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Scot Consultoria

Carta Grãos e Agricultura - Efeitos das tarifas comerciais americanas no mercado de grãos


Terça-feira, 11 de fevereiro de 2025 - 12h00

Fonte: Freepik


1. Motivos para as tarifas

No fim da Segunda Guerra Mundial, a Europa e o Japão estavam destruídos. Os norte-americanos, então, tomaram a frente e lançaram esforços para a reconstrução desses países, com o plano Marshall e o Bretton Woods. A ideia era simples, os americanos consumiam bens, enviavam dólares para o exterior e permitiam que outros países produzissem. Em retorno, esses países usariam o dólar como moeda de reserva global, acumulando a dívida norte-americana como forma de poupança.

A emissão da moeda de reserva global dá aos EUA um grande poder - o chamado privilégio exorbitante, que permite aos americanos pagarem pelas importações emitindo moeda, mas, ao mesmo tempo, induz a um alto endividamento.

Para Scott Bessent – Secretário do Tesouro dos Estados Unidos no governo Donald Trump - esse sistema econômico internacional não beneficiou os EUA e desindustrializou o país. Scott ainda defende que os EUA devem lutar para garantir que o dólar continue sendo a moeda de reserva global, o que, paradoxalmente, é o que causa o endividamento que ele mesmo critica.

De fato, ao analisarmos o saldo da conta corrente norte-americana (figura 1), os EUA apresentam um déficit, pois importam mais do que exportam e têm elevados pagamentos de renda ao exterior. Após 1990, esse saldo é continuamente negativo.

Figura 1. Saldo da conta corrente dos EUA.

Fonte: FRED

A seguir a posição de investimento internacional líquida dos EUA, que mede a diferença entre os ativos externos detidos pelos residentes (como investimentos em empresas estrangeiras, títulos e imóveis) e os passivos externos (investimentos estrangeiros nos EUA) (figura 2).

Figura 2. Investimento internacional líquido dos EUA

Fonte: FRED

Os EUA, historicamente, têm um investimento internacional líquido negativo, pois estrangeiros investem mais nos EUA (em Treasuries, por exemplo) do que os EUA investem no exterior. Em 2024, esse déficit estava próximo a US$24,0 trilhões.

Scott Bessent atribui como causas para isso o próprio déficit fiscal norte-americano, financiado pelo investidor estrangeiro, mas também por disfuncionalidades da economia chinesa - não explicadas por ele - e à forma como os chineses manipulam a moeda deles, o yuan.

Bessent vê nas tarifas comerciais uma forma de forçar os chineses a reduzirem essas disfuncionalidades, bem como uma maneira de diminuir o déficit comercial não somente com a China, mas também com o restante do mundo, reduzindo de forma ampla o déficit norte-americano.

Observamos, dessa forma, uma justificativa macroeconômica para a aplicação de tarifas comerciais, distinta das justificativas amplamente divulgadas, como a entrada de imigrantes ilegais e entorpecentes em território norte-americano.

As tarifas não seriam apenas um instrumento político para barrar a entrada de imigrantes ilegais nos EUA, mas sim parte de uma estratégia maior para transformar o modelo econômico norte-americano.

É possível que as tarifas comerciais sejam aplicadas para diversos países, e, para o Brasil, isso pode ser uma questão de tempo. A convergência de pensamento entre o secretário do tesouro dos EUA e o próprio presidente Donald Trump fortalece essa ideia.

Vide o recente pronunciamento de Trump sobre a aplicação de tarifas contra a União Europeia. Os europeus não mandam imigrantes ilegais nem mesmo fentanil aos EUA, mas, ainda assim, serão tarifados da mesma forma.

2. Efeitos das tarifas nos grãos

De janeiro a novembro de 2024, os norte-americanos faturaram US$39,3 bilhões com a exportação de soja, milho e trigo. China, Canadá e México importaram US$20,1 bilhões dessa quantia - 51,0% da exportação norte-americana.

Na direção contrária, os americanos importaram US$820,3 milhões desses grãos do Canadá, México e China – a maior parte foi de trigo canadense.

Os estadunidenses são grandes exportadores de grãos, e não importadores. Dessa forma, um possível redirecionamento de compras dos canadenses, chineses e mexicanos para o milho e soja do Brasil acontecerá apenas caso esses países retaliem a aplicação das tarifas norte-americanas e passem a taxar os grãos dos EUA.

Esse não é o caso, por exemplo, da carne bovina, setor em que os americanos, além de grandes exportadores, também são grandes importadores, principalmente do México e do Canadá. Nesse caso, a aplicação unilateral de tarifas já beneficia diretamente o Brasil.

Após o anúncio da imposição de tarifas e a retaliação dessas tarifas pelo México e Canadá, no sábado (1/2), os preços futuros da soja caíram (1*). Com o desenrolar da situação e o acordo firmado entre os EUA e os dois países, as cotações se recuperaram (2**). Observe a figura 3. Os futuros do milho e do trigo seguiram o mesmo comportamento.

Figura 3. Comportamento das cotações futuras da soja na CBOT.

Fonte: CBOT / Elaboração: Scot Consultoria

Nesta terça-feira, 4/2, o governo chinês retaliou as tarifas impostas, aplicando 15,0% sobre gás e carvão e 10,0% sobre óleo cru e maquinários norte-americanos. O mercado agrícola, por enquanto, ficou de fora.

Com os acordos em vigor, não se espera um aumento significativo na demanda por grãos brasileiros. No entanto, é necessário acompanhar o desenrolar da situação após o fim da suspensão das tarifas por 30 dias. De qualquer forma, enquanto as tarifas não forem aplicadas ao Brasil, elas tendem a beneficiar o agronegócio brasileiro.


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