Fernando Furtado Velloso é médico veterinário pela UFRGS, com treinamento em Farm Management realizado na Austrália. É inspetor técnico da Associação Brasileira de Angus (ABA) e gerente do Programa Carne Angus. Também atua como consultor em projetos pecuários e especialmente em projetos voltados ao cruzamento industrial e a rebanhos de seleção (genética).
Scot Consultoria: Como nasceu o Programa Carne Angus?
Fernando Velloso: A Carne Angus é um produto diferenciado e bastante valorizado em todo o mundo. Portanto, havia necessidade de desenvolver melhor este produto no Brasil. A ABA teve algumas iniciativas e tentativas de realizar trabalhos com frigoríficos nos anos 90. Em 2001 iniciamos o controle e levantamento da disponibilidade de animais Angus jovens no abate do Frigorífico Mercosul. Em 2003 começamos oficialmente a certificar os abates e a produção de Carne Angus. De lá para cá não houve interrupção deste trabalho e agregamos mais indústrias, redes de supermercados e restaurantes neste processo.
Scot Consultoria: Como o programa está estruturado hoje? Quais são os participantes e como a carne é comercializada?
Fernando Velloso: Atualmente o programa ampliou o seu grupo de parceiros e trabalha com os seguintes frigoríficos:
a) Frigorífico Mercosul (para fornecedores de todo o RS);
b) Frigorífico da Gruta (para fornecedores de todo o RS);
b) Frigorífico Marfrig (para fornecedores da planta Promissão/SP);
c) VPJ Beef (gado próprio do grupo VPJ e de seus parceiros).
A Carne Angus é certificada pela ABA (acompanhando diariamente abates e produção) e o produto é identificado como Carne Angus Certificada, sob diferentes marcas de cada empresa (ex: Zaffari Angus, Mercobeef Angus, VPJ Prime Angus, etc.).
Scot Consultoria: Quais são os ganhos para os produtores? Existem outros benefícios além das premiações?
Fernando Velloso: Cada indústria possui seu sistema de premiação/bonificação para a Carne Angus. No Marfrig, por exemplo, as fêmeas jovens e pesadas (Angus, naturalmente) recebem o valor ESALQ para machos. A lógica em todos os frigoríficos é de premiar progressivamente os animais mais jovens, pesados e bem terminados.
O benefício mais buscado é a premiação e a preferência dos frigoríficos por este tipo de gado. Em “épocas boas” o produto consegue um bom sobre preço. Em “épocas difíceis” o produto tem pelo menos melhor liquidez.
A maioria dos frigoríficos tem programas de incentivo à produção de animais cruza Angus. No caso do Marfrig, existe o Programa Marfrig Fomento, onde o frigorífico financia todos os custos para realização de IATF com genética Angus (sêmen, hormônios e veterinários) e o produtor paga estes insumos e serviços no momento do abate do gado.
Um dos benefícios ou vantagem mais importante não está vinculado ao preço do gado, mas sim ao incremento de produção com o uso do cruzamento. As fêmeas Cruza Angus entram em reprodução mais jovens que as zebuínas e os animais de engorda estão prontos para o abate mais jovens também. Esta redução no ciclo de produção é resultado da precocidade da raça Angus e da heterose do cruzamento de raças geneticamente tão distantes.
Scot Consultoria: Quais são as expectativas do programa para 2009 e 2010? Existe uma meta de produção? Novas parcerias podem surgir?
Fernando Velloso: O programa vem em franco crescimento (número de frigoríficos, produtores participantes, carne comercializada, etc.), mas sofreu forte impacto da redução de abates no RS em 2007 e 2008. O embargo da União Européia à carne brasileira também afetou bastante o nosso negócio, já que uma parcela significativa da carne do programa vinha sendo enviada para a Alemanha.
Como meta temos o fortalecimento das marcas que estão no varejo em supermercados, boutiques de carne ou restaurantes. De outra parte, estamos permanentemente atendendo a demanda de novas empresas que querem comercializar a Carne Angus.
Novas parcerias com indústrias podem surgir a qualquer momento, pois nosso objetivo é ampliar a produção de Carne Angus e gerar cada vez mais demanda para os novilhos de nossos produtores.
Scot Consultoria: Tratando agora da pecuária gaúcha de forma mais ampla, quais são, em sua opinião, os principais desafios que os pecuaristas locais enfrentam hoje? E como superá-los?
Fernando Velloso: O pecuarista gaúcho sofre ou vive exatamente os mesmos desafios e problemas que os pecuaristas de outras partes do Brasil. Com relação ao governo, destaco o “vai não vai” da rastreabilidade e a falta de atenção às questões sanitárias (vigilância, barreiras sanitárias, controles de doenças como aftosa, brucelose, tuberculose, etc.). Com relação ao mercado e aos custos, temos a disputa por espaço com a agricultura e a falta de previsibilidade de um cenário de preços. Afinal, além do nosso ciclo pecuário, é preciso considerar fatores relacionados (comércio internacional, problemas sanitários, questões políticas...) não respeitam estudos e tendências.
Porém, temos no RS uma vantagem competitiva, que é a possibilidade de produzir carne de raças européias e, conseqüentemente, carne mais macia que o resto do Brasil. Somente no RS existem condições de clima para se produzir carne de igual qualidade à da Argentina e do Uruguai. Se bem explorado, este diferencial pode ser uma grande oportunidade. É o que estamos tentando fazer.
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