Se a agricultura já brigava com a pecuária na "tomada" de áreas de pastagens, agora esta disputa fica ainda mais acirrada. A necessidade do uso dos grãos para a produção de biocombustíveis elevou a demanda pelas commodities e, consequentemente, seus preços. Por outro lado, aumentou a procura por adubos, também fazendo com que suas cotações disparassem. Conseqüência: o pecuarista leiteiro e o de corte estão vendo seus custos subirem mais que os ganhos. E o maior vilão, no ano, é o sal mineral: valorização de 45,3% no período, que disputa a matéria-prima com os fertilizantes, cuja alta na cotação no ano é de 25,5%.
O produto representa 9% do custo total na pecuária de corte e 0,65% na leiteira. E, diante dos sucessivos aumentos nos valores cobrados pelo sal mineral a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) solicitou ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que a matéria-prima tenha isenção da Tarifa Externa Comum (TEC). A mesma solicitação havia sido feita pela Associação Brasileira das Indústrias da Suplementação Animal (Asbram), no final do ano passado, que não foi atendida e, por decisão da diretoria da associação, retirada. Pelas estimativas da instituição, cerca de um terço da matéria-prima é importada. Atualmente, paga-se 4% de tarifa para o ácido fosfórico e 10% para o fosfato bicálcico.
De acordo com o assessor-técnico da Comissão Nacional de Pecuária Leiteira da CNA, Marcelo Martins, o ácido fosfórico é a matéria-prima para o fosfato bicálcico, que é o ingrediente do sal mineral e representa 60% deste produto. Martins lembra que 90% da produção de ácido fosfórico é utilizada para os fertilizantes, restando apenas 10% para uso em alimentação animal e humana. Os maiores consumidores mundiais de fosfato bicálcico são China, Índia, Estados Unidos e Brasil, que adquirem o produto do Marrocos, Rússia, Tunísia e Jordânia. Ele acrescenta que não há previsão de aumento da oferta mundial em curto prazo, pois as jazidas existentes já atingiram 95% da capacidade de produção e novas jazidas levariam, no mínimo, quatro anos para se habilitarem a entrar em funcionamento.
Segundo ele, os dois produtos tiveram reajustes nos preços internacionais, por conta de oferta, mas os valores têm subido mais no mercado interno. E, pelas estimativas da CNA, a previsão é de novas altas, entre 20% a 30%, no próximo mês. Apenas de novembro para cá, o fosfato bicálcico saiu de uma cotação de US$800 a tonelada para US$1,8 mil a tonelada (125%).
Levantamento da Scot Consultoria mostra que, em 12 meses, a valorização média do sal mineral ficou em 80%. Os preços pagos aos produtores não tiveram reajustes nestes patamares. Segundo a consultoria, a cotação do litro de leite acumula alta de 21,32%, enquanto a da arroba do boi, 3,9%. Na comparação com o mês, também há perda de poder de compra para os pecuaristas: valorização de 9% para o sal mineral, 3,64% para o preço do leite e 0,5% para o boi gordo.
Grãos
"Os custos mais altos estão reduzindo a margem do produtor. E é importante lembrar que no ano passado foi um ano bom para o leite", diz Maurício Nogueira, analista de leite da Scot Consultoria. Ele acrescenta que no caso da pecuária leiteira, os grãos têm um impacto maior nos custos totais (22% vêm do concentrado energético e 9% do concentrado protéico). De acordo com ele, hoje o produtor compra menos milho por litro de leite que em 2006, o pior ano da história para o preço do leite.
Naquela ocasião, o valor médio pago era de R$0,52 o litro (deflacionado) frente aos atuais R$0,70 por litro. Pelas estimativas da consultoria, com um litro de leite é possível adquirir 1,6 quilos de milho. Em 2006 eram 1,87 quilos e a média desde o Plano Real (1994) fica em 1,73 quilos.
O presidente da Asbram, Marcos Beruselli, diz que quando a instituição havia pleiteado a retirada da tarifa havia um perigo de desabastecimento das matérias-primas, o que não ocorre mais hoje. No entanto, segundo ele, as indústrias de sal mineral encontram o produto, mas a um preço muito alto. "Pequenas empresas estão com dificuldade de crédito para comprar", afirma. Martins lembra que existe um monopólio para a produção da matéria-prima do sal mineral no Brasil e que a redução da alíquota permitirá uma diminuição nos custos superior à taxação, além do aumento da concorrência. Acrescenta ainda que, apesar de os pecuaristas leiteiros pedirem a redução na tarifa, o impacto ocorrerá também para a produção de carne.
Segundo ele, o ministério mostrou-se recebido ao pleito da CNA e um possível encaminhamento à Câmara de Comércio Exterior (Camex) poderia se dar no próximo mês, para votação em junho.
O especialista lembra que suprimir o sal mineral da alimentação do rebanho pecuário não é solução, pois compromete o desempenho da produção tanto de leite quanto de carne.
Fonte: Gazeta Mercantil. Agronegócio. Por Neila Baldi. 23 de abril de 2008.