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Scot Consultoria

Expectativas para o mercado agropecuário em 2024

Entrevista com o Head de Agro, Alimentos e Bebidas na XP Investimentos, Leonardo Alencar

Quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024 - 06h00
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Leonardo Alencar é Head do setor de Agro, Alimentos e Bebidas na área de Research e sócio da XP. Graduado em Zootecnia, começou sua carreira como analista de mercados agrícolas. De 2011 a 2020, atuou como Diretor de BI na Minerva Foods.


Scot Consultoria: Para 2024, temos uma queda prevista nos rebanhos bovinos nos EUA, Brasil e Austrália. Como essa queda pode impactar a disponibilidade de carne bovina nos mercados mundo afora? E quais as oportunidades para o Brasil quanto ao acesso a novos mercados?

Leonardo Alencar: A expectativa desse sincronismo começou a ganhar força em 2023, talvez como consequência do desconforto do pecuarista dos EUA, Brasil e Austrália com margens abaixo dos níveis históricos, mas não é o cenário que estamos vendo até o momento.

Os EUA realmente vão reduzir sua produção, reflexo da maior contração de seu rebanho em muito tempo, fato que já começou a forçar as indústrias a reduzirem sua utilização da capacidade de abate, embora esse movimento pareça apenas ter começado.

Já na Austrália, o El Niño trouxe em um primeiro momento uma seca que forçou o pecuarista a voltar a descartar animais, mas que, em seguida, foi substituída por fortes chuvas e melhor ambiente para retenção; caso o setor volte a descartar, a redução no rebanho aconteceria apenas em 2025, portanto a produção de 2024 se manteria elevada.

O cenário para o Brasil se assemelha mais à Austrália do que aos EUA, com possibilidade de aumento no abate este ano (menor participação de fêmeas, mas aumento dos machos) e, portanto, impacto da queda do rebanho apenas em 2025.

Neste cenário mais heterogêneo, as oportunidades devem vir de uma mudança nos fluxos de exportação, onde o Brasil seria positivamente impactado, ainda que de maneira indireta. Conforme os EUA importem mais carne e gado em pé do Canadá e México, além de mais carne do Uruguai, Argentina, Austrália e do Brasil, sustentando volumes mesmo após o fim da cota, o Brasil deve ganhar mais espaço no Oriente Médio, Norte da África, Sudeste Asiático e, principalmente, na China.

Scot Consultoria: Quais as expectativas do mercado frente às projeções de quebra nas safras de soja e milho em 2024, devido ao El Niño?

Leonardo Alencar: Este deve ser o ponto mais debatido no mercado atualmente, sobretudo porque a resposta para a soja só virá depois que a colheita se aproximar do final e tivermos uma boa leitura de produtividade, mas para o milho, ainda dependemos das chuvas de março/abril e do nível de tecnologia utilizado pelo produtor, resposta que só virá na colheita em junho/julho.

Entretanto, um ponto que passou despercebido por muitos, foram os estoques de passagem, o que inclusive permitiu que o Brasil continuasse exportando grandes volumes de soja e milho já em janeiro, antes do início da colheita.

Além disso, apesar das quebras para soja e milho, teremos safras volumosas, ainda que abaixo da safra 2022/23. De maneira isolada, o cenário para o Brasil seria mais preocupante, mas a recuperação das safras da América do Sul, principalmente Argentina, também pesam.

Por último, a demanda internacional não tem deixado espaço para otimismo, com importações da China em ritmo lento e dados de exportação semanal dos EUA confirmando esse cenário. Diante desses pontos, seguimos baixistas para preços de soja e milho.

Scot Consultoria: Atualmente, a China é o maior comprador de commodities agropecuários brasileiros. Como a desaceleração econômica no país asiático pode impactar as exportações e o PIB do agronegócio do Brasil em 2024?

Leonardo Alencar: O mercado de commodities agrícolas é regido por oferta e demanda, portanto, diante desse cenário de oferta confortável, embora não abundante, a sinalização de demanda mais fraca já tem impactado as curvas futuras das commodities agrícolas, com fortes quedas para soja, milho e farelo de soja, além de outras commodities.

Em proteínas, o ano de 2023 já foi decepcionante, com uma recuperação mais lenta do que o esperado dos embarques após a queda do embargo referente à vaca louca atípica. Para o suíno, diante dos preços baixos da carne suína na China, as exportações se mantiveram fracas ao longo do ano. No caso da carne de frango, a China é menos relevante, mas o medo da gripe aviária foi mais significativo do que a demanda da China.

Sem novidades quanto a eventuais estímulos à economia chinesa não parece haver espaço para otimismo, entretanto, o Brasil é um dos países mais competitivos na produção animal e, seja pela queda do milho e soja ou pela queda do boi gordo, permanecemos competitivos. Se o cenário de redução na oferta dos EUA se confirmar, a China terá menos fornecedores e deverá importar mais carnes do Brasil.

Scot Consultoria: Ondas de protestos de agricultores na Europa seguem firmes contra as políticas ambientais e de livre comércio da União Europeia, até que ponto isso pode impactar as exportações agropecuárias brasileiras?

Leonardo Alencar: O Brasil precisa endereçar seus desafios ambientais e começar a ser mais transparente, não pela demanda da UE e sim porque é uma demanda crescente e em amadurecimento de todos os consumidores. É evidente, ainda que mal percebido, que muito tem sido feito pelas empresas e pelo governo, mas alguns poucos elementos vão continuar contaminando a imagem do país enquanto seguirem impunes.

Entretanto, não podemos cometer o erro de seguir as demandas de um único cliente que possui seus vieses e estratégias protecionistas. Hoje é a UE, amanhã pode ser a China ou os EUA, portanto precisamos de uma política que esteja alinhada com nossa realidade e anseios.

Scot Consultoria: O que esperar do comportamento das ações das empresas do setor de Agro e Alimentos na bolsa?

Leonardo Alencar: O cenário macro tem sido fonte de muita volatilidade, tanto por conta de eventos geopolíticos, quanto pelas mudanças estruturais em curso no Brasil, como a Reforma Tributária. Entretanto, a demanda doméstica tem se mostrado resiliente e inúmeras empresas reportaram um 4º trimestre de 2023 melhor do que o esperado.

Diante do cenário de baixa para soja e milho, não somos otimistas com os resultados dos produtores listados na bolsa (SLC Agrícola, BrasilAgro). O setor de açúcar e etanol, entretanto, segue mais favorável, diante da melhora na produtividade e custos menores, mas principalmente por conta dos preços historicamente elevados para o açúcar (Raízen, São Martinho, Jalles).

O cenário de baixa das matérias-primas e a leitura de demanda doméstica saudável, além de um cenário de oferta e demanda mais atrativo no mercado internacional, sobretudo para a carne de frango, nos deixa mais otimistas com empresas como BRF (nossa Top Pick) e Seara/JBS.

A Marfrig, embora tenha um resultado operacional na América do Sul favorável, deverá enfrentar margens baixas nos EUA, cenário que também deve impactar a JBS, mas essa possui a vantagem da diversificação geográfica e de proteínas. Já Minerva, apesar de mais exposta à América do Sul, seguirá na dependência da aprovação da compra de 16 fábricas da Marfrig pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), o que tem deixado os investidores receosos.


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