Formado em direito, gerente geral da Prata Agropecuária, ex-diretor operacional da certificadora BOV-ID Rastreabilidade Bovina LTDA, foi gerente geral da Agropecuária Ishii, um dos fundadores da ABIRC - Associação Brasileira das Instituições de Rastreabilidade e Certificação. Foi administrador da Fazenda Monte Líbano, e atualmente administra também uma pequena propriedade da família.
Scot Consultoria: Na sua grande experiência trabalhando com o SISBOV, como você avalia o sistema de rastreabilidade brasileiro? Como estamos em relação aos outros países produtores e exportadores de carne bovina na questão de rastreabilidade?
Leonardo Tortorela: Pela minha experiência, que não é tão grande assim, o sistema de rastreabilidade brasileiro é o sistema mais complexo e completo do mundo.
Principalmente quando olhamos o tamanho do nosso rebanho e a dimensão do nosso país. É muito difícil comparar a rastreabilidade de outros países com a do Brasil, tanto pelo nosso tamanho, quanto pelos níveis de garantias exigidas. Não podemos deixar de citar que somos o único país que tem uma lista de fazendas habilitadas a exportar, previamente aprovada pela União Européia, a famigerada lista Trace.
Somando todos esses fatores, vejo o sistema brasileiro de rastreabilidade como o mais avançado do mundo.
Scot Consultoria: Atualmente, é vantajoso para o produtor rastrear o rebanho?
Leonardo Tortorela: Tudo depende do valor pago pela "@ lista Trace". Depende da região em que se encontra a propriedade, tamanho do rebanho e nível de tecnologia implantada na fazenda. Em alguns estados chegaram a pagar mais de 10% de ágio pelo animal de fazenda habilitada a UE, no início da exigência da UE da tal lista. Essa pergunta é muito difícil de responder, talvez o produtor tenha algum acréscimo na sua arroba, mas com certeza ele passará por muitos aborrecimentos.
Scot Consultoria: Quais as principais diferenças entre a Instrução Normativa 17, que está em vigor e rege o SISBOV atual, e a proposta pelo MAPA, a Instrução Normativa 65? Na sua opinião quais seriam os principais entraves caso a Instrução Normativa 65 entre em vigor e substitua a Instrução Normativa 17? O que traria de melhorias e/ou malefícios a nova Instrução Normativa?
Leonardo Tortorela: A principal mudança seria a individualização dos animais, que voltaria a ser como no início da rastreabilidade, com a identificação dos animais 90 dias antes do abate.
O principal entrave seria justamente a sua principal característica, a individualização de todo o rebanho ou individualização parcial. Outro aspecto seria que a IN 65, do ponto de vista de certificação de origem, é a mesma coisa que nada, pois não possui auditabilidade.
A IN 65 tem um caráter bem simples, o que traria a adesão de muitos produtores, e que acredito, reduziria ainda mais o ágio pago por esse tipo de produto, apesar de não reduzir tanto assim o valor do serviço de rastreabilidade. Ao mesmo tempo temo por outra escorregada do sistema e, por conseqüência, um novo embargo.
A IN 65 não entra em vigor.
Scot Consultoria: Depois do embargo da União Européia em 2008 sobre as exportações de carne brasileiras, alegando problemas no sistema de rastreabilidade do rebanho nacional, a recomposição do número de fazendas habilitadas a exportar para aquele mercado tem sido muito lenta. Como você avalia essa situação? Quais medidas o Governo brasileiro tem tomado para acelerar esse processo?
Leonardo Tortorela: O que me assusta é que mesmo com um número reduzido de propriedades habilitadas, o ágio pago ao produtor ainda é pequeno. Se acelerar a lista, o ágio desaparece.
Enquanto existir a Lista, a adesão será assim mesmo, lenta. Quando o sistema amadurecer, o Brasil recuperar a confiança do mercado europeu e a lista acabar, o processo se tornará ágil novamente.
Scot Consultoria: Conhecendo profundamente o SISBOV, além do pagamento de ágio, quais suas sugestões para estimular o produtor a rastrear? Quais melhorias deveriam ser feitas no sistema vigente?
Leonardo Tortorela: Agregar outros tipos de controle ao SISBOV, controle zootécnico, administrativo e financeiro, aproveitar a base do sistema, que é a individualização dos animais, para aumentar os níveis de controle da propriedade de uma forma geral. Se bem utilizada, pode ser uma ótima ferramenta de gerenciamento.
Não vejo mudanças drásticas no sistema vigente, o que deve ocorrer é a redução na documentação exigida para a manutenção do ERAS e melhoria nos níveis de controle com um pouco mais de tolerância a erros operacionais, pois hoje apenas um erro desabilita uma fazenda a exportar a UE. Ainda por cima, é aberto um processo administrativo dentro do MAPA que não acaba nunca, atravancando ainda mais as mesas dos auditores do Ministério, deixando o processo todo ainda mais moroso. O melhor seria a abertura de processo administrativo para fraudes ao sistema, não a erros banais que os produtores cometem.
Scot Consultoria: Você acredita que o consumidor está preparado para pagar mais por uma carne com garantia de origem, rastreada?
Leonardo Tortorela: Tem mercado para tudo, mas acho a tendência ainda pior. Vão exigir mais e não pagarão nada a mais por isso.