Foto: Bela Magrela
A nutrição materna durante a gestação é um dos pilares para o sucesso no sistema de produção. O professor Rodrigo Goulart, um dos palestrantes presentes no Encontro de Confinamento e Recriadores de 2025, respondeu algumas perguntas dos participantes, destacando como as exigências nutricionais da vaca variam ao longo do ano e entre as diferentes fases fisiológicas, como lactação, gestação e anestro. Goulart explica a importância de um manejo nutricional estratégico, abordando desde os momentos críticos da gestação até as práticas recomendadas para evitar perdas no período pós-desmame e melhorar a qualidade da carne por meio da programação fetal.
Participante: Existe um momento crítico da gestação em que a nutrição tem maior impacto na performance do bezerro? Se sim, como otimizar essa fase?
Rodrigo Goulart: Se a gente avaliar uma estação de monta de outubro a janeiro, outubro a fevereiro, por exemplo, todas as fêmeas que são concebidas no início da estação de monta, ela passa por um período de águas, ou seja, de oferta em quantidade e qualidade de nutrientes durante o terço inicial e o terço médio. E ela vai passar por um período de seca quase nos últimos dois meses de gestação. Então, essa fêmea que é concebida no início da estação, ela precisaria de um aporte nutricional somente nos dois últimos meses.
Lembrando que as fases mais importantes para a definição da estrutura muscular do bezerro são o segundo e o terceiro trimestres de gestação. Assim, a fêmea concebida no início basicamente passa por uma boa alimentação. Mas, a partir do momento que essa fêmea avança e vai adentrando na estação de monta, ela tem como consequência passar por um período de gestação no período seco do ano, porque ela foi concebida já em novembro, dezembro e janeiro.
Nos últimos seis meses de gestação, essa fêmea entra no período seco do ano. E aí ela vai com certeza passar por uma fase de restrição alimentar, e o único caminho dela manter esse feto nutrido é perder peso para atender a demanda do bezerro. Então, veja: essa fêmea tem a habilidade de perder peso para atender às exigências do feto.
E isso é muito ruim - tanto para ela e para o feto também. Então, em termos nutricionais, eu precisaria melhorar o aporte proteico e a ingestão de energia dessa fêmea, para que ela consiga manter o peso e atender às exigências do feto. Toda vez que eu trabalho melhorando a ingestão de energia dessa vaca no período final de gestação, mantendo uma condição corporal melhor, ela pare melhor, produz mais leite e tem condições - agora - de se preparar para a próxima estação, nos próximos três, quatro meses.
Então, essa preocupação da nutrição materna não é somente para pensar no bezerro. Existe uma atenção especial para a fêmea, que vai trazer muitos benefícios para a fazenda, porque ela vai conseguir fazer uma involução uterina e ciclar novamente depois de 70, 80 dias.
Participante: Qual a estratégia após o desmame do bezerro de cinco meses? Como evitar perda de peso? Pois, creio que ele ainda precisa de leite materno.
Rodrigo Goulart: Toda vez que se lança mão da desmama precoce - seja aos cinco ou seis meses, ou seja, reduzindo dois a três meses em relação à desmama tradicional, que ocorre aos oito meses - esse bezerro apresentará necessidade de um apoio nutricional em virtude da retirada do leite. Mesmo considerando que uma fêmea Nelore, a partir do quarto mês, reduz a produção de leite gradualmente, esse leite ainda tem importância para o bezerro, tanto em termos nutricionais quanto psicológicos. Isso é algo que precisamos levar em consideração.
Uma das formas de suprir essa necessidade, além de garantir a qualidade do pasto, é através da suplementação via creep feeding. Cada fazenda, dentro da sua realidade de custo, precisa definir a quantidade a ser ofertada por animal por dia. Mas, sem dúvida, a desmama precoce exige esse cuidado nutricional adicional.
No experimento que apresentei no estudo, realizamos uma suplementação com 0,5% do peso vivo. Essa suplementação foi feita dos 90 aos 150 dias — ou dos 90 aos 240 dias, no caso da desmama tradicional. Os resultados foram muito positivos: obtivemos uma taxa de ganho razoável, com peso à desmama acima da média nacional. No entanto, é essencial entender que, sempre que se faz uma suplementação na fase de cria, é importante manter esse trabalho também após a desmama.
Esse bezerro, agora, tem uma exigência de manutenção mais alta e uma demanda nutricional maior. Se for desmamado, passando pelo estresse de desmama, e entrar em um pasto com sal mineral, com certeza esse investimento que eu fiz antes será perdido. Então é preciso continuar uma recria, com um nível de tecnificação, para manter taxas de ganho alta, e não perder o que foi feito na fase de cria.
Participante: Professor Rodrigo, a pesquisa desenvolvida pelo grupo mostrou que temos uma programação fetal latente a ser explorada na época da seca. Qual a estratégia nutricional de melhor eficiência biológica e econômica para aumentar o marmoreio nessa fase de programação fetal?
Rodrigo Goulart: Nesse questionário que fizemos em 2022, quando perguntamos se os produtores acreditam na suplementação da vaca gestante, mais de 90,0% responderam que sim. Mas, quando questionamos qual tipo de suplementação é utilizada durante a seca, 71,0% afirmaram usar apenas sal mineral ou sal mineral com ureia. Então, nós estamos vivendo aquela fase de acreditar, mas não realizar. Acredito que os produtores, as empresas, a academia e os centros de pesquisa precisam continuar trabalhando esse tema para demonstrar os benefícios zootécnicos - e, consequentemente, os benefícios financeiros.
Eu vejo isso como um trabalho que vai demandar tempo. E se pensarmos em uma "receita de bolo", uma solução única para todas as fazendas, acredito que isso seja quase impossível. Cada fazenda tem seu propósito e suas particularidades. Por exemplo, as propriedades que realizam integração lavoura-pecuária conseguem desenvolver um trabalho de nutrição materna extraordinário, tirando essa fêmea do período das águas e colocando-a em um pasto de braquiária ruziziensis de safrinha.
Um pasto com um altíssimo valor nutricional, com uma oferta abundante em termos de massa forrageira permite que essa fêmea continue ganhando peso. Tanto que algumas fazendas optam por inverter a estação de monta justamente por conta dessa oferta alimentar. Nesse cenário, torna-se muito mais fácil estabelecer um bom plano nutricional. Por outro lado, em situações em que a oferta de alimentação é mais restrita e o produtor precisa investir em suplementação, é necessário realizar outra análise - pensando por categoria e olhando para o indivíduo. Aquelas vacas que perderam mais peso ou que estão no final da estação de monta merecem atenção especial.
Portanto, precisamos sempre adaptar as estratégias à realidade de cada propriedade e às suas necessidades específicas. No fim das contas, o conceito é único: atender às exigências nutricionais dessa vaca. Não queremos que ela engorde - queremos, no mínimo, que mantenha o peso. Afinal, ela está cuidando de um bezerro ainda em gestação.
Clique aqui e assista a entrevista completa no canal do YouTube da Scot Consultoria.
Médico-veterinário e professor do departamento de zootecnia da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo (FZEA/USP).
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