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Scot Consultoria

Maurício Campiolo - Acrimat


Sexta-feira, 1 de outubro de 2010 - 10h04

Maurício Campiolo é engenheiro civil por formação. Trabalha com pecuária no Mato Grosso há 24 anos. É atualmente diretor da Nelore do Mato Grosso e Diretor-Tesoureiro da Associação dos Criadores do Mato Grosso (ACRIMAT). Scot Consultoria: Mato Grosso possui o maior rebanho de bovinos de corte do país, ao mesmo tempo em que a concentração dos frigoríficos é uma dos mais expressivos. Como você avalia essa situação para a pecuária do estado? Maurício Campiolo: Toda concentração é negativa já que ela permite distorções de mercado. Nesse caso o pecuarista tem menos opções de venda do seu gado, possibilitando a cartelização do mercado e consequente diminuição da concorrência, gerando pressão negativa artificial sobre o preço da arroba. Da mesma maneira que o produtor tem dificuldade para vender, o consumidor também vai encontrar restrições para comprar a carne, pois as opções serão menores. As duas pontas sofrem: quem produz e quem consome. Scot Consultoria: A que atribui as recentes paralisações das atividades de frigoríficos como Pantanal e Frialto, além de algumas unidades entrando de férias coletivas no estado? Maurício Campiolo: As paralisações do Frialto e do Pantanal são de causas diferentes. No caso do Frialto e outros frigoríficos que entraram em Recuperação Judicial, as causas começaram em 2008 com a crise mundial de crédito. Esses frigoríficos fizeram investimentos além da sua capacidade, dentro de um planejamento que não se concretizou. Com a crise, o crédito ficou restrito e as vendas internacionais despencaram e os frigoríficos que não conseguiram aporte do BNDES (que só emprestou para os grandes, inclusive se tornando sócio deles) tiveram dificuldades em continuar operando. Além da crise do crédito houve uma mudança na sistemática de comercialização do boi, que com a quebra de vários frigoríficos passou a ser à vista. Na sequência, a falta de bois decorrente do grande abate de fêmeas em 2006 e 2007 provocou a diminuição da oferta e a elevação do preço da arroba. Com isso a margem de operação dos frigoríficos reduziu, chegando, como no caso do Pantanal e do Friboi de Cáceres, a inviabilizar a continuação das atividades. Outra consequência desses fechamentos, além da concentração, é a má distribuição geográfica das plantas em operação, que deixou regiões do Mato Grosso, como a nordeste e a norte desatendidas e os pecuaristas sem opção de venda. Scot Consultoria: Em sua opinião a tendência para o longo prazo é que a concentração se intensifique cada vez mais, e que as empresas de médio e pequeno porte desapareçam? Maurício Campiolo: Se o BNDES continuar como está, a tendência é essa. O que inviabiliza o pequeno e o médio é a política de crédito do governo federal. O médio será o grande prejudicado. Ou eles se juntam e se tornam um grande ou correm o risco de desaparecer. O BNDES além de não liberar recursos para o médio, ainda dá dinheiro para o grande comprá-lo. O pequeno sobrevive em mercados locais ou nichos, atendendo públicos específicos. Scot Consultoria: Como você vê a pecuária mato-grossense nos próximos 5 anos em relação a concorrência com a agricultura e a pressão econômica que os rodutores vêm sofrendo? Qual a saída para minimizar riscos em uma atividade de margens tão estreitas como a pecuária? Você acredita em uma concentração de produtores? Maurício Campiolo: Creio que temos que analisar isso sob dois aspectos, aptidão da terra e opção do pecuarista. Nas terras de pastagem com aptidão para a agricultura, a pressão econômica vai acabar tirando o boi. A atividade não remunera como a agricultura. Se o pecuarista quiser, poderá ele mesmo plantar, caso contrário, poderá estabelecer parcerias ou até vender. A pecuária só vai se manter nas terras impróprias para agricultura. Para a manutenção do rebanho (nem falo em aumento nesse caso), vamos ter que recuperar pastagens degradadas. Onde for possível consorciar com a agricultura, implantar pastagens nas terras agricultáveis no período da entressafra e utilizar confinamento para terminação. Quanto ao risco, apesar de a margem de lucro ser pequena, a pecuária é uma atividade de baixo risco. Para a recuperação das pastagens, será necessário que o pecuarista tenha acesso a crédito e, aí sim, ele deve tomar cuidado. Ao utilizar o crédito, o produtor deve ter muito critério, verificar se os juros e principalmente os prazos são compatíveis com a atividade, planejar bem e fazer uma boa gestão. As linhas de crédito existentes não são compatíveis com os prazos e a remuneração da atividade. Não acredito que haverá concentração de produtores, apesar de todas as transformações necessárias na atividade. A base da pecuária, que é a cria, continuará principalmente em pequenos produtores. Scot Consultoria: Além das pressões econômicas, os pecuaristas vêm se deparando com grandes exigências ambientais. Como você avalia essa situação, que em muitas vezes, inviabiliza as produções? Maurício Campiolo: As exigências ambientais estão vindo sozinhas, quebrando o tripé: ambiental, social e econômico. Uma política que não se sustenta. Quem faz exigência sobre um produto tem que assumir que terá que pagar pelas exigências que fez, o que não vem ocorrendo. Custa caro manter o meio ambiente. Fizemos uma pequena conta tomando como base uma unidade frigorífica que abate 20 mil cabeças de gado por ano em Mato Grosso. O conjunto de pecuaristas fornecedores dessa unidade preserva, em média, 650 mil hectares de terra, que valem no mercado quase R$1 bilhão, um patrimônio que o pecuarista possuiu e não pode usar. Além disso, é obrigado a cuidar, sob pena de ser penalizado, como vem acontecendo. Ouvi uma frase muito boa esses dias: "Pecuarista no vermelho não pensa no verde". Se o problema econômico for resolvido, o social e o ambiental também serão. Enquanto ficarem só discutindo o ambiental e criando exigências sociais, viveremos nesse clima de insegurança.
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