de juros da economia. Temos esse vespeiro da recuperação judicial (RJ) que acaba criando uma poeira na estrada da agricultura brasileira. Os preços caíram e o dólar está salvando, isso é uma crise conjuntural de parte da agricultura brasileira que vai ser superada brevemente ou isso pode ser uma crise que pode impactar o crescimento da agropecuária brasileira, olhando o produtor rural?
Fernando responde: Nós temos vários elementos que se você observar de forma conjunta soa como uma tempestade perfeita, vamos dizer assim. Estamos entrando em um período de baixas margens, indústrias químicas, principalmente chinesas, entrando com margens agressivas, algo muito parecido com o mercado automobilístico. Você tem ao mesmo tempo problemas, como a guerra russo-ucraniana que criou uma anomalia no mercado de fertilizantes, depois tivemos queda no preços dos grãos, prejudicou o fluxo de caixa dos produtores de milho e algodão. Temos essa leitura de taxas de juros altas, que é uma pancada a expectativa de alta de juros. O mercado agrícola é capital intensivo, usa capital por um período longo, o produtor de café capta recursos para 18 meses e o produto de soja para 12 meses. Se você já tem margens reduzidas e um juros de capital desse tamanho, você tem uma conjuntura complicada. Eu não acredito que as taxas de juros voltem aos patamares de 3 anos atrás nos próximos 2 anos, pois o atual governo não tem uma conjuntura fiscal boa.
A RJ é um elemento que exige alguns ajustes, alguns critérios de eligibilidade do RJ devem ser revisados. O administrador tem que recuperar a empresa, e para recuperar em um segmento como agro, exige um conhecimento extremamente multidisciplinar, relativamente complexo para poder fazer o turnaround em uma fazenda ou em uma produtora de insumos, por exemplo.
Ivan Wedekin diz a última mensagem do evento: O fiagro é um crédito mais pulverizado, com investidores do mercado. Com a resolução recente da comissão de valores imobiliários normatizando os fiagros, isso pavimenta fortemente a expansão e a pulverização dos mercados de capitais, possibilitando até emissões menores do que o CRA. Outro aspecto é sobre a questão cíclica dos negócios agrícolas, do freio de arrumação e do aperto de margens, tanto de produtores e da indústria, do maior nível de concorrência.
Não vamos fazer duas bobagens, primeiro, não vamos tributar os títulos do agronegócio. Acho que as chances disso passar no congresso nacional é zero. O segundo ponto, é a questão da insegurança, nós criamos uma indústria de títulos muito simples e não podemos espalhar a insegurança jurídica para que possamos de fato ter o agronegócio cada vez mais relevante no mercado financeiro e de capitais.
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