• Segunda-feira, 10 de março de 2025
  • Receba nossos relatórios diários e gratuitos
Scot Consultoria

Importância e desafios da informação no agronegócio brasileiro

Entrevista com o Diretor do programa de televisão Agronegócio da TV Serra Dourada, Antônio Pereira

Sexta-feira, 24 de janeiro de 2025 - 06h00
-A +A

Foto: Freepik


Scot Consultoria: Antônio, o senhor já é uma referência no setor do agronegócio, mas gostaríamos de entender melhor a sua trajetória. Como foi o seu caminho até chegar a essa posição de destaque no setor?

Antônio Pereira: Bom, a trajetória não foi fácil. E acredito que a trajetória da Scot também não foi fácil, temos basicamente a mesma idade no mercado.  Só para ter uma ideia, na TV Serra Dourada, SBT Goiás, eu completo agora em janeiro 30 anos e mais 14 anos em outra emissora. Então, são 44 anos de comunicação no agronegócio, sempre fazendo rádio e TV, com a preocupação de levar a informação até aquelas pessoas que não têm condição, às vezes, de contratar um técnico, de ir atrás. Então, a minha ideia sempre foi ter um programa voltado para técnico educacional.

Mostrar o que está acontecendo, como é que está o mercado, a importância da gente, do produtor entender como é que funciona uma propriedade rural e como é que funciona o mercado lá fora. O que a turma chama de antes e depois da porteira. E eu sempre fui, e sou até hoje, contra a ideia de que o produtor tem que entender só da porteira para dentro. Não, ele tem que entender para dentro e para fora, porque o mundo está globalizado.

A coisa mudou muito nesses últimos 20, 30 anos, em uma velocidade muito grande, e quem não acompanhou está tendo problema hoje. Não tinha nada de comunicação, nada no mercado, ninguém falando de agro. Eu sempre soube que o agro é a grande potência, de qualquer nação.

 Foi muito difícil. É o que eu falo para todo mundo, inclusive na maioria das matérias, palestras que a gente dá, eu digo o seguinte, não tem nada fácil. Tudo custa. Custa tempo, custa dinheiro. E, às vezes, custa só inteligência, custa só a vontade de querer mudar. E tem muita coisa numa propriedade rural hoje que você não gasta dinheiro. É só uma questão de mudar a posição, o jeito de conduzir a coisa.

Entendeu? E, às vezes, dá certo. E tem muita gente que conseguiu se ajustar mudando poucas peças, só que colocando cada peça no lugar certo, sem gastar dinheiro.

Scot Consultoria: Como o senhor enxerga o papel do agronegócio como um vetor de transformação e sobrevivência para o brasileiro, especialmente em um contexto de desafios econômicos e sociais?

Antônio Pereira: Bom, o agronegócio é um negócio, como qualquer outro .

Só que com uma característica diferente, que ele foi passando de pai para filho, assim, meio de qualquer jeito, e foi tocando. “Oh, se você não estudar, eu vou levar você para a roça”. Certo? Hoje, a coisa mudou. Se você não estudar, se você não aprender, você não vai para a fazenda. Entendeu? É diferente. Então, a roça sempre foi, durante muitos anos, no Brasil, até por volta da década de 70, agropecuária puramente de subsistência.

Basicamente, o que era produzido era só para consumo interno. E o Brasil importava muita coisa. Hoje, as coisas começaram a mudar. A turma começou a enxergar que, realmente, o agro era um negócio que dava dinheiro, dava resultado. Não só para o produtor, mas também para o país.

Em 1973, foi criada a Embrapa, e hoje a agricultura brasileira é dividida antes e depois da Embrapa. E junto com a Embrapa vieram as empresas de pesquisas estaduais, com a difusão de tecnologia. E quando você fala em agronegócio, você não pode só enxergar a fazenda produzindo leite, carne ou milho, você está falando de uma estrutura gigantesca de itens fundamentais para que o agronegócio funcione. E o agronegócio hoje, queira ou não, aceite ou não, é a chave do país.

É um setor de risco altíssimo, porque é uma empresa a céu aberto. Choveu muito, dança. Choveu pouco, dança. Então, você joga muito com a sorte também no agro. Mas o agro, ele tem dado alegria, sim.

A região Norte, por exemplo, os portos do Arco Norte, lá no Pará, no Maranhão, no Amazonas, estão fazendo um sucesso danado. Quer dizer, estão pegando toda aquela produção, produtividade, lá da região Centro-Norte, está indo tudo para fora, encurtando a distância, fazendo com que aquela região progrida. Isso é importante.

Scot Consultoria: Como a evolução da informação no setor do agronegócio nos últimos anos ajudou o produtor? Quais os perigos e desafios dessa facilidade em disseminar informações?

Antônio Pereira: Essa parte de comunicação é fundamental. Nós levamos a nossa informação longe, onde, para chegar um técnico, ia demorar muito. Hoje com a internet, você termina de fazer uma matéria agora, edita, publica, e em questão de uma ou duas horas, está com 1.000, 2.000 visualizações, quer dizer, são 1.000, 2.000 produtores que viram. Ele pode não seguir aquela recomendação, mas ele viu, e está na cabeça dele.

Nós somos peças importantíssimas. Só para se ter ideia, o primeiro programa de agronegócio que saiu no país foi o meu, em 1982. Eu tinha um programa de televisão diário, de cinco minutos, e nele eu informava o preço de arame farpado, pneu de carroça, de arreata de carroça, de um quilo de semente. Explicava qual era a diferença de uma semente para um grão, “olha, não planta o grão não, que você vai produzir pouco”.

Então, a gente vem de um processo muito arcaico, lá atrás, e nunca mais paramos. Nós passamos por um período altamente importante na área de comunicação do nosso país, e que hoje as coisas ficaram facílimas, tiramos de letra. Em questão de segundos você já está com o mundo na sua mão.

Ainda hoje, a comunicação é a peça-chave na difusão de tecnologia e para levar ao produtor tudo aquilo que há de mais importante no mundo agro. Eu ouço relatos, como por exemplo: “Antônio, eu vi uma matéria aí que você fez, aquilo foi muito bom para nós.”

Scot Consultoria: Durante esses anos de evolução da informação no agronegócio, o que mais se destacou como fator transformador?

Antônio Pereira: Essa é uma pergunta difícil. Porque tudo mudou, tudo foi alterado. Às vezes, aquilo que ninguém dá importância, é onde está o segredo do negócio.

Então, citar um destaque é difícil. Agora, eu diria que a parte técnica da comunicação, a entrada da internet, o celular, e-mail etc. Porque tudo começou com telex, com fax. Agora, na parte técnica, por exemplo, a entrada da internet revolucionou o processo de informação, de levar essa informação até o produtor.

Scot Consultoria: Como pioneiro em programas voltados ao agronegócio no Brasil, quais foram os maiores desafios que o senhor enfrentou no início dessa trajetória? E de que maneira esses problemas contribuíram para a evolução da informação que temos hoje no setor?

Antônio Pereira: Desafios nós temos religiosamente, todo santo dia. A internet democratizou a coisa certa e a coisa errada. A informação certa e a informação errada. A opinião inteligente e a opinião burra. A internet fez tudo isso.

Agora, como nós preferimos partir para um lado técnico, para um lado sério, o lado da ética, estamos vendo que os desafios foram muito grandes. Por quê? Principalmente pelo seguinte, o produtor rural diz: “Não, isso aqui eu entendo”, “Esse negócio que vocês mandam a gente fazer, não é bem assim, não. Na hora que cai aqui na realidade, a realidade muda.” Eu sei que a realidade muda, que não se pode comparar um boletim técnico, seja lá de qualquer empresa de pesquisa, com o real. Porque quando cai no real, às vezes não está escrito no boletim que pode dar uma “zebra”.

Nós pensávamos muito lá na frente, e a turma não pensava. Não que somos mais inteligentes, não é isso. Nós víamos que as coisas estavam caminhando, e muito rápido. Quer dizer, quem apostava que ia existir uma plantadeira que planta sem tratorista? Quem ia imaginar que ia ter um drone que joga o produto químico só em cima de onde é necessário? Pouca gente imaginava isso. Eu imaginava mudanças, não dessa proporção, mas que iam acontecer.

Os desafios foram principalmente de choques de ideias, aceitar ou não aceitar a tecnologia. Por isso que começaram a acontecer muitos dias de campo, produtores que apostaram naquela tecnologia, levávamos grupos de produtores para visitas. Ainda tem muita gente fazendo errado. Eu até digo o seguinte, os pecuaristas, principalmente de gado de corte, gado de leite, tem que melhorar muito. Olha a suinocultura, o responsável sabe quantos dias que aquele suíno pode ficar lá na baia. Passou de X dias é prejuízo. A avicultura do mesmo jeito. Agora a bovinocultura, ainda está muito longe. Tem gente fazendo bem-feito, mas talvez 80,0% ainda estão muito longe do ideal.

Scot Consultoria: Como a adaptação à 'linguagem' do produtor rural contribui para uma comunicação mais eficaz no agronegócio? O senhor precisou adaptar sua postura ou abordagem?

Antônio Pereira: Quando entrei nessa área, comecei a ver que eu tinha que ter uma linguagem diferente, uma linguagem facilitada. Eu nunca me preocupei com a pessoa que tem, mestrado, doutorado, pós-doutorado. Eu quero aquele que produz, aquele que precisa entender, porque o do mestrado, do doutorado, já entende, e o sujeito lá do campo, não.

 Então eu procurava falar “Ô seu Zé, está tudo bom? Como é que estão as coisas aí? Beleza?” Esse era o meu programa de televisão, quando eu começava. Eu não quero falar difícil. Falar difícil para mim é perder tempo. Eu quero falar para que aquela pessoa entenda o que está sendo explicado. Se ela entender para mim, ganhei o dia.

Scot Consultoria: Com tantos anos de experiência no setor, o que o senhor acredita que podemos esperar para o ano de 2025? Quais tendências ou mudanças significativas o senhor enxerga no horizonte?

Antônio Pereira: Eu espero tudo aquilo que eu esperei em 2024, 2023, 2022, 2021, e para trás. O que eu espero? Eu espero que, em primeiro lugar, eu tenha saúde, segundo que eu mantenha o meu bom senso, terceiro, que mantenha o discernimento do que é certo e o que é errado. Porque não sou eu que mando no mercado, não sou eu que mando nas condições climáticas. O que eu espero, é que todos nós, brasileiros, produtores, tenhamos consciência de que esse país amanhã pode ser melhor.

Por trás do lado econômico, tem muita coisa que a gente, infelizmente, não domina. Nós estamos preocupados com a tecnologia, um celular melhor, trator melhor, semente melhor, mas nós não estamos preocupados com o outro. Se nós pensarmos no “nós”, ninguém segura o planeta.

“Ah, o mundo está ruim”, não, o mundo está ótimo, as pessoas é que estão doentes. Eu acredito nesse país, eu acredito no ser humano. Não podemos esquecer que temos uma coisa muito importante, que é o coração e a razão. Então, você tem que andar aliado, coração com razão. É igual você aliar produção e produtividade com o meio ambiente. Não é fácil, mas eu ainda acredito nesse país. Eu acredito numa mudança significativa.

Antônio Pereira

Diretor, editor e apresentador do programa de televisão Agronegócio da TV Serra Dourada e do programa de rádio Agronegócio na Rede Serra Dourada de Rádio.

<< Entrevista anteriorPróxima entrevista >>
Buscar

Newsletter diária

Receba nossos relatórios diários e gratuitos


Loja