Médico Veterinário, atuou como Diretor do Comitê de Estratégia Empresarial do Grupo JBS, Diretor Executivo da ABIEC, Diretor do DIPOA/MAPA e atualmente é Presidente da Associação Brasileira das Industrias Exportadoras de Carne (ABIEC).
Scot Consultoria: Para iniciarmos, fale um pouco da importância e da atuação da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne Bovina (ABIEC), como representante do parque industrial frigorífico que mais exporta no mundo. Como surgiu a ABIEC?
Camardelli: Desde o tempo das charqueadas lá no Sul, que foi o início da indústria da carne brasileira, que se sabe do potencial que o país tem como produtor de proteína vermelha.
É preciso lembrar que no início do século passado os primeiros frigoríficos que surgiram no Brasil como o Swift Armour e Anglo, foram empresas de capital inglês e americano que também enxergaram esse potencial, pois pensavam no abastecimento de tropas militares que era feito basicamente com
corned beef.
A expansão do rebanho, a evolução e os sucessivos ganhos de produtividade gerados a partir da década de 70 na pecuária fizeram esse potencial ganhar escala e possibilitaram o surgimento de um setor exportador forte.
A ABIEC completou 30 anos em 2009. Há 30 anos atrás o setor exportador de carnes no Brasil ainda era incipiente, os mecanismos de exportação desconhecidos dos empresários, os contatos com novos mercados ainda difíceis, e, nesse contexto, a ABIEC surge como facilitadora dessa interface entre as empresas e o mercado internacional. A atuação da entidade foi essencial para o
boom das exportações brasileiras de carne bovina que ocorreu nos últimos dez anos e que transformou o país no maior exportador de carne do mundo.
Scot Consultoria: As economias mundiais aos poucos estão se recuperando da crise global, que derrubou as exportações brasileiras de carne bovina em 2009. Como você avalia o comportamento dos embarques brasileiros em 2010? Acredita que em 2011 podemos voltar a crescer em volume, apesar do recorde em faturamento alcançado em 2010? Qual o impacto do real valorizado sobre o resultado das exportações brasileiras de carne bovina?
Camardelli: 2010 foi um ano de recuperação de preços na exportação, após a crise financeira.
O problema cambial é uma realidade com a qual temos que lidar. No passado nossa exportação foi sustentada por um custo de matéria prima barato. Hoje isso mudou, e com o dólar desvalorizado temos um preço de boi mais ou menos harmonizado em todo o mundo. Isso significa que temos que ganhar mais eficiência em processos dentro da indústria aumentando a eficiência, dentro da máquina estatal ao enxugar a burocracia e na logística.
Nossa gestão está focada nisso, e certamente conseguiremos aumentar nossa competitividade e as exportações a partir daí.
Scot Consultoria: Como você vê as diversas campanhas lideradas por ONGs internacionais contra a produção pecuária nacional? Acha que isso já tem atrapalhado de alguma forma nossas exportações?
Camardelli: O grande problema dessas campanhas é que ao mirar em uma minoria que atua de forma errada por ignorância, má fé ou falta de opção, acabam atingindo a imensa maioria de pecuaristas que trabalham honestamente, produzem e sustentam uma indústria que exporta 5 bilhões de dólares, gera empregos, gera impostos e desenvolvimento.
O prejuízo de imagem é muito grande e acaba sendo usado contra nós por nossos concorrentes. Nenhuma ONG fala de como a pecuária está ganhando produtividade, cedendo terras para a agricultura, de como a atividade é importante para o país. E a indústria não está aqui para ser polícia de produtor, quando a legislação do Código Florestal, por exemplo, ainda está sendo discutida.
As ONGs deveriam focar seu trabalho em levar gestão e boas práticas aos produtores, sobretudo aos menores. Criticar é fácil.
Scot Consultoria: Em sua opinião, como representante das industrias frigoríficas, o que deve ser feito para mostrar para o mercado tanto doméstico quanto internacional, toda a realidade da nossa pecuária cada que é vez mais produtiva e sustentável? Quais os avanços que o Programa
Brazilian Beef tem conseguido nesse sentido?
Camardelli: Esse conceito de produção sustentável vai entrar como mais um atributo de qualidade da carne brasileira.
Este ano queremos mudar o foco da campanha do
Brazilian Beef para dar ênfase na imensa capacidade que o país tem de produzir e preservar ao mesmo tempo.
Queremos pautar a mídia internacional e a nacional e fazê-los enxergar que a nossa cadeia de carne bovina é verdadeiramente sustentável, e mais que isso, a evolução dessa cadeia é que vai permitir ao Brasil atender um mercado internacional em crescimento e ao mesmo tempo diminuir a pressão pela abertura de novas áreas na Amazônia.
Scot Consultoria: Para finalizar, como vê a situação do Brasil diante dos demais concorrentes no mercado internacional de carne bovina?
Camardelli: Como foi dito, em uma situação onde o preço da matéria prima está harmonizado, ganha o mais eficiente. Nessa eficiência dentro da indústria, na burocracia e na logística estamos ainda atrás de países como os Estados Unidos, Australia, Nova Zelândia. Mas esses países não tem o potencial de crescimento que o Brasil tem, e estão em mercados específicos como Japão e Coréia onde o Brasil ainda não entra.
Argentina, Uruguai e Paraguai têm restrições tanto políticas no caso da Argentina como de volume no caso de Uruguai e Paraguai. A Índia surgiu com força nos últimos anos vendendo carne de búfalo muito barata no Oriente Médio e na África, mas tem problemas sanitários sérios e mais cedo ou mais tarde vai começar a ser cobrada como o Brasil foi no passado.
No longo prazo, o maior beneficiado com o aumento da demanda mundial será sem sombra de dúvidas o Brasil.
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